Com a crise dos cereais, as tensões com a Polônia, ou as críticas sobre sua estratégia militar, as frentes diplomáticas se multiplicam para o presidente Volodimir Zelensky, que se esforça para manter o apoio ocidental à Ucrânia. Mais de 18 meses após a invasão russa, ele teme o cansaço da opinião pública europeia e americana, além de enfrentar críticas.
Lançada em junho, a contraofensiva ucraniana foi retardada pelas sólidas linhas de defesa russas, e um rápido avanço das tropas de Kiev parece improvável. "A Rússia provavelmente aproveitará este tempo para cavar ainda mais [trincheiras] e construirá novas fortificações para se preparar para a primavera", disse Margo Grosberg, diretor dos Serviços Secretos da Estônia, em entrevista ao portal The Insider.
"Está claro, inclusive para aqueles que apoiam a Ucrânia com maior convicção, que essa guerra pode durar até 2024, ou mesmo 2025", comentou Mick Ryan, um general australiano reformado.
Dúvidas do Partido Republicano
Depois de ter defendido sua causa na sede da ONU em Nova York, Zelensky chegou nesta quinta-feira, 21, a Washington, para falar sobre um eventual enfraquecimento do apoio militar americano à Ucrânia. Zelensky teme essa possibilidade, sobretudo, no caso da vitória de um candidato republicano na eleição presidencial ano que vem nos Estados Unidos.
Segundo Mick Ryan, "há um ano", no Congresso, "vários grupos de interesse pressionam para reduzir, ou interromper, a ajuda militar” à Ucrânia, com postulados isolacionistas, ou recordando as tensões entre Estados Unidos e China.
"Tenho várias perguntas para ele. Pode nos prestar contas do dinheiro que já gastamos? Qual é sua estratégia para a vitória?", disse o presidente da Câmara de Representantes, o republicano Kevin McCarthy, na terça-feira, sobre seu debate com Zelensky esta semana.
Tensões com a Polônia
Além dos Estados Unidos, o apoio dos países europeus à Ucrânia também poderá se enfraquecer. A Polônia, que até agora era um dos principais aliados de Kiev, convocou o embaixador ucraniano em Varsóvia, "urgentemente", na quarta-feira, 20.
Essa decisão foi tomada em protesto contra as declarações de Zelensky na ONU, onde disse que "alguns países fingem sua solidariedade e apoiam a Rússia, indiretamente".
Segundo Ivan Klyszcz, analista do International Centre for Defence and Security (ICDS), porém, "estes episódios de desconfiança mútua não vão alterar o curso global" do apoio polonês e europeu à Ucrânia. "Kiev considera a Polônia um parceiro essencial, e Varsóvia quer evitar uma derrota ucraniana", acrescenta este especialista.
Discórdia por causa dos grãos
Desde fevereiro de 2022, devido ao bloqueio russo no Mar Negro, os países vizinhos da Ucrânia se tornaram zonas de trânsito inevitáveis para os grãos e cereais ucranianos, exportados para a África e o Oriente Médio. Ante a saturação dos armazéns e o colapso dos preços locais, no entanto, vários países do Leste Europeu decretaram um embargo unilateral aos cereais ucranianos.
A Comissão Europeia então aprovou restrições temporárias, mas anunciou, recentemente, que não pretendia prorrogá-las, irritando os governos polonês, húngaro e eslovaco, que restabeleceram seus próprios embargos. Kiev respondeu a estas medidas, anunciando, na segunda-feira, 18, uma denúncia na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra os três países.
À medida que essas tensões comerciais crescem, também surgem divergências sobre a conveniência de se negociar (ou não) um acordo de paz com a Rússia. Em agosto, Stian Jenssen, chefe de gabinete do secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Jens Stoltenberg, insinuou que a Ucrânia poderia ceder uma parte do seu território à Rússia em troca da adesão à aliança militar transatlântica.
Dada a polêmica gerada por essa declaração, Stoltenberg assegurou que "são os ucranianos, e apenas eles, que decidem (…) que solução é aceitável".
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