Rio -Após a revista Piauí publicar uma reportagem com graves acusações contra a viúva de Gal Costa, Wilma Petrillo, como dar golpes e ter levado cantora à falência, André Pacheco, ex-gerente de marketing da Sony, disse, em entrevista à "Quem", que acredita nos relatos citados e revelou que Wilma boicotou contratos e vetou o clipe da música "Quando Você Olha Pra Ela" da artista, que morreu aos 77 anos em novembro do ano passado, por ter uma 'estética agênero'. Segundo o profissional, o caso aconteceu em 2015, época em que Gal tinha contrato com a gravadora para o lançamento do disco "Estratosférica". Ele ainda comentou a dificuldade de lidar com a viúva da cantora.
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"Eu era gerente de marketing da Sony e a Gal estava sem gravadora na época (2015). Eu já conhecia a Wilma [Petrillo] e a Gal quando morei em Salvador (BA) por um tempo. Quando eu fui pra Sony, ninguém queria a Gal, ninguém queria o projeto, mesmo que fosse maravilhoso, por causa dela [da viúva], mas conseguimos. Quando Gal chegou, começamos a ter problemas por causa de contrato, com Wilma, o que pode e o que não pode, mas a Gal sempre só sabia de metade da história. Me falaram: 'Pacheco, a Wilma gosta de você'. E realmente ela nunca me fez nada, mas eu via ela fazendo com coisas horrorosas. Mas, para preservar minha relação com a Gal, preservava a minha relação com a Wilma. E, nesse meio tempo, a gente combinou que a Wilma não iria frequentar as minhas reuniões. No caso, ia sempre a Gal, o Marcus Preto [produtor] e, de vez em quando, a assessora dela. Quando a Wilma ia, eu não fazia a reunião", diz ele, que revelou o motivo.
"Porque tudo o que a gente combinava ou a Wilma não fazia ou não assinava o contrato. Então, te resumindo: a Gal estava com uma empresária que não conseguia vender show, porque ninguém mais contratava ela por causa da Wilma. E eu, como conhecia as duas, quando morei lá [em Salvador], quando a Wilma me viu na Sony, falou: "bom, vamos tentar". Só que era assim. Tudo que a gente decidia "agora", daqui três horas, quando ela chegava em casa, Gal me falava: "Ai, Pacheco, não vai rolar". E eu: "mas por quê?" Era sempre a Wilma por trás. Aí falei: "Gal, ou a gente não lança mais o CD Estratosférica e a gente não vai fazer a sua turnê ou a partir de agora vamos fazer reunião só nós. Eu, você, o Marcus Preto e a Ana [assessora]". Um dia liguei pro Marcus, e falei: "Tô encerrando o trabalho com a Gal". E ele: "por que?". Eu: "por isso, isso e isso". "Então, a partir de agora a Wilma não faz parte mais"", recordou.
Devido ao estresse, Pacheco chegou a ter um problema de saúde. "Eu tive herpes-zóster de estresse. Fui internado no Albert Einstein, em São Paulo. Quem me ajudou foi a Gal, que ligou pro médico dela, que estava na plateia, e pediu pra ele ir pro camarim me ver. Foi ela que me ajudou, mas a gravadora se distanciou 90%. Só não foi 100%, porque eu era o conector. Eu era gerente de marketing e em especial isso nunca tinha acontecido. A gente resolveu investir no projeto. E neste investimento, eu terminei sendo o empresário dela via gravadora. Tudo lá era comigo. Desde gravação do clipe, da decisão de produzir LP, CDs, soltar um single. Nesse meio tempo, tive dois clipes vetados pela Wilma", revelou.
À publicação, ele deu mais detalhes sobre os vetos. "Era o clipe de 'Quando Você Olha Pra Ela', de autoria da Mallu Magalhães. Tava tudo lindo, pronto, autorizado. Ficou só entre eu, Gal, Wilma e Marcus Preto. A Gal pirou, adorou, achou que estava lindo. Mas quem assinava era a Wilma e e ela não autorizou a liberação. Quando viu, não foi bem assim que ela disse, mas disse: "se tiver travestis, não entra". Eu disse: "Mas Wilma, não tem travestis. É estética agênero". Ela: "travestis" [enfatizando]. Aí eu falei: "como é que a gente faz?". Ela: "edita". E eu: "mas tá no roteiro". O clipe não foi lançado. Foi orçado em R$ 90 mil. Tá arquivado, inédito. Esse primeiro eu não sei te falar precisamente se a propriedade dele chegou a ser da Sony por conta disso, dos contratos. Aí, na sequência, eu como Sony Music e como empresário, fechei parceria com a Sony Eletrônicos. Eles entraram junto com a gente e falaram: "vamos fazer mais, vamos soltar, vamos gerar conteúdo". Falei: "beleza". Aí gravamos outro clipe, no palco, de drone. Ficou maravilhoso, mas não foi lançado porque a Wilma disse que "a Gal não estava bonita".
Com dificuldade de diálogo, André decidiu pedir demissão. "O clipe estava maravilhoso e nem chegou a ser apresentado. O primeiro chegamos a comprometer orçamento em folha, etc. O segundo, não, porque ela brecou tudo antes. Brecou no sentido de... Não tinha diálogo. Aí eu pedi demissão. Foi um momento de troca de presidência. Antes eu que fazia a intermediação. Quando teve a troca, apresentei a Gal o presidente novo, todo mundo, mas, na sequência, na continuidade do trabalho, não conseguimos seguir. E aí, quando eu tive a minha crise de herpes-zóster, me afastei. Tirei dois meses de licença. A empresa perguntou se eu teria condições de pelo menos cuidar da Gal, já que ninguém tinha condições de lidar com a Wilma. Neste meio tempo, vou falar de uma maneira bem suave, mas interprete como quiser. A gravadora demitiu a Gal por conta da Wilma, porque ela não assinava nenhum contrato, não cumpria nenhuma norma e a Gal era a vítima. A Gal sempre foi a vítima", destacou.
"Foi uma pena enorme. Quando eu falo que ela era vítima, ao mesmo tempo que ela confiava muito em mim, no Marcus Preto, na assessora, todo mundo, ela também tinha uma dependência muito grande da Wilma. Se ela [Wilma] falasse: "vocês estão fora", todo mundo estava fora. Qualquer embate, quem ganhava era a Wilma. Em 28 anos, nunca ninguém ganhou uma briga envolvendo a Gal com a Wilma à frente. Tanto que, a distância dos "baianos" [Pacheco não especifica quem são] é por isso. Ninguém tinha acesso a Gal por conta dela", lamentou.
Pacheco, então, comenta a última fase de Gal e volta a falar sobre a dificuldade de lidar com Wilma nas decisões envolvendo a cantora. "Acho que a Gal só deu certo na última fase dela, porque tinha o Marcus Preto e a assessoria e ela confiou em mim. Nesta reta final dela, de gravadora. A última fase foi na Biscoito Fino. Mas ela chegou lá porque a Kati Almeida Braga, dona da gravadora, já estava entendendo tudo [sobre Wilma] e a Gal tava com o projeto pronto. Tanto que foi lá que ela lançou o DVD do CD Estratosférica, que eu lancei na Sony. E aí, eu nem sei que expressão usar... Na Sony a Wilma não assinava contrato, não devolvia dinheiro. A gente fez todo um planejamento. Produzimos caneca, camiseta, vinil, tudo. A gente só tinha o respaldo do Marcus Preto, que estava produzindo as músicas com a Gal. Fora isso, não conseguíamos assinatura para nada. A própria Gal falava: "pô, ninguém me quer". Eu disse: "querem, quem não tá deixando é a Wilma". Foi aí que a gente passou a não permitir que ela entrasse nas discussões de gravadora e não à toa eu passei a ser empresário dela, via gravadora, do projeto".
Procurada pela "Quem", a assessoria da Sony respondeu que não tem nada a comentar sobre o veto ao clipe de 'Quando Você Olha pra Ela' e ao período em que Wilma Petrillo tratou dos contratos de Gal Costa.
Relação de Wilma com Gal
Ainda em entrevista à "Quem", André diz que Gal não sabia que Wilma atrapalhava sua carreira. "Não. Na frente da Gal, a Wilma era a pessoa mais doce do mundo. Eu até estranhava muito quando as pessoas falavam dela. Não é que ela entregava a carreira na mão dela... É que a Wilma fazia uma coisa de “cortina de fumaça” na frente. Não à toa todo mundo que tentou ajudar conseguiu ajudar. Mas todo mundo teve um limite. Eu tive. O Preto teve. E ela [Wilma] mostrava um amor por pessoas que convivia… Ela nunca me fez nada", afirmou.
"Ela nunca me fez nada, porque ela nunca me viu como ameaça. Inclusive, quando eu falei: "ou você sai do circuito e eu trato direto com a Gal, com a Aninha e com o Preto ou a gente não vai investir na turnê". E ela: "não, eu tenho que assinar". E eu: "beleza". Foi aí que uma vez eu conversei só com a Gal e com o Preto no estúdio. E aí, a Wilma parou de frequentar as reuniões. Só que eu tive herpes-zóster, já consequência de um estresse, tanto que fiquei quase quatro meses pra poder de fato sair da Sony… Eu fiquei de três a quatro meses pra poder ser demitido porque eu tava de licença médica, com colar cervical, herpes-zóster de estresse. Neste tempo, acabou o diálogo da gravadora com a Gal. E rolou, não sei te falar detalhes, mas uma briga séria do presidente com a Wilma", continuou.
"E nesta fase eu nunca vi a Gal trabalhando tanto como ela estava. O Gabriel [filho da cantora] ia em tudo quanto é canto com ela. A Gal não fazia tarde de autógrafos há anos porque ela falava “ninguém me quer”. “Como não te quer?”, eu perguntava. “Eu queria tanto fazer o Serginho Groisman, mas ele não me quer”. O Serginho Groisman pedia ela toda semana para o programa, quem negava era a Wilma. Depois eu recebi um sim [pra que ela fosse ao Altas Horas]. Eu não sei como que era a conversa delas. Eu ligava paras pessoas, perguntava se tinham algum feedback [dos trabalhos]. Aí a Gal me ligava cobrando, por exemplo, a estreia do clipe e eu não sabia o que dizer. A partir disso a Sony pode falar melhor. O final foi assim. Eu me demiti da Sony, do stress, e o presidente botou a Wilma pra correr", concluiu.
Saída de Gal da Sony
Em meio a problemas, a saída de Gal da Sony aconteceu em 2016. "Em 2016, a Gal saiu da Sony. Não existia diálogo. O presidente da época realmente não falava mais com a Wilma. Ela [Wilma] mandava notas de cobrança para gente. A gente fazendo notas de show, contratos de turnê e ela fazendo a apática, vendendo um show paralelo de voz e violão, como está na matéria da Piauí. Ela ia fazendo essa coisa com todo mundo. Vendíamos um show pra Alagoas, digamos assim. Aí ela vendia mais três voz e violão [em outros lugares] e derrubava o nosso. O nosso, que eu falo, é o show de carreira, da turnê 'Estratosférica'. E a Gal falava: "pô, mas o que acontece que toda vez que chega perto do show, o show cai?" Aí a Gal começou a achar que o problema era nosso", disse ele, que conhece Wilma há mais de três décadas.
"E eu conheço a Wilma de 1990 e tantos… Antes de ser da Sony, eu já fui da EMI e já fui da BMG. Na BMG, eu fui contratado no auge do axé music e aí me pediram pra morar em Salvador. Pra cuidar da Daniela Mercury, Asa de Águia, Chiclete com Banana e Gal e Bethânia. Ambas eram da BMG e moravam na Bahia. Eu cuidava de uma espécie de marketing deles. Nesta época, foi que eu conheci muito bem a Wilma e pouco a Gal, mas frequentava muito a casa delas. A família da Gal não se dava com Wilma, ninguém se dava. E quando a Wilma viu uma possibilidade de fazer amizade comigo, ficamos amigos, na época. Isso em outro contexto. Quando ela era vizinha de Caetano na Bahia. Aí eu frequentava a casa, mas por exemplo. A Gal estreou Gal canta Tom Jobim em 1999 no Teatro Castro Alves numa sexta-feira. Sexta-feira, Wilma na porta barrando todo mundo: “ninguém entra”. Daí a Gal falou que queria a família lá dentro e a Wilma ficou do lado de fora. Foi nesse dia que o jogo virou pro meu lado em termos de posicionamento ou de ajuda da Wilma, no caso, pra trabalhar. Porque ela ficou do lado de fora do camarim, conversando comigo, e aí tudo começou a fluir com ela. Enfim, voltei da Bahia, voltei pro Rio, fui pra EMI, fui pra Sony, reencontrei a Wilma", relembrou.
O profissional também exaltou Gal Costa e diz acreditar que a artista tinha medo da solidão. "Vou te falar: a Gal é uma pessoa maravilhosa. A expressão que eu posso usar, talvez, é que ela foi iludida e tinha um certo medo da solidão. Da solidão, que eu falo, que a Wilma criou em sintomas nela. Porque a Gal nunca seria solitária. Nunca seria uma pessoa sozinha. Mas tudo o que a Wilma fez isolou a Gal".
Relação com Gal e Wilma após saída da Sony
À publicação, Pacheco contou como ficou sua relação com Gal e Wilma após deixar a Sony. "A Gal meio que me deu uma bloqueada momentânea... Até eu perguntar para a Wilma o que é que estava acontecendo. A Wilma... Já devem ter te falado isso: você manda uma mensagem para ela super séria e ela te responde com emoji, com vários emojis. Ela não se compromete. Ela não assina, literalmente, embaixo, sabe? E mesmo quando a Wilma liberava, no dia seguinte ou horas depois vinha para a gente: "ah, a Gal desistiu". "Mas desistiu do quê?" "Do show, da turnê". Mas como? E quando a gente falava com a Gal, a Gal respondia: "ué, mas não foram os músicos que desistiram?" E a gente falava: "não, Gal. Você desistiu de ensaiar, você não foi ao ensaio e os músicos desistiram". E ela dizia: "não, o que me disseram foi que os músicos não queriam fazer a turnê comigo". E aí começava tudo de novo... Começa uma mentira atrás da outra que eu já não tenho condições de te falar o que é verdade e o que é mentira", desabafou.
Acusações contra a viúva publicadas pela Piauí
André também revelou que demorou a ler a entrevista publicada pela revista Piauí e que se entristeceu em ver toda a repercussão da publicação. "Uma tristeza enorme porque eu fico vendo o que a Gal passou, que eu já via. Só que podiam ter visto isso antes. Tem muita gente que podia ter visto isso antes. Podia não, que viu, que percebeu e preferiu se afastar. Não vou te falar nomes porque também não tenho certeza de qual motivo as pessoas se afastaram, mas uma coisa eu te falo: eu tentei até onde eu pude, inclusive segurando a Gal na gravadora, pedindo para a Wilma se afastar e deu certo", disse à Quem.
"Ela [Wilma] sempre me acolheu muito e sempre me deixou muito à vontade. Ela me incentivava muito para ir até a Gal, porque ela tinha uma consciência de que eu pensava muito próximo dela. E aí, por fim, uma coisa que me deixou muito triste e eu fiquei muito abalado. Quando eu saí da Sony e deu todo esse problema, ela bloqueou o meu telefone da Gal, o meu WhatsApp. Eu falava com a Gal no WhatsApp o dia inteiro. E ela me tirou de tudo. A Wilma brecou tudo e mais uma vez colocou a Gal numa bolha e tirou a relação que ela tinha comigo. Consequentemente, eu não consegui nem falar sobre a Sony com ela para fazer uma saída digna. Ela foi demitida por conta da Wilma, não por conta da Gal", frisou.
"Vou te falar. Eu demorei três horas para ler a matéria da Piauí. Porque eu ia chorando, eu parava, meu coração dava taquicardia. A Gal sempre foi uma estrela para mim e eu sempre tratei ela como estrela até a hora que eu precisei tratá-la como uma amiga", desabafou.