Rio - Após anos de trabalho, o momento de solicitar a aposentadoria deveria ser tranquilo, mas para muitos brasileiros pode se tornar um verdadeiro pesadelo burocrático. Erros na documentação, cálculos incorretos e até informações desencontradas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) podem atrasar ou até reduzir o valor do benefício. Por isso, especialistas alertam que entender as regras e evitar falhas no processo pode fazer toda a diferença para garantir um descanso merecido sem dor de cabeça.
A definição do quanto vai ser pago na aposentadoria leva em conta o valor e o número de contribuições. Segundo o especialista em Direito Previdenciário, Washington Barbosa, se você não faz contribuições regulares, isso alonga o prazo para cumprimento dos requisitos.
"O ideal é que você faça contribuições frequentes. Mesmo que não seja assim, você poderá ter direito à aposentadoria, mas vai demorar um pouco mais de tempo", explica.
Especialista em Direito Previdenciário, Washington BarbosaDivulgação
Um dos possíveis problemas ao requisitar o benefício é não ter o número suficiente de contribuições para se aposentar. Ainda de acordo com Barbosa, isso é mais comum de acontecer com trabalhadores autônomos.
"Se nós estivermos falando de um segurado empregado, é bem difícil ter contribuições erradas, porque na verdade ele já vem direto debitado no seu contracheque. Então isso, um possível erro, ele diz respeito ao que a gente chama do segurado individual, ou do contribuinte individual, ou do contribuinte facultativo. O contribuinte individual é aquele que presta serviço para várias pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas. É o médico, o advogado, o pintor, o mecânico, várias pessoas que prestam serviço a empresas ou a outras pessoas físicas".
Já Letícia Costa, advogada especializada em Direito Previdenciário, destaca que o primeiro grande erro do trabalhador é não conferir o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) antes de pedir a aposentadoria. Esse documento é o histórico de todas as suas contribuições ao INSS.
"Se houver vínculos trabalhistas errados, valores incorretos ou períodos que não foram contabilizados, seu benefício pode ser negado ou concedido com um valor menor do que deveria. O ideal é acessar o Meu INSS, verificar todas as informações e, se houver alguma divergência, corrigir antes de fazer o pedido".
O confeiteiro Bernardo Sousa Carvalho ainda não recebeu o benefício, pois teve que pedir revisão do valor Arquivo pessoal
O confeiteiro Bernardo Sousa Carvalho, 65 anos, é um dos requerentes que deu entrada na aposentadoria, mas teve o pedido negado devido a inconsistências no tempo de contribuição. Após contratar um advogado, ele solicitou a aposentadoria por idade, porém ainda aguarda uma resolução do caso, pois pediu a revisão do valor do benefício.
"Recebi uma carta informando que receberia a primeira parcela no valor de R$ 602, mas logo percebi que tinha algo que não batia. Entramos com um pedido de revisão, o valor realmente estava errado e foi recalculado para um salário mínimo", conta.
A professora e fonoaudióloga Zeila Gadelha, 60 anos, também está enfrentando problemas para conseguir o benefício. Ela deu entrada na aposentadoria especial por tempo de contribuição em dezembro passado e, em fevereiro, também recebeu uma carta com exigências.
"Para dar entrada no benefício, o processo foi relativamente fácil. Mas tenho somente um mês de prazo para sanar as pendências exigidas. Estão me exigindo uma declaração para saber em que segmento eu trabalhava, sendo que essa informação consta na carteira de trabalho. Uma burocracia só para dificultar o processo", relata ela, que afirma que ainda vai tentar resolver a situação por conta própria.
A professora e fonoaudióloga Zeila GadelhaArquivo pessoal
Não guardar os comprovantes de contribuição também podem atrasar ainda mais a concessão do benefício. "Se o seu CNIS não estiver completo e você não tiver Carteira de Trabalho, carnês de contribuição ou holerites antigos, pode ser que o INSS não reconheça todo o seu tempo de serviço. Isso significa menos tempo de contribuição contabilizado e um benefício menor. A dica aqui é sempre guardar os documentos e, caso tenha perdido algo, buscar outras provas, como contratos de trabalho, extratos bancários e até testemunhas que possam confirmar sua atividade profissional", explica Costa.
MEIs devem ter atenção redobrada
Muitos segurados enfrentam problemas porque passam longos períodos sem contribuir ou contribuíram com valores errados. Esse fato pode pode atrasar a aposentadoria ou reduzir o valor do benefício. Autônomos ou MEIs que pagarem apenas 5% ou 11% sobre o salário mínimo, por exemplo, só terão direito a aposentadoria por idade e com um valor menor. Já quem deseja um beneficio maior, precisa contribuir com 20% sobre um salário maior.
Outro ponto é que o INSS aceita tempo de trabalho no exterior, desde que o país tenha acordo previdenciário com o Brasil. O mesmo vale para o tempo de serviço militar obrigatório.
"Se você não incluir essa informação no pedido, pode perder esse tempo e acabar precisando trabalhar mais anos para se aposentar", cita Costa.
A advogada especializada em Direito Previdenciário, Letícia CostaDivulgação
Por fim, Costa ainda destaca que o requerente não deve desistir após a primeira negativa: "Muitos pedidos são negados por erro do próprio INSS, falta de documentos ou falha no preenchimento. Se isso acontecer, você pode pedir a revisão do processo administrativamente ou, se necessário, entrar com ação judicial. Mas, nunca desista antes de esgotar todas as possibilidades!".
Brasileiros não têm cultura previdenciária
Planejar a aposentadoria ainda não é um hábito enraizado entre os brasileiros. Muitos só começam a se preocupar com a previdência quando já estão próximos de se aposentar, o que pode resultar em surpresas desagradáveis. A falta de cultura previdenciária faz com que muitos trabalhadores percam oportunidades de melhorar sua renda no futuro ou planejem errado, alertam especialistas.
O vendedor externo Esperidião Filogonio Vieira, de 67 anos, por exemplo, relata que contribuiu, em média, em cima de dez salários mínimos. Porém, hoje só recebe cerca de R$ 3 mil de benefício devido ao teto de pagamento.
"O valor que recebo hoje não atende as minhas necessidades. E como não tenho mais condições de trabalhar, o negócio é viver com o mínimo", diz.
O vendedor externo Esperidião Filogonio VieiraArquivo pessoal
Para não haver diferenças entre expectativa versus realidade, o advogado Paulo Meira Passos defende que todo mundo deveria fazer um planejamento previdenciário.
"Independentemente da sua idade ou situação financeira atual, é fundamental começar a pensar no seu futuro e se preparar para a aposentadoria. Quanto mais cedo você começar a se planejar, melhor será o resultado lá na frente. Vale ressaltar que o planejamento previdenciário é indicado para quem deseja ter uma aposentadoria tranquila, sem depender apenas do benefício do INSS", diz.
O advogado Paulo Meira PassosDivulgação
Também é essencial conhecer as regras de aposentadoria e escolher a melhor opção. "Com as mudanças na legislação, existem diferentes formas de se aposentar, e cada uma pode oferecer vantagens ou desvantagens dependendo do histórico de contribuição do segurado. Quem já contribuía antes da Reforma da Previdência pode ter direito às regras de transição, enquanto quem começou depois precisa seguir as novas exigências. Fazer simulações e entender qual regra garante o melhor benefício pode fazer toda a diferença", diz Costa.
Já Washington Barbosa aconselha o trabalhador a pensar na possibilidade de uma previdência complementar. "Lembrando que existem planos no mercado que tem contribuições de R$ 100, de R$ 150. Estou falando de duas caixas de cerveja. Se o jovem deixar de tomar sua cervejinha um fim de semana e contribuir, isso fará uma diferença enorme no futuro".
Para não esquecer
Como evitar pendências e reduções da aposentadoria
Registros corretos na carteira de trabalho: Exija o registro das datas de admissão e rescisão, cargos e salários em cada emprego. Guarde também o termo de rescisão contratual.
Revisão periódica do CNIS: Verifique seu histórico de contribuições no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS). Corrija discrepâncias, como vínculos e datas incorretas, antes de solicitar o benefício.
Documentação legível e completa: Anexe documentos pessoais (RG, CPF, certidão de nascimento) e todos os registros trabalhistas ao solicitar o benefício. Certifique-se de que a digitalização dos documentos seja clara.
Faça um planejamento previdenciário: Para isso, procure um advogado especializado de sua confiança. Ele trará informações precisas sobre o melhor benefício e renda para sua aposentadoria.
Conferência final antes de solicitar o benefício: Antes de enviar o pedido, revise todos os documentos anexados e os dados informados. Erros nessa etapa podem atrasar a concessão ou reduzir o valor da aposentadoria.
Planejando a aposentadoria na prática
- Simule sua aposentadoria no Meu INSS para entender seu tempo de contribuição; - Verifique periodicamente o CNIS para evitar surpresas; - Avalie se vale a pena contribuir mais para aumentar o valor do benefício; - Considere uma previdência privada como complemento;
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