Rio - Durante o período de Copa do Mundo, o brasileiro tem algumas certezas. O país vai parar para acompanhar os jogos da Seleção, as ruas estarão lotadas de pessoas vestidas com o uniforme canarinho e, na televisão, a dupla Galvão Bueno e Arnaldo Cezar Coelho será responsável por levar ao público as emoções das partidas. Mas não será mais assim. Após a final do Mundial da Rússia, o comentarista de arbitragem surpreendeu o público ao anunciar que esta seria sua última participação no maior campeonato de futebol do planeta.
"Meu contrato com a Globo acaba no fim do ano. E lá se vão quase 30 anos como comentarista. Estou com 75 anos e, na próxima Copa do Mundo, estarei com quase 80. Então, achei que estava na hora de parar. Eu já tinha conversado previamente com a direção da empresa, e eles já estavam por dentro dessa decisão. Quando o meu contrato acabar, vou continuar cuidando dos meus negócios. Além disso, vou ter mais tempo para me dedicar à vida pessoal e à família", afirma Arnaldo, que também é dono de uma afiliada da Globo no Sul do estado do Rio.
Com oito Copas do Mundo no currículo de comentarista, a trajetória do ex-árbitro de futebol na televisão vem de longe. "O primeiro convite que recebi da Globo foi para fazer uma palestra para os jornalistas sobre uma jogada polêmica que tinha acontecido nas Eliminatórias de 1989, numa partida entre Brasil e Chile, em Santiago. Depois dessa palestra, fui convidado pela emissora para ser consultor. Já estava encerrando a minha carreira como árbitro e aceitei. Depois disso, virei comentarista, a primeira Copa do Mundo que fiz nessa função foi a de 1990, na Itália", lembra Arnaldo.
Parceria de sucesso
A amizade com Galvão Bueno começou antes mesmo da contratação de Arnaldo pela Globo. Para o comentarista, o entrosamento da dupla nas transmissões e no programa 'Bem Amigos', do SporTV, é o segredo para tanto sucesso.
"Eu conheci o Galvão quando ele já trabalhava como narrador e eu como árbitro. Muitas vezes, ele narrava os jogos que eu ia apitar, e nos encontrávamos nas viagens, nas partidas. Quando eu cheguei na Globo, senti que ele era um narrador espetacular, um vendedor de emoções, um cara que antevê jogadas. Funcionava ter uma pessoa ao lado, que levantasse a bola pra ele chutar. E ele faz a mesma coisa com relação a mim. Muitas vezes, ele levanta a bola, e eu chuto", analisa o comentarista.
No entanto, diferentemente de Galvão, que revelou recentemente ser torcedor do Flamengo, Arnaldo disse que os anos em campo e nas cabines de transmissão o fizeram esquecer o time de coração. "Ninguém começa a gostar de futebol sem ter um time. Mas faz tanto tempo que eu comecei a apitar futebol e vi que o juiz deve ser uma pessoa isenta, que eu esqueci o time de coração. E quando eu faço jogos do Brasil, acontece a mesma coisa. Se foi pênalti, preciso dizer que foi. Se não foi pênalti, mesmo que o juiz tenha marcado, preciso dizer que não foi", reflete o ex-árbitro.
Contribuição
Na Copa do Mundo de 1982, a Seleção Brasileira de Zico, Falcão, Júnior e Sócrates encantou o mundo e marcou o imaginário do torcedor, mas acabou sendo eliminada pela Itália. O Mundial daquele ano, no entanto, representou um marco na história da competição e do futebol brasileiro no momento em que Arnaldo foi escolhido como o primeiro árbitro não europeu a apitar uma final de Copa.
"Consegui provar para a FIFA que o árbitro brasileiro tem capacidade de apitar uma final de Copa do Mundo. Já como comentarista, acredito que minha maior contribuição foi procurar, de forma didática, explicar as regras do futebol para todos os telespectadores. Hoje, muitas pessoas já sabem o que é impedimento, que no pênalti o goleiro não pode se mexer, uma série de detalhes e regras que antes muitos desconheciam", avaliou.
Os bordões também são marca registrada de Arnaldo durante as transmissões de futebol e caíram na boca do povo. "Eu queria explicar a marcação de um juiz, de um pênalti, de uma falta, de um impedimento, e os próprios narradores me questionavam. Eu dizia: 'A regra é clara, está previsto, não podemos fugir da regra'. A garotada gostou e o bordão pegou. Foi além do futebol, foi para vida cotidiana das pessoas. Depois disso, surgiu o outro bordão 'Pode isso, Arnaldo?', que é uma derivação do 'A regra é clara'", recorda o comentarista.
Tecnologia no futebol
A Copa do Mundo desse ano trouxe ao público uma grande novidade que foi o árbitro de vídeo (VAR). Para Arnaldo, a tecnologia que deu o que falar ainda precisa de aprimoramentos para ser um sucesso no futebol.
"O início foi ruim, começaram a avaliar muitas jogadas, mas depois foram aprimorando. É importante ter um treinamento, porque nas jogadas objetivas, tudo bem. Mas na parte subjetiva, de interpretação, o árbitro é que tem o poder de decidir. O árbitro de vídeo só entra se for um erro muito grave da arbitragem. Por exemplo, se o árbitro marcar um pênalti e a imagem mostrar que o jogador não foi tocado. Aí, o VAR tem que entrar", opinou.
*Reportagem do estagiário sob supervisão de Paulo Ricardo Moreira