O Rei da Angola participou de um debate no MuhcabDivulgação/Babi Reis
A conversa com o tema "Futuro ancestral - História, reparação e avanço" foi mediada pela jornalista Louise Freire e pelo professor doutor babalaô Ivanir dos Santos.
"Chegou o momento de nos unirmos e cumprir a vontade dos nossos ancestrais", disse o rei, na língua umbundu, a segunda mais falada em seu país, depois da portuguesa. Tchongolola foi recebido no palco sem aplausos - uma questão protocolar - saudado por Louise Freire, que abriu a bateria de perguntas a ele sobre os efeitos da escravidão em seu povo.
"Aos 7 anos, já ouvia sobre os povos ancestrais. Éramos um reinado organizado, com ministros, tudo estava bem. Quando chegou a primeira fase da colonização, foi o momento mais difícil. O colonizador não respeitou nossa tradição, cultura, o poder tradicional. Isso fez com que muitos reis africanos fracassassem, levando o colonizador a entrar em todo o continente africano", comentou Ekuikui.
O Rei de Angola pontuou mais dois momentos cruciais que marcaram a história de seu país: a guerra civil iniciada em 1975 (o ano da "independência") e os tempos atuais com a globalização.
"Nossa foco agora é reencontrar e reestabelecer nossa identidade cultural. A globalização destrói tudo aquilo que é nosso. Identidade cultural, língua, monumentos etc". Em sua fala, Tchongolola Tchongonga Ekuikui também desmistificou narrativas históricas e falou em resgate.
"Se alguma vez disseram que os negros nascidos no Brasil eram filhos de escravizados é mentira, são filhos de reis e rainhas africanos. Eu vim cumprir uma profecia e reencontrar a vontade dos nossos ancestrais, que sempre souberam que precisávamos lutar com a sabedoria para alcançar a via mais segura para chegar ao triunfo. Enquanto houver misticismo, essa amizade não vai acontecer de fato. Precisamos de uma mudança muito rápida. Somos mal interpretados, se eu deixar meu cajado aqui ele fica por anos", destacou.
O mito do fim da escravização, cultura e pluralidade religiosa
O debate continiou com um recorte sobre escravização, cultura e pluralidade de religções. "A escravização acabou no papel, mas o racismo e as diferenças persistem", afirmou Tchongolola Tchongonga Ekuikui.
Na Zona Portuária, lembrou Ivanir dos Santos, "debaixo desse solo tem milhares de pessoas encerradas, um território sagrado onde também floresceu nossas resistências. Seja cultural, Tia Ciata com o samba, seja em outras frentes, lugares de práticas religiosas etc".
Após um almoço no Muhcab, Sua Majestade - 37º da sua linhagem - participou de uma caminhada até o Cais do Valongo. Mais um destaque na programação especial para o mês da Consciência Negra, elaborada pela Prefeitura do Rio - via Secretaria de Cultura.
O Muhcab fica na Gamboa, sendo um dos 15 pontos da Pequena África. Ainda no Novembro Negro, uma série de atrações está na agenda do museu, entre rodas de conversa e de samba, incluindo um papo com Silvio Almeida (Ministro dos Direitos Humanos) e Anielle Franco (Ministra da Igualdade Racial). A maior parte das atrações é gratuita. A programação está no Instagram @cultura_rio.
O Cais do Valongo foi o principal ponto de desembarque e comércio de africanos escravizados nas Américas. Funcionou entre 1811 e 1831, ano em que foi proibido o tráfico transatlântico. Durante este período, cerca de um milhão de pessoas desembarcaram no Valongo para serem vendidas e transportadas a diversos pontos do país.
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