Ainda é possível ver os efeitos da crise causada pela pandemia de Covid-19 no Centro do Rio. Lojas comerciais com as portas fechadas, aumento da população de rua e a diminuição da circulação de pedestres. Porém, dados de fevereiro deste ano da Associação Brasileira de Administradoras de Imóveis (Abadi) apontam que cerca de 56% dos espaços comerciais — lojas, escritórios e salas — começam a ser ocupados. Em paralelo, iniciativas tentam reverter o esvaziamento econômico na área.
O processo de esvaziamento ganhou força a partir de março do ano de 2020, quando a pandemia do coronavírus se transformou em realidade no Brasil. Ao andar pela região, mesmo nos dias de semana e em horários antes muito movimentados, o esvaziamento é visível. Lojas fechadas, portas trancadas e algumas das principais ruas quase desertas.
Essa movimentação foi um choque para a economia da área, já que estava tornando-se uma febre a ocupação de empresas internacionais e nacionais de prédios comerciais de maior porte. "A pandemia deu uma puxada nessa tendência e as empresas foram desocupando os imóveis. A gente estima uma taxa de ocupação dos imóveis comerciais próxima de 30%, até um pouco abaixo, 28%", relata o presidente da Abadi, Rafael Thomé, sobre a situação do Centro no período pandêmico.
"Imóveis foram devolvidos, empresas fecharam, várias adaptaram a metodologia do home office. Isso acabou fazendo com que o Centro fosse ficando vazio, desocupado, dando lugar a incerteza. (...) Ficou uma situação muito delicada para o proprietário de imóveis, principalmente quando se trata dos maiores", acrescenta Thomé.
A questão é que algumas corporações não voltaram ao trabalho de forma totalmente presencial. Muitas empresas entenderam que o home office pode ser mais rentável ou trazer benefícios para o processo de produção.
"Aprenderam e gostaram de trabalhar assim; alguns imóveis foram adaptados para uso parcial. Algumas empresas têm espaço corporativo para reuniões. A gente vem percebendo que o que foi chamado de 'novo normal' não se estabeleceu completamente com o que a gente já vivenciou", ressalta o presidente da associação.
A Abadi prospecta para o fim deste mês o resultado da nova pesquisa do Indicador de Habitacional, que também contempla imóveis comerciais. Mas a expectativa é de uma progressão lenta. "A anterior já não chegou a 60% de ocupação. Cada vez mais vai despertar essa procura, mas ela é lenta e gradual. Então eu não esperaria nada exponencial agora. O número deve vir no mesmo patamar, um pouquinho acima, em uma evolução lenta", avalia Thomé.
"A recuperação do Centro é gradativa, porque ele tem muitas qualidades, mais do que se espera de um bairro, como transporte de nível excelente, você tem a possibilidade de chegar de avião, trem, barca, carro, ônibus ou BRT. Você tem praticamente toda a parte de locomoção disponível dentro do Centro e uma bela vista", pondera.
Imóveis residenciais
Para o presidente da Abadi, a solução do esvaziamento da região central da cidade requer uma ação mais ampla:
"O que falta no Centro, e a prefeitura com o programa 'Reviver Centro' está buscando essa evolução, é a conclusão da modificação da chegada de mais prédios comerciais do Centro. A gente tem mapeado prédios residenciais para serem entregues na região. Só que há a questão das lojas, que obviamente diminuiu a frequência como uma consequência d pandemia; a questão da circulação, que também diminuiu e acarretou no aumento do número de moradores de rua; e a segurança também diminuiu. Mas a gente já tem uma expectativa de que, com a chegada dos prédios residências, o Ccentro vai chegar a ter uma vida mais ativa, 24h", prevê.
O programa mencionado por Thomé é o projeto de revitalização lançado pela Prefeitura em 2021, o Reviver Centro. A iniciativa busca estimular a retomada de espaços habitacionais na região. Neste ano, a gestão municipal, por meio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS), realizou algumas mudanças na proposta, que será encaminhada à Câmara de Vereadores.
Segundo a secretaria, o objetivo das alterações é tornar o plano mais atrativo para o mercado imobiliário, com novas áreas que possam receber o potencial de construção investido no Centro e reduzir custos para os investidores, como isenção de pagamento de outorga nos primeiros cinco anos e isenção total de Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).
A atualização do programa pretende transformar a região com novos empreendimentos residenciais e atrair mais moradores para a área. De acordo com dados da Pasta, já foram feitos 35 pedidos de licença, dos quais 24 foram concedidos, somando 2.294 unidades residenciais. Outras 11 licenças estão em análise e somam mais 723 unidades residenciais. No total, já são 3.017 unidades previstas para construção ou retrofit na região nos próximos anos.
Para o subsecretário do SMDEIS, Thiago Dias, a expectativa é que as modificações acelerem o ritmo de incorporações de unidades residenciais no Centro.
"A nossa expectativa é de incrementar bastante esse primeiro ciclo imobiliário, dessa primeira janela de cinco anos, de modo a trazer mais moradores para o Centro da Cidade, aproveitando essa região que já é infraestruturada, que dispõe de serviço público e de transporte adequado, fazendo com que a ocupação coloque esse espaço da cidade em um novo período de prosperidade e desenvolvimento econômico e urbanístico", disse.
Pelo projeto, a geração de potencial construtivo será restrita aos setores Praça XV, Castelo e Cinelândia. O investidor que construir um prédio ou condomínio residencial nessas regiões receberá o benefício de utilizar 100% da Área Total Edificável (ATE) no próprio imóvel ou em outro empreendimento, no Centro ou em bairros de áreas receptoras. Nas regras em vigor, o benefício para o construtor é de 40%.
"Caso a construção reserve 20% das unidades para aluguel social, o potencial gerado pode chegar a 150% da área edificável", informou o órgão. Na prática, o investidor recebe o direito de construir mais pavimentos do que poderia sem essa permissão. As regras de gabarito de cada região "serão respeitadas e não serão sobrepostas pelo potencial adquirido no Reviver Centro", explica a pasta.
Chicão Bulhões, secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, explica que foi feita uma análise dos últimos anos, para que esse novo pacote de medidas, que é entendido como um "aperfeiçoamento do plano do Reviver", fosse realizado.
"A ideia é atrair cada vez mais investidores para a região dando mais incentivos públicos para o privado e reduzindo custos para construir residenciais no Centro. É este o objetivo deste esforço que a prefeitura vem fazendo desde o anúncio do programa", afirmou.
De acordo com Rafael Thomé, presidente Associação Brasileira de Administradoras de Imóveis, "a previsão é que em cinco anos a gente consiga ver uma transformação no Centro, para que ele passe a ser 24h. Com o Centro do Rio totalmente transformado, com uma vida mais ativa e com a economia sendo cada vez mais pungente na área".
Reviver Centro Cultural
Outra tentativa da gestão municipal para revitalizar a área é o programa Reviver Centro Cultural, quebusca estimular a ocupação da região por meio da Lei de Incentivo à Cultura da Prefeitura. A SMDEIS mapeou 136 lojas de fachada (de rua) que estavam fechadas. O programa pretende estimular a reabertura dessas unidades no quadrilátero delimitado pela Praça Pio X (Candelária), a Avenida Rio Branco, a Rua da Assembleia e a Rua Primeiro de Março.
Após o mapeamento, a prefeitura está chamando os donos dos imóveis e vai fazer a ponte com projetos culturais que tiverem interesse em se instalar no Rio. A administração municipal dará apoio financeiro para despesas como reforma e aluguel.
A prefeitura convocou os proprietários ou as pessoas que têm posse desses imóveis. Eles devem se inscrever, demonstrando interesse em alugar as lojas. Em um segundo momento, será feito uma chamada para projetos culturais: como galerias de arte, escolas de dança, escolas de teatro, livraria e ateliês. Uma comissão fará uma curadoria dos projetos e vai selecioná-los, a partir de alguns critérios estabelecidos.
Depois, os projetos serão somados às lojas que estão disponíveis. Será oferecido um valor para cada proposta, que pode ser utilizado para pagamento do aluguel e reforma do local. O valor é equivalente a R$ 75 por m², limitando a 192 m² o repasse. O recurso terá o limite de repasse de até quatro anos. As inscrições dos imóveis devem ser feitas pelo e-mail cpl@cdurp.com.br, até o dia 27.
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