Por karilayn.areias

Rio - Por muito pouco, o primeiro personagem retratado numa biografia pelos amigos Carlos Eduardo Drummond e Marcio Nolasco não foi Roberto Carlos. A dupla, que acaba de lançar ‘Caetano — Uma Biografia’ (Ed. Seoman, 544 págs, R$ 59,90), quase embarcou nessa canoa (furada). “Mas as dificuldades para se chegar a Roberto eram grandes”, conta Drummond. “O Marcio sugeriu Caetano e decidimos. Sabíamos da importância da obra dele, mas nenhum de nós dois era tiete do Caetano”.

Biografia de Caetano chega às livrariasDivulgação

O trabalho da dupla — cuja pesquisa começou há duas décadas, e cujo resultado inicial está preso nas gavetas das editoras desde 2003 — tem uma história que, por si só, já daria um livro. “Outro dia, dei palestra numa faculdade e perguntei quem ali tinha 25 anos. Levantaram o braço e falei: imagina você aos 25, vendo uma entrevista do Caetano na TV e resolvendo fazer uma biografia dele, já que não existe nenhuma. Foi assim com a gente!” O livro teve autorização de Caetano, que assinou em 2001 um documento reconhecendo a existência do projeto, e em 2004, foi parar nas mãos da editora Objetiva.

Apesar da animação inicial, nada foi para a frente. Foi noticiado recentemente que Caetano não gostou do texto original (Paula Lavigne, empresária do cantor, disse isso em entrevistas), e que tanto ele quanto a editora sugeriram a entrada de outros escritores para ajudar a dupla. Drummond conta que na época não entenderam o que aconteceu.

“Acho que, por sermos desconhecidos, ninguém teve peito para bancar o projeto”, diz. Em abril, Caetano disse numa entrevista em Portugal que não chegou a ver o livro depois que ficou pronto e que, mesmo assim, autorizou o uso de fotos. “O texto que Caetano leu na época não é o mesmo de hoje. Reescrevemos tudo. Ele pode não gostar também do livro novo. O Caetano já criticou até livro do Ruy Castro! Isso só não poderia determinar se o livro deve ou não ser lido”, conta Drummond.

Capa da biografia de CaetanoDivulgação

CARTA PARA A BAHIA

Nolasco e Drummond começaram por vias incomuns. Numa época em que o baiano já era um personagem blindado, mandaram uma carta para Rodrigo, irmão de Caetano, que sinalizou com um OK informal. “Nem havia e-mail!”, espanta-se Drummond. A dupla fez viagens a Santo Amaro da Purificação (BA), onde Caetano nasceu.

ntrevistaram toda a sua família, amigos de infância, descobriram antigos amores do cantor (Aneci Rocha, irmã do cineasta Glauber Rocha e atriz, foi com quem ele teve sua primeira relação sexual), foram nas escolas em que Caetano estudou. E descobriram uma similaridade que ele tem com outro artista bom de música e de autopromoção: o roqueiro David Bowie (1947-2016). Ambos tiveram seus primeiros empregos em agências de publicidade.

VANDRÉ PEDIU PESQUISA

Desafetos que Caetano colecionou ao longo da vida foram entrevistados, como Fagner e Geraldo Vandré. Este último deu trabalho à dupla. “Descobri um restaurante que ele frequentava em São Paulo. O garçom me falou que ele ia aos sábados. Eu liguei todos os sábados até conseguir falar com ele”.

Quando achou o compositor, ganhou o telefone de sua secretária, mas nem assim foi fácil. “Demoramos mais um ano para conseguir marcar. Quando falei com ele, Vandré me pediu: ‘Você é pesquisador, né? Pode achar para mim alguns alunos que se formaram comigo na Universidade Estadual da Guanabara (Uerj, hoje)?’”, diz, rindo. “Achei quinze pessoas e ele me deu uma letra dele, ‘Fabiana’, autografada”.

A dupla também mapeou os destinos de Caetano na época do exílio em Londres, entre 1969 e 1972. Pouco antes, o cantor ficou quase desaparecido da família, quando foi preso pela ditadura militar — um coronel chamado Respício Antonio do Espírito Santo dá detalhes de como os militares viam a situação de Caetano e Gil, ambos encarcerados. “Essa parte foi muito difícil”, conta Drummond.

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