Djonga em apresentação na Fundição Progresso, na Lapa - Luiz Franco
Djonga em apresentação na Fundição Progresso, na LapaLuiz Franco
Por *LUIZ FRANCO
Rio - Djonga se apresentou na noite da última sexta-feira, na Fundição Progresso, Lapa, ao lado dos cariocas Felipe Ret e Miatã. Após um show catártico, incendiário e, sobretudo, político, em que o rapper mineiro cantou músicas de toda a sua carreira – desde o primeiro álbum, “Heresia”, e seu famoso perfil da Pinneaple, “Olho de Tigre”, da letra que virou bordão e grito de guerra (“Fogo nos racista”), passando por músicas de seu segundo álbum, “O Menino Que Queria Ser Deus”, até seu último trabalho, “Ladrão” -, Djonga conversou com exclusividade ao DIA.
Ao contrário do que evocou em sua agressiva apresentação, Djonga, em um momento relaxado e descontraído, deitado no sofá do camarim da Fundição Progresso, demonstrou ponderação e lucidez ao comentar a política nacional.
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"Não é só achar que, pô, vamos mandar tomar no c* quem discorda da gente e é isso. A gente não vai conseguir construir quase nada com essa parada", afirmou. "A gente tem que polarizar sim, mas polarizar pra chegar a algum lugar, polarizar pra discussão ser interessante, e não simplesmente polarizar por polarizar, pra dizer que um é fascista ou que o outro é comunista".
O rapper também comentou sua relação com as redes sociais, a situação do Rio de Janeiro e afirmou ter esperança no futuro: "Minha esperança é que as pessoas comecem a refletir mais sobre as posturas delas, no individual e no coletivo, de uma forma que a gente comece a construir uma sociedade mais justa, menos hipócrita, que a gente consiga construir uma sociedade de pessoas mais inteligentes, que pensem mais na espécie. Não exatamente no indivíduo, não exatamente no coletivo, mas na espécie - e no que a gente tem que fazer pra ela se manter viva aqui".
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Confira a entrevista:
Djonga no camarim da Fundição Progresso, na Lapa - Luiz Franco
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Qual a importância de se apresentar no Rio de Janeiro, neste momento, com o Caveirão destruindo barracos na Cidade de Deus e o governador declarando guerra às favelas, com um show que nem o seu, catártico, agressivo, “fogo nos racistas”, exaltando o preto?
É engraçado, porque o Rio de Janeiro, dessa vez, foi pior do que São Paulo, né? Se mostrou a cidade com os votos mais reacionários. Isso é louco, porque o Rio é um lugar que vive um momento muito complexo, um momento de guerra mesmo. Talvez até por isso os votos tenham ido nesse sentido. A galera buscando a tal "segurança", foi pra esse caminho da radicalização. Uma coisa que é até difícil da gente julgar, né, velho? Porque são pessoas que trabalham, que tão fazendo o corre aí, o quê que eu posso falar, né, velho? Pra nós, às vezes, a situação é muito mais tranquila.
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Diante disso, eu penso que fazer um show no Rio é uma oportunidade de trocar de ideia. De ouvir, de entender o que que tá acontecendo. Nós estamos num momento de, talvez, mudança de estratégia, sabe? Não é só achar que, pô, vamos mandar tomar no c* quem discorda da gente e é isso. A gente não vai conseguir construir quase nada com essa parada. Infelizmente a situação tá dada, o bagulho tá bizarro, tá ligado? O bagulho tá bizarro. E a situação é de guerra sim. Nós estamos contra os cara, tá ligado? E, mesmo nós estando contra os cara, nós temos que ter estratégia na guerra, sacou? Na guerra, tem um tanto de gente que não é soldado, que não é sargento, que não é capitão, que não é nada. Que não tá em lado nenhum do exército. Que tá só pendendo pro lado que tá mais fácil de fazer as coisas. Nós temos que ter estratégia. Ganhar mais gente pra gente, sacou? Acho que é isso. A importância de fazer um show no Rio é essa troca.
Hoje em dia, o Instagram e outras redes sociais permitem um contato muito mais direto com seus fãs. Está todo mundo no celular, inclusive nos seus shows, às vezes curtindo ele através de uma tela. O que você pensa sobre isso? Você usa muito o celular?
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Eu usei demais. Eu usei muito, absurdamente. Fiquei extremamente viciado em celular, em like, em número, em tudo - no começo, assim, da parada. No começo, que eu digo, quando eu comecei a ficar mais conhecido. Fiquei viciadão, assim, em ver o que estava acontecendo, o que estavam dizendo de mim. Até a hora que eu reparei que, mano, é um bagulho mó legal, mas tudo meio repetitivo. Tanto a galera que gosta de você, o jeito que essa galera fala, quanto a galera que não gosta de você - a intensão da ofensa, né, de fazer mal, que essa galera tem. Então eu reparei que era mais importante eu cuidar da minha vida, do dia-a-dia, do meu pessoal. Viver o dia-a-dia, viver, fraga? Do que ficar mexendo no celular. Hoje em dia, eu praticamente não uso o WhatsApp. O Twitter, uso mais pra divulgar as coisas, raramente falo umas coisinhas ali, dou uma opinião. Nem uma opinião, falo umas frases, assim, porque tenho evitado, inclusive, falar muito, né, na internet. Procuro praticar as coisas mais no dia-a-dia, sacou? Acho que a internet é uma plataforma que hoje, pra mim, tem mais a ver com o trabalho, do que em ficar expondo muito a minha vida pessoal.
Djonga em apresentação na Fundição Progresso, na Lapa - Luiz Franco
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E como você acha que essas duas coisas se cruzam? O que tá acontecendo na cabeça das pessoas, com toda essa mudança das redes sociais, e o momento político que a gente tá vivendo.
Acho que a internet é uma possibilidade. É um lugar que fica muito mais fácil do cara ou da mina dar a opinião dele ou dela, com um pouco menos de compromisso, sacou? Então a pessoa às vezes não tem compromisso nenhum com o que ela tá falando ali, porque ela tá atrás de uma tela do computador, ela tá atrás de uma tela do celular, é muito mais fácil. Por isso as pessoas estão sempre se ameaçando. Então você vê uma criança de doze anos falando que vai matar alguém. Tipo, vou te matar, seu comunista! Ou então, vou te matar, seu bolsominion! Sendo que a pessoa tem doze anos, então, tipo, ela não vai matar ninguém, sabe? (risos) É uma coisa que chega ao nível do absurdo, do absurdo espetaculoso. Inclusive foi a estratégia, eu acho, que esse governo atual usou pra ganhar as eleições. Ele entendeu isso melhor do que todos os outros candidatos. Quando os outros candidatos entenderam o que estava acontecendo, já era tarde demais, eles já tinham perdido a eleição – porque essa eleição foi perdida no primeiro turno, essa é a real. Esse governo teve essa noção, que a internet era um lugar muito mais fácil pra se comunicar com as pessoas, espalhando notícias, sejam verdadeiras ou falsas – não interessa – conseguir despertar esse fogo nas pessoas, essa vontade de falar, de dizer que sabe, sabe?
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Você é esperançoso quanto a isso? Acha que as pessoas podem, talvez, votar diferente da próxima vez?
Eu não sou aquele cara que acha que eleição é o que muda, exatamente, um país. Minha esperança, sempre – e eu tendo a ser esperançoso nesse sentido – é que as pessoas comecem a refletir mais sobre as posturas delas, no individual e no coletivo, de uma forma que a gente comece a construir uma sociedade mais justa, menos hipócrita, que a gente consiga construir uma sociedade de pessoas mais inteligentes, que pensem mais na espécie, tá ligado? Não exatamente no indivíduo, não exatamente no coletivo, mas na espécie - e no que a gente tem que fazer pra ela se manter viva aqui. Eu acho que é isso que é importante, muito mais do que eleição. Minha esperança é muito mais no sentido de pensar que as pessoas, com tudo isso que tá rolando, vão conseguir, hmm... Como eu posso dizer? Tirar algo positivo, sabe? De tudo dá pra tirar algo positivo. E quando eu digo tirar algo positivo, é tirar a percepção que esse... essa polarização, pela polarização, não vale absolutamente nada. A gente tem que polarizar sim, mas polarizar pra chegar a algum lugar, polarizar pra discussão ser interessante, e não simplesmente polarizar por polarizar, pra dizer que um é fascista ou que o outro é comunista. Isso é bobo. Isso não constrói absolutamente nada. 
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*Estagiário sob supervisão de Thiago Antunes