Padre Fábio de Melo fala sobre o luto pela perda da mãe e alcoolismo do paiReprodução

Rio - O padre Fábio de Melo participou do "Conversa com Bial", na noite desta sexta-feira, para divulgar o lançamento de seu novo livro, "A Vida É Cruel, Ana Maria: Diálogos Imaginários Com Minha Mãe". Durante o bate-papo, o religioso contou como foi o luto após a perda de sua mãe e também comentou o vício do pai em bebidas alcoólicas. 
Em seu livro, o padre diz "depois que morre a minha mãe, morre também a minha obrigação de ser feliz". Pedro Bial perguntou se "essa frase é uma confissão de desencanto, de desistência, ou um grito de libertação?". 
"É um grito de libertação. Sempre que pensava na morte da minha mãe eu sabia que seria o pior dia da minha vida. Então eu vivi de fato o pior dia da minha vida. E quando eu vivi a experiência definitiva daquela finitude com ela, da minha relação com ela, vivi uma libertação também. Eu agora posso morrer. Vi minha mãe sepultar duas filhas, vi minha mãe visitar durante quatro anos um filho preso e eu sabia o quanto ela vivia o sofrimento de todos nós. Quando ela morreu foi a primeira coisa que pensei: 'pronto, agora se eu não quiser ser feliz eu não preciso mais'. Claro, não é a minha opção, mas é, de fato, uma realidade que se apresentou pra mim", explicou o padre, que perdeu a mãe em 2019, vítima da covid-19. 
O religioso também fala no livro que foi exposto a situações para as quais não estava preparado. "Eu fui exposto muito cedo a sentimentos para os quais eu não estava preparado. A traição do meu pai eu que descobri. Eu era um menino. Devia ter uns 6, 7 anos. Foi horrível, eu estava com ele. Ele, acreditando na minha inocência, que não estava identificando o que estava acontecendo. Não sei se ainda existe, mas tinha um chocolate naquela época que só os meninos ricos comiam. E eu comia toda vez que meu pai traía a minha mãe", revelou. 
Foi então que o padre contou sobre o problema de familiares com o álcool. "E meu pai foi um homem que teve uma fragilidade enorme que abriu portas para as outras que foi o álcool. O meu pai alcoolizado era um homem completamente diferente do homem sóbrio que nós tínhamos no dia a dia. Meu pai era um homem lindo, íntegro, de nobreza de alma. Só que quando ele bebia... É uma coisa que insisto muito como padre nas minhas pregações. O álcool destruiu a minha casa, continua destruindo pois ainda é um problema na vida de alguns irmãos. É genético, não tenho dúvida disso. Se eu me concedesse o direito de beber de vez em quando eu tenho medo de me transformar no meu pai", disse o religioso, que afirmou ainda que não foi uma criança "plenamente feliz". 
"Eu não tive tempo de ser criança. Já romantizei muito. Eu acho que hoje não tenho mais disposição para romantizar nada. A minha família não deu certo em muitos aspectos e nem por isso eu dei errado. Eu não sou um desastre como pessoa, procuro ajuntar os pedaços, mas eu tive uma família super desestruturada, extremamente difícil, para os meus irmãos também não foi fácil. E hoje eu preciso lidar com as memórias que não são boas sem que isso me transforme em uma vítima. Esse papel eu também não aceito, não quero", finalizou.