Cenário da tragédia que aconteceu em Petrópolis, em fevereiro deste anoCarl de Souza / AFP
Publicado 06/07/2022 16:24
Rio - Casos de deslizamentos de encostas vêm se tornando comuns no país. O caso mais recente aconteceu mês passado, quando 129 pessoas morreram após a queda de uma barreira na cidade de Recife, estado de Pernambuco. No Rio, fluminenses já presenciaram diversas tragédias de mesma causalidade, como o mais recente, em Praça Seca, Zona Oeste do Rio, e o de Petrópolis, após intenso temporal. Neste último, foram 233 mortos.
Posto o problema, o Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), está coordenando desde janeiro deste ano o projeto SABO, mesmo nome dado às Barreiras de Retenção de Fluxo de Detrito, no meio técnico. O projeto, que visa solucionar problemas relacionados a deslizamentos nas encostas brasileiras, vai atuar a partir do levantamento de dados e assimilação da experiência estrangeira, que culminará na elaboração de um Manual Técnico para a execução de obras e projetos. Serão investidos R$1,86 milhões, com previsão de duração de 60 meses.
A pesquisa é fruto da cooperação técnica entre governo brasileiro e japonês, além da parceira com a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sedec), com o Departamento de Obras de Proteção de Defesa Civil (DOP), com a Coordenação Geral de Prevenção e Projetos Estratégicos (CGPP) do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).
Coordenado pelo professor de Engenharia Geotécnica da Coppe Maurício Ehrlich, o manual técnico vai servir de base referencial para o desenvolvimento de projetos de engenharia e para a implantação de obras de prevenção que visam a redução do risco e a prevenção de desastres relacionados aos deslizamentos, no Brasil. No Rio, algumas cidades já foram escolhidas para receber ações do gênero, como Nova Friburgo e Teresópolis, ambas na Região Serrana do estado. Nelas, as atividades de levantamento de informações começaram em janeiro e abril, respectivamente.
O professor Ehrlich afirma que, sob condições de chuvas intensas e prolongadas, com grande potencial destrutivo, as ocupações urbanas construídas nessas encostas acabam sofrendo graves consequências, como danos materiais e perdas humanas. As massas de detritos, que podem transportar árvores, rochas, pedregulhos, areia e lama, nesses deslizamentos geralmente vêm em alta velocidade, com alta capacidade erosiva e grande poder de destruição.
Vale lembrar que ambas as cidades passaram por tragédias relacionadas ao deslizamento de solos. Em 2011, Nova Friburgo e Teresópolis registraram um dos maiores desastres naturais do país: um deslizamento matou mais de 900 mortos e deixou mais de 100 desaparecidos.
Mesmo com os estudos, o professor reconhece o grande desafio que o fenômeno constitui para a Engenharia Geotécnica e que o projeto pode ser mais um passo para o seu entendimento. "A compressão do fenômeno, sua previsibilidade e ações de mitigação ainda carecem de estudos e pesquisas na área que fortaleçam o estágio atual de conhecimento no país. Por isso, este projeto se justifica por permitir o desenvolvimento de estudos aprimorados sobre esse processo destrutivo que considere a identificação das áreas suscetíveis a sua ocorrência, além de concepções de projetos e obras necessárias ao seu controle", disse.

Por que o Japão?
O eixo principal da pesquisa é baseado na experiência japonesa com as Barreiras SABO. O professor Maurício Eherlich explica que o Japão se destaca no mundo por seu relevo predominantemente montanhoso e por ser frequentemente acometido por grandes deslizamentos, tecnicamente chamados de debris flow. Lá, os japoneses vêm utilizando as Barreiras de Retenção de Fluxo de Detrito há mais de um século.
Já no Brasil, o fenômeno de debris flow está associado ao regime pluviométrico intenso, que é típico do país, ao seu relevo montanhoso e à ocupação antrópica, ou seja, pelo homem. "Nesse sentido, a assimilação da ampla experiência japonesa em retenção de debris flow será muito importante, a fim de permitir ao Brasil o desenvolvimento de métodos próprios de investigações, modelos de concepção de projetos e de obras para controle de fluxo de detritos, baseados em casos de sucessos dos japoneses", conclui o professor da Coppe.
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