Publicado 15/08/2023 11:02 | Atualizado 15/08/2023 11:07
Rio - A Polícia Militar informou, nesta terça-feira (15), que instituiu a prática de treinamento extraordinário obrigatório a todos os agentes envolvidos em ocorrências que tenham resultado em óbito ou lesão corporal grave. A medida foi adotada após as mortes de uma criança de 5 anos, dois adolescentes de 17 e 13, e um jovem de 26 anos, em apenas uma semana no município do Rio. O objetivo da corporação é reduzir danos em ações de abordagens de veículos em vias públicas.
Os policiais militares envolvidos nas mortes de Guilherme Lucas Martins Matias, no dia 6 de agosto, em uma abordagem no Morro do Santo Amaro, no Catete, Zona Sul; do adolescente T.M.F, de 13 anos, morto a tiros na Cidade de Deus, Zona Oeste, no dia 8 do mesmo mês; e da menina Eloah Passos, 5, e do jovem W.E, 17, após serem baleados no Morro do Dendê, na Ilha do Governador, Zona Norte, no último sábado (12), estão matriculados no treinamento compulsório que tem início no próximo dia 21.
A decisão foi formalizada no boletim interno da corporação, na última sexta-feira (11), e estabelece que o comandante da unidade responsável pela ação deve efetivar, em no máximo dois dias, a matrícula dos militares envolvidos no Estágio de Aplicações Táticas (EAT), treinamentos de rotina destinados a aprimorar a capacitação operacional da tropa. "Uma das orientações estratégicas é a capacitação contínua da tropa, especialmente no aprimoramento dos policiais militares que trabalham na atividade-fim", disse o secretário de Estado da PM, coronel Luiz Henrique Marinho Pires.
Ainda de acordo com o coronel, também será aplicado o Treinamento Operacional Policial (TOP Noturno), desenvolvido em ambiente de baixa luminosidade. Os treinamentos desenvolvidos no Centro de Instrução Especializada e Pesquisa Policial (CIEsPP) da Polícia Militar contemplam a área operacional, como técnicas de abordagem e prática de tiro, além de conteúdos teóricos, como legislação e normas internas da corporação. Entre janeiro de 2022 e até o primeiro semestre deste ano, cerca de dois mil PMs passaram pelo EAT e quatro mil pelo TOP Noturno.
"É um treinamento preventivo que toda tropa passava. Mas, agora, independente de continuar o treinamento preventivo, quem se envolver nesse tipo de ocorrência vai ser obrigado a passar e a gente vai dar um tratamento diferenciado para esse tipo de policial que se envolveu nessa ocorrência, um acompanhamento mais de perto, identificar os erros da abordagem que ele fez ou da ação que ele adotou. Então, a gente vai trabalhar em cima de quem causou problema ou de quem se envolveu numa ocorrência de uma forma mais direcionada", explicou o secretário, em entrevista ao 'BDRJ' da TV Globo. Ele ainda ressaltou o objetivo de minimizar impactos das ações policiais.
"A gente está intensificando as instruções em cima dos nossos protocolos, em cima dos nosso procedimentos, palestrar vão ser intensificadas, treinamentos vão ser intensificados, sempre procurando condicionar melhor o nosso policial militar. A gente entende que situações podem acontecer, mas temos que estar preparados, capacitando nosso policial permanentemente para que isso possa ser minimizado (...) Acho que talvez seja essa a grande definição: manter a instrução de caráter pemanente, diária, regular em cima da tropa, orientando, buscando apoiar, buscando trabalhar em conjunto. E assim, a gente busca minimizar todo esse impacto que acontece nessas comunidades que, repito, não é uma coisa que objetivamos, mas que, infelizmente, em alguns momentos acabam acontecendo".
Durante a entrevista ao BDRJ, Pires lamentou a morte de Eloah. A criança foi baleada dentro de seu quarto, no momento em que PMs controlavam uma manifestação pela morte de W.E, na mesma comunidade. A corporação informou que não havia operação no local quando a menina foi atingida, mas a família afirma que não ocorreu troca de tiros e que o disparo partiu de agentes que atuaram na região. Os policiais envolvidos já prestaram depoimento na Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), tiveram as armas apreendidas e o comandante do 17º BPM (Ilha do Governador) foi afastado do cargo. As câmeras corporais deles também são analisadas.
"Essa fatalidade que a atingiu a menina (Eloah) é um fato que a gente está apurando, acho que a gente tem que entender o que aconteceu naquele cenário. Temos total intenção e desejo de que todos os fatos sejam esclarecidos da melhor maneira possível, total transparência da nossa parte. Os policiais foram afastados das atividades, foram transferidos das suas unidades, para que a gente possa (ter) total transparência, total lisura na apuração. As câmeras dos policiais da Ilha do Governador já foram recolhidas, as imagens já foram encaminhadas para a DH. Eu liguei pessoalmente para o diretor (do Departamento) de Homicídios do Estado e coloquei toda a nossa estrutura à disposição, qualquer tipo de informação que ele desejar, que faça contato direto comigo, para que a gente possa ter celeridade, a gente tem total interesse em apuração dos fatos".
Horas antes da morte da menina, um adolescente de 17 anos morreu em uma ação policial, na Rua Paranapuã. Segundo a PM, a morte aconteceu depois que agentes notaram dois homens em uma motocicleta e o garupa com uma pistola na cintura. Na tentativa de abordagem, W.E teria atirado contra os agentes e houve confronto, que o deixou ferido. O baleado chegou a ser socorrido, mas não resistiu. Mas, testemunhas contaram que quando ele teria levantado os braços, os agentes atiraram. O jovem teria completado 18 anos nesta segunda-feira. Ele e Eloah foram sepultados no domingo e na segunda-feira, respectivamente.
No dia 8 de agosto, T.M.F, de 13 anos, foi morto em uma ação do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) na Cidade de Deus. Na ocasião, a corporação informou que a equipe estava realizando um patrulhamento na esquina da Estrada Marechal Miguel Salazar com a Rua Geremias, quando dois homens em uma motocicleta atiraram contra os militares. Entretanto, parentes alegaram que tiveram acesso a imagens que mostrariam o momento em que um policial militar atira contra o jovem. Segundo eles, o vídeo foi registrado pela câmera de segurança de um borracheiro, que fica próximo ao local onde o menino foi morto, mas os agentes teriam conseguido apagar o momento da suposta execução.
Dois dias antes, o frentista Guilherme Lucas Martins Matias foi morto a tiros, quando voltava da comemoração de seu aniversário em um baile funk, no Morro do Santo Amaro. A versão apresentada pelos policiais é de que o carro não respeitou uma abordagem, avançou contra a equipe e que o carona estava com uma pistola. A ação deixou outras duas pessoas feridas e o motorista do veículo em que o grupo de cinco amigos estava declarou que os militares atiraram sem dar ordem de parada, quando eles entraram na contramão de uma rua da região e que não havia ninguém armado no automóvel.
"A gente lamenta muito os fatos que aconteceram, a gente tem um momento de profunda tristeza na corporação, então lamentamos muito os fatos que aconteceram. Tenho certeza que nenhuma policial militar sai de casa, beija seu filho de manhã e sai para trabalhar com essa intenção, não existe isso na corporação. Temos protocolos rígidos e isso ontem foi cobrado dos comandantes de área, que os protocolos que nós temos sejam seguidos, sejam executados, que a tropa seja orientada diariamente. Não existe em nossos protocolos nenhum tipo de orientação para que, a partir de o momento que o carro não pare em uma abordagem, que ocorra qualquer tipo de disparo. Não existe isso, a orientação é cercar, é comunicar via rádio, então isso foi cobrado ontem dos comandantes", completou o secretário.
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