Por se tratar de crime contra a vida, o órgão defende que o caso seja julgado por júri popularDivulgação
A denúncia foi assinada pelo procurador da República Eduardo Benones, que atua no controle externo da atividade policial no Rio de Janeiro e foi o responsável pelas investigações. A petição detalha o processo de apuração do caso que envolveu depoimentos de familiares da vítima, de testemunhas do fato e dos acusados, além de perícias no veículo, um Peugeot 207 Passion, e nas armas dos agentes. Ao reproduzir o que aconteceu naquela noite, feriado de 7 de setembro, a denúncia descreve que, ao perceber que o carro que dirigia era seguido por uma viatura, o pai de Heloisa, Willian de Souza, resolveu parar o veículo. Ele ligou a seta e dirigiu para acostamento. No entanto, os disparos ocorreram antes mesmo que as rodas travassem, com o carro ainda em movimento.
As armas usadas pelos policiais foram fuzis 5.56 X 45mn, considerados de grosso calibre e longo alcance. Na denúncia, o procurador lembra que essas armas foram projetadas para uso militar, por terem maior velocidade, menor recuo e, consequentemente, por aumentar a letalidade. "Apesar do longo alcance do fuzil utilizado e seu alto poder de fogo, o teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas prova que a distância entre atiradores na viatura policial e vítimas não era mais do que vinte metros no momento dos disparos", afirma, frisando que, mesmo portando pistolas no momento da perseguição, os agentes optaram por usar os fuzis.
Em outro trecho do documento, a denúncia destaca o fato de não ter havido nenhuma abordagem ao motorista do veículo pelos policiais. Testemunhas ouvidas durante a investigação afirmaram que "entre o momento em que passaram pela viatura policial e o momento dos tiros, não houve sequer um esboço de comunicação". Para o MPF, o fato evidencia que os agentes da PRF quiseram a morte dos ocupantes do veículo ou, no mínimo, assumiram o risco de que isso acontecesse. "Na realidade, não é minimante crível que, ao cravejar com tiros de 5.56 um veículo tripulado e com carroceria comum, a poucos metros de distância, houvesse outra intenção senão a de matar", pontua o MPF.
Também chama atenção o fato de não ter havido nenhum disparo contra os pneus do veículo, que nem sequer foram trocados para o deslocamento até o hospital para onde seguiu, conduzido por um dos policiais rodoviários e com o pai de Heloisa, como passageiro. "Em outras palavras, não houve a intenção de deter ou advertir", resume a denúncia.
Coautoria é defendida
A denúncia também rebate o argumento dos policiais de que a perseguição teria sido motivada pela informação de que se tratava de veículo roubado. Conforme o documento, tanto o pai de Heloisa quanto o vendedor do veículo afirmaram desconhecer o registro de roubo, datado de agosto de 2022. Foi comprovado também que Willian Souza pagou valor de mercado pelo carro. Além disso, nos registros do Detran não havia nenhuma restrição em nome do veículo. No entanto, frisa o procurador, "o fato de os ocupantes efetivos do veículo não serem os imaginados criminosos não serve de excludente de criminalidade".
Outro aspecto alegado pelos policiais e contestado na denúncia a partir dos depoimentos coletados refere-se à menção de que a viatura teria sido alvo de disparos. As informações reunidas durante a investigação revelaram que o local estava completamente vazio e que não havia "nada e nem ninguém que pudesse ser fonte de qualquer barulho". Além disso, ficou provado que no interior do carro não havia arma e que a única reação da família foi a tentativa do pai de parar no acostamento. "Ainda que houvesse criminosos condenados no carro, isto não autorizaria que os policiais comutassem a sentença condenatória para pena de morte e ali mesmo se convertessem em Tribunal e executores", reitera trecho da denúncia.
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