Rio - Carnavalesco da Portela, Antônio Gonzaga desabafou nas redes sociais, nesta terça-feira, após ser ironizado por Jorge Perlingeiro, durante o podcast "Só Se For Agora", transmitido na noite desta segunda, no YouTube. Na ocasião, o profissional disse se considerar preto e o presidente da Liesa respondeu: "Você não está com essa negritude toda".
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"Minha voz é tinta e caneta. É sobre identidade, entendimento, letramento e afeto. Que além de novembro, a consciência negra seja uma batalha continua. Um defeito de cor não é a toa", escreveu Antônio no X, antigo Twitter.
Marcelo Adnet demonstrou apoio ao carnavalesco. "Você é gigante. Sempre fui seu fã, desde a época das lindas composições. Para cima! Um imenso abraço pra você e pro gênio, André Rodrigues". O influenciador de Carnaval Dam Menezes comentou: "Quero muito te dar um abraço, forte! De amigo, de afeto! Você é gigante! Siga de cabeça erguida sempre! Rumo ao topo, rumo ao sucesso! Você é resistência de sua arte e ela é a resistência que é você. Então, se sinta acolhido e muito por ela!".
Os internautas também enviaram mensagens positivas a Antônio. "Todo afeto e respeito, querido! Mesmo de longe, sinta meu abraço! Você é grandioso", afirmou um. "Meu irmão, estamos contigo! Um abraço afetuoso que possa lhe transmitir toda força, energia e sabedoria de nosso povo ancestral. 'Somos herança da memória'", disse outro. "Um abraço, Gonzaga. Minha solidariedade. Fora isso, muito bom saber que o Carnaval que a gente ama é pensado e criado por pessoas como você e o André", destacou uma terceira pessoa.
Entenda
Durante o podcast, Perlingeiro conversava com os carnavalescos Antônio Gonzaga e André Rodrigues, quando Antônio afirmou ser preto e foi questionado pelo apresentador. "Somos dois carnavalescos pretos, que estamos chegando, trabalhando pela primeira vez juntos...", começou Antônio. "Você é negro, preto?", questionou Jorge Perlingeiro. "Sou", respondeu Antônio Gonzaga. Jorge Perlingeiro, então, sacudiu a cabeça em negação. "Precisa dar uma tinta em você, que você está muito clarinho", disse o apresentador, deixando os dois carnavalescos sem graça.
"Sua mãe é negra, seu pai?", continuou Perlingeiro. "Minha mãe", respondeu o carnavalesco. "Seu pai deve ser branco", disse o apresentador. Antônio confirmou e Jorge Perlingeiro respondeu: "Ah, logo vi. Você não está com essa negritude toda". "Mas eu sou negro, venho de família negra", corrigiu Antônio Gonzaga.
Em um outro momento, Jorge Perlingeiro falou sobre a presença de negros nas escolas de samba. "Eu tenho escutado muito que as escolas estão ficando muito embranquecidas. Você não vê muito mais a figura do negro, ou do preto, nos desfiles. Esse ano a Portela vai ser totalmente o contrário", disse o apresentador, referindo-se ao samba enredo "Um defeito de cor", baseado no livro homônimo de Ana Maria Gonçalves.
"Vai ter um contingente negro muito maior esse ano do que branco, não é isso?", perguntou. "A Portela é uma escola negra. Isso é inegável", disse o carnavalesco André Rodrigues. "Isso não é uma questão", completou. Júnior Escafura, vice-presidente da agremiação, concordou: "A Portela sempre foi uma escola de alma, de gente negra mesmo". Perlingeiro, então, rebateu: "Não vai querer dizer que é negro não que eu não vou aceitar. Ele eu já estou quase aceitando, mas você não vou aceitar", disse, apontando para Antônio Gonzaga.
Indignação
As falas do presidente da Liesa causaram indignação nas redes sociais. "Quando o presidente da Liga que comercializa a cultura negra como produto para exportação, um homem branco, questiona a autodeclaração de um carnavalesco negro dessa forma jocosa fica evidente o tamanho do nosso problema. Um absurdo completo e inaceitável.", disse uma pessoa no Twitter.
"Jorge Perlingeiro é uma figura que cheira a mofo. Representa o atraso que a Liesa tenta, depois de muito tempo, se livrar. É preciso virar essa página definitivamente para que cenas criminosas como essa não se repitam mais. Artistas como Gonzaga e André não merecem isso", disse outro internauta.
"Depois da agressão desmedida do Jorge Perlingeiro, presidente da LIESA, a maior violência pra mim é o Antônio Gonzaga ter tirado forças pra permanecer ali, sereno, diante do agressor, até o fim", comentou outra pessoa.
A Portela também se pronunciou através de uma nota oficial. "O G.R.E.S. Portela é uma instituição fundada por pretos, pobres e suburbanos há mais de cem anos. Temos como princípio a luta contra o preconceito de qualquer espécie, bem como o apoio incondicional a diversidade", disse a Portela em seu perfil no Twitter. "Reafirmando este compromisso histórico, a diretoria da Portela, com a certeza de estar reverberando as vozes de nossos componentes e torcedores, presta solidariedade aos carnavalescos Antônio Gonzaga e André Rodrigues, assim como a todos que participaram do 'Só se for agora'. Seguimos juntos nossa jornada para uma sociedade em que a cor da pele não seja um defeito, o que está muito além de um desfile carnavalesco", continuou o documento.
O Império Serrano também rebateu as falas de Jorge Perlingeiro. "O Carnaval foi e é construído pela força do povo preto, trabalhador e que entrega o seu suor para fazer dos desfiles das escolas de samba o maior espetáculo do planeta. Feliz do povo que tem Silas de Oliveira, Cartola, Candeia, Dona Ivone e Paulo da Portela como referências", diz a nota publicada no Twitter da agremiação.
Atual diretor de marketing da Liesa e provável candidato ao cargo de presidente da liga para o Carnaval 2024, Gabriel David também se pronunciou sobre o assunto. "Não é por um acaso que a palavra samba procede de uma expressão africana: semba. O Carnaval nos ensina, diariamente, não só a celebrar os nossos ancestrais como a respeitar e promover a igualdade e a diversidade, combatendo o racismo e educando a sociedade. No mundo das escolas de samba, não pode existir preconceito, muito menos colorismo.", disse no Twitter.
O DIA entrou em contato com a Liesa e a assessoria de Jorge Perlingeiro, mas ainda não obteve resposta.
minha voz é tinta e caneta. É sobre identidade, entendimento, letramento e afeto. que além de novembro, a consciência negra seja uma batalha continua. Um defeito de cor não é a toa.