O secretário-geral da ONU, António GuterresAFP
"O secretário-geral está muito alarmado com a deterioração da situação no país, assim como por seu impacto perturbador nas vidas dos equatorianos", afirmou Stéphane Dujarric. O porta-voz da ONU acrescentou que Guterres "condena energicamente estes atos criminosos de violência" desatados nos últimos dias.
Centenas de militares protegem as ruas desertas ao redor da sede presidencial, no centro de Quito, enquanto no norte, o parque La Carolina, o maior da cidade de quase três milhões de habitantes, estava vazio, sem seus habituais atletas.
Poucos carros circulam nas avenidas da capital e de Guayaquil (sudoeste), onde armazéns e lojas de bairro permanecem fechados.
"Há medo, é preciso ter cautela, olhar para um lado, para outro, se eu pegar esse ônibus, o que vai acontecer", disse uma mulher de 68 anos à AFP, sem revelar sua identidade, acrescentando que vai "aterrorizada" para o trabalho, um escritório no norte de Quito.
A ofensiva de organizações criminosas, ligadas a cartéis do México e da Colômbia, incluiu uma invasão inusitada e espetacular gravada ao vivo na terça-feira. Homens armados com fuzis e granadas tomaram conta de um canal público de televisão durante o noticiário do meio-dia, ameaçaram jornalistas e atiraram em dois funcionários.
Não houve mortes, e vários agressores foram presos.
O ataque em Guayaquil à sede do canal TC Televisión aumentou o pânico entre a população, que rapidamente saiu das ruas para se proteger em suas casas.
'Conflito armado interno'
Diante da nova onda de violência, o presidente Daniel Noboa, de 36 anos, declarou o Equador em "conflito armado interno" na terça-feira, depois de decretar estado de emergência na segunda.
O terror se impôs após a fuga de Adolfo Macías, conhecido como "Fito", chefe da principal quadrilha criminosa do país, Los Choneros, que estava detido em uma prisão de Guayaquil.
Centenas de soldados e polícias procuram Fito, enquanto vigora um estado de exceção em todo o país, inclusive nos presídios, além de um toque de recolher obrigatório de seis horas, a partir das 23h locais (1h em Brasília).
Na terça-feira, outro chefe do crime escapou da prisão. Fabricio Colón Pico, um dos chefões de Los Lobos, é acusado de sequestro e planejamento do assassinato da procuradora-geral.
Os detentos se amotinaram em diferentes prisões e detiveram mais de 100 agentes penitenciários.
Vídeos não verificados que circulam nas redes sociais mostram supostos reféns sendo ameaçados com facas e a suposta execução de pelo menos dois guardas: um baleado, e outro, enforcado.
Preocupação internacional
Em mensagem divulgada na rede X, o chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, disse estar "profundamente preocupado com o aumento da violência no Equador orquestrada por grupos criminosos. É um ataque direto à democracia e ao Estado de Direito".
"A UE está junto ao povo do Equador e às suas instituições democráticas, e expressa solidariedade para com as vítimas", completou.
França e Rússia advertiram seus cidadãos para não viajarem para o Equador, e o Peru declarou toda a sua fronteira com o vizinho sob estado de emergência.
Localizado entre Colômbia e Peru, os maiores produtores de cocaína do mundo, o Equador foi, durante muitos anos, um país a salvo do narcotráfico. Nos últimos tempos, porém, foi transformado em um novo bastião do tráfico de drogas, com cerca de 20 gangues disputando o controle do território, mas unidas em sua guerra contra o Estado.
O ano de 2023 terminou com mais de 7.800 homicídios, e 220 toneladas de drogas, apreendidas, novos recordes nesse país de 17 milhões de habitantes.
Noboa chegou ao poder em novembro como o presidente mais jovem da história do país, com a promessa de enfrentar o tráfico de drogas com mão forte. Foi eleito por 18 meses para completar o mandato de quatro anos de seu antecessor Guillermo Lasso.
Seu decreto de "conflito armado interno" concedeu "status" de beligerante às gangues e permitiu ao governo tomar medidas para enfrentá-las. Mas os tiroteios, os sequestros, as extorsões, as fugas de prisioneiros e os motins carcerários não param.
Fito cumpria pena de 34 anos na Penitenciária Regional de Guayaquil por crime organizado, tráfico de drogas e homicídio. Sua figura obesa e com cabelos bagunçados deu a volta ao mundo após o assassinato, em agosto, do candidato presidencial Fernando Villavicencio, que o havia denunciado dias antes por ameaças.
É a segunda vez que o chefão do crime foge da prisão. Em 2013, junto com outros presos, conseguiu escapar dos controles da prisão de segurança máxima conhecida como La Roca, em Guayaquil. Foi recapturado três meses depois.
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