O presidente dos EUA discursa durante o plenário virtual do Summit for Democracy sobre 'Democracia diante dos desafios globais' no Auditório do Tribunal Sul da Casa BrancaAFP

O presidente americano, Joe Biden, convidou as democracias nesta quarta-feira, 29, a se unirem contra Rússia e China, durante uma cúpula na qual prometeu injetar quase US$ 700 milhões (cerca de R$ 3,6 bilhões) para deter o retrocesso mundial do pluralismo.

Depois das críticas de que a primeira Cúpula da Democracia esteve excessivamente concentrada nos Estados Unidos, Biden nomeou como anfitriões desta segunda edição os líderes de países dos cinco continentes: Costa Rica, Holanda, Coreia do Sul e Zâmbia.

Para esta cúpula, quase toda virtual, o presidente americano convidou 121 líderes, incluindo os primeiros-ministros de Israel e da Índia, apesar das acusações de crescente autoritarismo que pesam sobre eles.

Idealizada por Biden como uma forma de restaurar a credibilidade dos Estados Unidos após a presidência do republicano Donald Trump (2017-2021) e da violenta invasão do Congresso em janeiro de 2021, a Cúpula enfrenta um novo desafio, devido à invasão russa da Ucrânia e à ofensiva diplomática da China.

O evento trabalhará para "fazer a Rússia prestar contas por sua guerra injusta e não provocada contra a Ucrânia, mostrando que as democracias são fortes", declarou Biden durante a abertura.

“Devemos embarcar em uma nova viagem para ressuscitar a democracia, que hoje está sob ataque”, afirmou, por sua vez, o presidente sul-coreano, Yoon Suk Yeol, que anunciou que seu país vai liderar a terceira edição da cúpula.

Biden propôs, nesta cúpula de dois dias, um fundo de US$ 690 milhões (cerca de R$ 3,5 bilhões) para promover a democracia no exterior, informou uma autoridade americana.

O dinheiro será destinado ao financiamento de eleições livres, à promoção de veículos de comunicação independente e ao fortalecimento da ação contra a corrupção. Na primeira, ele prometeu US$ 424 milhões (R$ 2,1 bilhões).

O governo americano também anunciará uma iniciativa com cerca de dez países aliados para combater o uso indevido e a proliferação de programas espiões ("spywares"). Os Estados Unidos temem que esse tipo de "software" tenha se tornado uma ferramenta da China, à medida que sua influência tecnológica aumenta.

Há dois dias, Biden restringiu para o governo americano o uso de "spyware" comercial, enquanto no Congresso os republicanos se mobilizam para conseguir proibir o TikTok, o aplicativo de compartilhamento de vídeos que é uma subsidiária da empresa chinesa ByteDance.

Netanyahu e Modi 
Na terça-feira (28), Biden manifestou preocupação com Israel, cujo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu deseja realizar uma reforma judicial, apesar das críticas ao caráter antidemocrático da proposta.

Netanyahu, que suspendeu as medidas, ao menos temporariamente, devido aos fortes protestos, considerou na cúpula que a aliança com os Estados Unidos é "inabalável" e se referiu a Biden como "um amigo de 40 anos".

Israel "foi, é e sempre será uma democracia orgulhosa, forte e dinâmica como um farol de liberdade e prosperidade compartilhado no coração do Oriente Médio", afirmou Netanyahu.

O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, país visto pelos Estados Unidos como um baluarte contra a China, também exaltou as virtudes da democracia. Há poucos dias, o chefe da oposição política na Índia foi expulso do Parlamento, após ser condenado por "difamar" o líder de direita.

A Índia é a "mãe da democracia", disse Modi, cujo governo também é acusado de aumentar a repressão à imprensa.

Biden se recusou a convidar alguns líderes, como o turco Recep Tayyip Erdogan, candidato à reeleição em maio depois de duas décadas no poder, e o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, um crítico dos valores liberais. Também não convidou alguns de seus aliados próximos, como Bangladesh, Singapura e Tailândia.

Mais despotismo
O secretário-geral da ONU, António Guterres, advertiu, sem rodeios, que o mundo atravessa um "choque dramático", em meio ao qual os valores democráticos estão "sob ataque". Como exemplo, citou as restrições à imprensa e aos defensores dos direitos humanos.

"Hoje vemos mais e mais despotismo e menos e menos esclarecimento", disse ele na cúpula.

"A história tem mostrado, repetidas vezes, que a liderança autocrática não é o garante da estabilidade, é um catalisador do caos e do conflito", acrescentou.

Os Estados Unidos identificaram a China como o único adversário de longo prazo da ordem internacional liberal liderada por Washington e convidaram Taiwan para a cúpula, apesar de não reconhecerem essa democracia autônoma.

Nesse contexto, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Mao Ning, considerou que a cúpula “aumenta a confrontação” e “avivará a divisão em nome da democracia”.

O embaixador da Rússia em Washington, Anatoly Antonov, acusou os Estados Unidos de hipocrisia e destacou os problemas de "racismo, violência armada, corrupção e desigualdade social" no país norte-americano.

"Vimos as consequências desastrosas das tentativas de exportar a democracia americana, à força, para Iraque, Líbia e Afeganistão", declarou.