Indiane Passos, prima da meninaReginaldo Pimenta/Agência O DIA

Rio - "Quem deveria estar nos defendendo só está nos matando. Dentro de favela não tem só bandido, tem trabalhador, estudante e crianças querendo um futuro melhor". O desabafo é de Indiane Passos, prima da menina Eloah Passos, de 5 anos, que morreu após ser atingida por uma bala perdida dentro da própria casa, no Morro do Dendê, na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio, na manhã deste sábado (12). A criança chegou a ser socorrida por um mototáxi e uma vizinha para o Hospital Municipal Evandro Freire, mas já chegou sem vida.
Na porta do hospital, Indiane deu detalhes da tragédia. "Meu irmão me ligou por volta das 7h, desesperado, dizendo que ela tinha tomado um tiro. Ela estava na cama pulando e brincando. Ontem (sexta) foi 'mêsversário' da irmã dela, e ela só queria brincar e comer os doces, mais nada. A mãe escutou o tiro, que entrou pela janela, e quando foi ver, ela estava com um buraco no peito e não tinha mais o que fazer", disse a prima, emocionada.
"O Estado tem que rever isso, dentro de uma favela pode sair um juiz, um delegado, um advogado e até um médico. Não pensa em quem está dentro da comunidade... A gente fica revoltado porque a gente só quer justiça. [Hoje] foi uma criança de 5 anos, mas não vai parar por aqui. Há uma semana, foi baleado um estudante na Cidade de Deus, que só queria ser jogador de futebol. Minha prima tinha cinco anos, uma vida inteira pela frente", completou Indiane.
O disparo que atingiu a menina, segundo familiares e outras testemunhas, teria sido efetuado por policiais militares que atiraram para o alto na tentativa de dispersar uma manifestação na região, ocasionada pela morte de um adolescente de 17 anos durante abordagem. A PM afirma que o rapaz estava armado e que houve confronto.
"Infelizmente saí para trabalhar hoje cedo e recebi a triste notícia de que minha netinha de consideração foi covardemente atingida por falta de preparo da polícia. Chegaram no pé do morro já atirando, sem saber se tinha trabalhador descendo ou pai de família indo ao mercado", lamentou Fábio Santana da Cruz.
Tensão 
Um adolescente de 17 anos morreu baleado, no início da manhã deste sábado, na Ilha. Segundo testemunhas, tudo teria começado após PMs abordarem uma motocicleta onde W. E. estava na garupa. Perto dos agentes, no entanto, o rapaz teria levantado os braços, provocando o disparos. Ele ainda chegou a ser levado pelo Corpo de Bombeiros para o Hospital Municipal Evandro Freire, no mesmo bairro, onde morreu.
Em protesto, moradores do Morro do Dendê queimaram pneus e fizeram barricadas numa das entradas da comunidade. Dois ônibus também foram incendiados na região. A PM afirma que o adolescente estava com uma arma e houve confronto. Pouco depois, a criança foi baleada em casa, enquanto brincava em seu quarto.
Em nota, a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que "uma equipe do 17° BPM (Ilha do Governador) teve atenção voltada para dois homens em uma motocicleta, na Rua Paranapuã, onde o ocupante de carona portava uma pistola. De acordo com os policiais que atuaram na ação, após uma tentativa de abordagem, o indivíduo disparou contra a equipe, e houve revide. O suspeito foi ferido e socorrido pelo Corpo de Bombeiros ao Hospital Municipal Evandro Freire. O homem que conduzia a motocicleta foi levado à 37ª DP a fim de prestar esclarecimentos".
Ainda de acordo com a corporação, "posteriormente, um grupo de manifestantes ateou fogo em um ônibus na Rua Paranapuã e o Batalhão de Rondas e Controle de Multidão (RECOM) foi acionado em apoio, além do Corpo de Bombeiros, para conter as chamas. O RECOM atua neste momento com patrulhamento por toda a região do ocorrido e em tentativas de obstrução das vias. O Grupamento Aeromóvel também atua em apoio, monitorando a movimentação das vias".
A PM informou, ainda, que o comando do 17° BPM foi informado sobre uma criança baleada no interior da comunidade do Dendê e que foi socorrida por familiares. Segundo informações colhidas por testemunhas, a vítima teria sido atingida no interior de sua residência. "Ressaltamos que não havia operação policial no interior da comunidade. O comando da unidade instaurou um procedimento apuratório para averiguar a conjuntura das ações", explicou a corporação.
A ocorrência foi registrada pela Delegacia de Homicídios da Capital e pela 37ª DP (Ilha do Governador). A PM informou ainda que a Corregedoria da corporação acompanha os trâmites. Procurada, a Polícia Civil disse que a Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) foi acionada. Os pais da criança foram chamados para prestar depoimento.
*Colaborou Reginaldo Pimenta