Eles não são mais tão jovens assim, mas ainda querem curtir a vida, pensam em focar na carreira e se estabilizar financeiramente para quem sabe depois construir uma família. Além disso, muitos, principalmente os que carregam traumas da infância por algum motivo, ainda ficam sem saber se serão bons pais ou se vão acabar por repetir os erros dos progenitores. Também têm os que não querem muita responsabilidade na juventude e adiam a paternidade. O fato é que assim como grande parte das mulheres, muitos homens estão preferindo ter filhos mais tarde, após os 40 anos e alguns até com mais de 50.
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A paternidade tardia, porém, tem seus impactos na saúde da Geração Y. Homens entre 29 e 44 anos, os chamados millenials, desconhecem que a fertilidade masculina também tem prazo de validade. "A Geração Y chega ao consultório com uma mentalidade de alta performance em todas as áreas da vida, mas muitas vezes negligencia a saúde reprodutiva", afirma o Dr. Alfonso Massaguer, especialista em Reprodução Humana da Clínica Mãe.
O profissional explica que o homem também tem um relógio biológico. "Muitos homens dessa geração, em sua busca por performance, recorrem a anabolizantes e outras substâncias que são um verdadeiro veneno para a fertilidade, agravando um cenário já desafiador pelo adiamento da paternidade", afirma o médico, acrescentando que quem planeja filhos após os 40 deve fazer um check-up completo da saúde reprodutiva, que inclui exames hormonais, ultrassom e o espermograma. Os que pretendem adiar ainda mais também podem optar pelo congelamento de sêmen, uma opção viável e cada vez mais procurada.
Criança é uma luz na vida
O advogado Roberto Seixas, de 44 anos, preferiu esperar para ter filho depois que se equilibrou financeiramente. "Eu tive com 42 e acho que realmente foi um momento bom porque já estava equilibrado economicamente e mais maduro emocionalmente. Também voltei para o Rio onde vive toda a minha família, pois desde os 26 anos que eu morava em outros municípios, pois queria fazer concursos", diz ele, que também adiou a paternidade pensando em dar o melhor para o filho.
"Eu estudava muito para concursos e a rotina de estudo com um filho seria complicada. Depois que eu passei num, me equilibrei financeiramente e junto com a minha companheira decidimos pela chegada de um nenem. É preciso suporte para ter filhos. Acho importante ter filhos mais tarde tanto para o homem quanto para mulher porque ambos estão mais maduros. Além disso, hoje em dia tem muitas tecnologias. Acho super maneiro quem escolhe adotar porque criança é uma luz na vida. Acredito que cada vez mais corriqueiramente haverá a tendência de ter filhos mais tarde, porque a gente está vivendo mais", finaliza Roberto.
Tudo a seu tempo
Se em alguns casos, os homens preferem ter filhos mais tarde, em outros o destino dá uma ajuda. Foi o que aconteceu com o professor de matemática Francisco José Santos Uchoa. Ele até planejava ter filhos mais cedo, e não rolou. Casou-se aos 30 anos, mas sua primeira esposa tinha ovário policístico e não engravidou. O relacionamento também teve fim e ele encontrou outra companheira.
Hoje, Uchoa tem 56 anos, sua esposa 51 e o casal teve dois filhos - um de 15 e outro de 9. "Somos professores e nos conhecemos na mesma escola. Ela tinha problemas para engravidar, mas como o nosso desejo de sermos pais era muito grande, minha esposa fez um tratamento e deu certo. No decorrer da gestação foi barra. Com 26 semanas de gestação, ela rompeu a bolsa e meu filho nasceu de forma prematura com 814 gramas e passou 90 dias na incubadora", diz ele, que lembra dessa época.
"A gente acompanhou esses 3 meses juntos. Todos os dias nós íamos lá. Foi uma força-tarefa muito grande. Nós tínhamos uma baixa expectativa de que ele sobrevivesse, mas graças a Deus tudo transcorreu bem. E hoje meu filho está com 15 anos, um garoto lindo. Então, na realidade, eu sempre quis ser pai. E nunca me atentei quanto a questão da idade. Mas quando ele nasceu eu tinha 41 anos", diz o professor, acrescentando que a idade não os impede de ser paciente com os filhos.
"Eu e minha esposa somos bem pacientes com eles. Não me arrependo em nenhum momento de ter filho após os 40. Tudo tem o seu tempo e a gente hoje vive muito bem. Amo demais a minha família", diz ele que conta como soube que seria pai. "Quando ela engravidou, nós morávamos em casas distintas. Então me convidou para a gente tomar um café juntos e fomos à padaria. E aí ela revelou que estava grávida. Dei um grito na padaria. Foi emocionante. Ela levou o teste de gravidez. Realmente não tinha nenhuma dúvida.Tenho certeza que eu nasci para ser pai. São dois filhos maravilhosos. Cumprimos bem a missão", diz Francisco.
Médicos falam sobre o assunto
Em entrevista ao jornal O DIA, dois profissionais falam sobre paternidade tardia. Sã eles os médicos Alfonso Massaguer e Sérgio Andurte, urologista que atua na Genesis - Centro de Assistência em Reprodução Assistida.
O DIA: A que o senhor atribui à paternidade tardia?
Alfonso Massaguer: A maternidade tardia é uma tendência moderna, assim como a paternidade tardia, então cada vez mais as pessoas estão se dedicando ao trabalho, estão namorando e tendo mais de um parceiro sexual, e claro, tendo vidas muitas vezes de casados, mas sem estarem casados, sem terem aquela intenção naquele momento de ter uma família, então assim como as mulheres estão retardando a sua maternidade, os homens também estão retardando a sua paternidade. Então se a gente avaliar, por exemplo, a minha família, o meu avô teve filho com 23 anos, meu pai teve filho já com 40 e tantos anos, e eu da mesma maneira também tive meus filhos após os 40 anos. Então no passado os homens realmente tinham filhos mais cedo, assim como as mulheres, e essa tendência parece que veio para ficar.
Sérgio Andurte: Vivemos uma mudança de dinâmica na vida, em todos os aspectos. Seja pelo maior tempo destinado à formação profissional e estabilidade no mercado de trabalho, seja por uma maior quantidade de homens em segundos relacionamentos (o número de pessoas que se casam mais de uma vez dobrou entre 2002 e 2022). Estes, dentre outros fatores, contribuem para a decisão mais tardia em constituir a família.
O DIA: Atualmente muitas crianças nascem com alguma síndrome. Existe alguma pesquisa que comprove a relação entre a paternidade tardia e os muitos casos de autismo?
Alfonso Massaguer: Há realmente uma relação entre a idade paterna avançada, principalmente após os quarenta e cinco e cinquenta anos, com um pouco mais de doenças como esquizofrenia. Essa relação com autismo existe, mas não é que o sêmen seja o causador, a gente não pode afirmar isso. Há uma relação, mas vale lembrar que ninguém sabe exatamente a causa do aumento do autismo, há várias teorias, mas ninguém conseguiu provar isso, e também lembrar que o diagnóstico hoje em dia é muito mais comum, no passado também se fazia muito menos diagnóstico de autismo, então é claro que há uma perda um pouco de qualidade desse sêmen com a idade, sim, não é tão intensa essa perda como no caso das mulheres, e assim uma pequena relação de aumento de doenças de algumas pessoas. Influências nessas crianças.
Sérgio Andurte: Sim, temos hoje alguns artigos que avaliaram o impacto da idade paterna avançada em desfechos da prole. Um artigo publicado em 2023 por um grupo grego de pesquisa mostra que, para homens com mais de 45 anos, existe um maior risco de alterações neurocognitivas (como o autismo), além de maior risco de complicações gestacionais, alterações esqueléticas (como a acondroplasia) e baixo rendimento escolar.É importante, porém, destacar que este aumento de risco, apesar de presente, não implica em um risco elevado destes desfechos. Ou seja, o risco continua baixo.
O DIA: A medicina está cada vez mais avançada. Em contrapartida, a cada dia mais casos de transtornos ou síndromes em crianças. Existe alguma forma de evitar essas síndromes?
Alfonso Massaguer: É claro que quando a gente fala em esquizofrenia, por exemplo, a gente está falando de uma doença multifatorial, que também vários outros fatores estão envolvidos, como por exemplo drogas, por exemplo, então atualmente que houve a liberação de marihuana, maconha, em vários países, é uma droga que aumenta casos de esquizofrenia, por exemplo, então você tem muitos fatores envolvidos nisso e também lembrar que um ambiente familiar mais saudável, uma família mais bem estruturada, pode também ajudar essa criança a crescer num ambiente mais saudável.
Do ponto de vista de idade paterna, é claro que o homem pode congelar esse sêmen mais cedo. E é claro também que ele pode formar uma família mais bem estruturada para realmente dar uma condição de melhor criação daquelas crianças, tanto numa prevenção primária, de um ambiente mais saudável, fugir de droga, fazer mais esporte, como também uma prevenção secundária, isso era no sentido de você conseguir nos primeiros sinais de alguma doença já procurar ajuda, um tratamento precoce, tudo isso ajuda.
Da mesma maneira o autismo, se ele for tratado corretamente no início da vida, você vai ter uma condição muito melhor daquela criança, e é claro também que, como a gente mencionou, é uma combinação de vários fatores, aonde a idade paterna é um dos vários fatores que pode aumentar essa chance e que, mesmo assim, ninguém até hoje tem a resposta exata para essas doenças.
Sérgio Andurte: Sem dúvidas. E aqui reside a tarefa mais desafiadora para os pacientes. A fórmula mágica de saúde e longevidade, que está associada a uma melhora na qualidade seminal e consequente menor risco de desfechos negativos na prole, passa pelo básico: dieta equilibrada, atividade física regular e controle de estresse. Nada de protocolos milagrosos, modulação hormonal, clínicas de infusão ou suplementações mirabolantes. O básico bem feito faz a diferença.
O DIA: O senhor acredita que exista uma faixa etária para o homem ser pai ou isso é apenas preconceito, já que muita gente diz: "com essa idade, você vai ser avô e não pai"?
Alfonso Massaguer: Eu acho que há um preconceito sim, esse preconceito não se justifica, cada vez mais as pessoas estão vivendo mais, e é claro que é muito melhor um homem ter um filho em um ambiente familiar estruturado, com mais condição de cuidar dessa criança, de ser um pai presente, então esse preconceito não se justifica. Esse pequeno aumento de doenças que pode existir com o pai com mais idade, é claro que o benefício desse pai estar mais presente, o benefício desse pai estar mais bem estruturado como homem, como pai, para cuidar melhor, educar melhor daquela criança, talvez muito possivelmente esses benefícios superam os supostos malefícios, e como a gente vai falar mais adiante, também algum desses supostos malefícios é um aumento pequeno. E também você pode reduzir isso até congelando o sêmen, por exemplo.
Sérgio Andurte: Quando falamos de família, minha opinião pessoal é que não devem existir definições formais. Família é afeto, amor e propósito. Portanto, não existe uma idade certa para ser pai. Existe a sua idade para isso. Quando nos sentimos prontos e abertos para tal.
O DIA: Assim como é uma tendência o congelamento de óvulos, o senhor acredita que o de sêmen também seja uma melhor 'saída' para o homem que pretende ter filhos mais tarde?
Alfonso Massaguer: Congelar sêmen é uma opção sim para aquele homem que quer ter filho mais tarde, é uma opção, tá? Só ressaltar que quando você congela sêmen, você vai ter que fazer ou uma fertilização em vitro ou uma inseminação artificial. Então também você começa a transformar aquele processo que poderia ser uma gravidez natural em uma gravidez que precisa de um método artificial pra ocorrer. É claro que também, se a mulher também for uma mulher com mais idade, isso é perto dos 40 ou após os 40, então muitas vezes muitos desses métodos já seriam necessários. Então congelar sêmen, devido à grande facilidade, à grande segurança do método, se eu fosse ter filhos a partir de agora, eu que já tenho 49 anos, eu com certeza teria congelado já sêmen.
Sérgio Andurte: Não temos estudos categóricos neste sentido, mas diferentemente da mulher que possui uma quantidade finita de óvulos, o homem recicla sua produção de espermatozóides a cada 60 a 90 dias. Portanto, o papel do congelamento seminal em larga escala perde espaço. Em geral reservamos esta alternativa para homens que vão ser submetidos a tratamentos oncológicos (já que a quimioterapia e radioterapia podem impactar negativamente a produção seminal) ou homens com alterações graves na produção de espermatozóides (nos quais, utilizamos o congelamento como uma forma de garantirmos amostras viáveis quando elas estão presentes).No fim, a melhor saída é sempre um acompanhamento especializado de qualidade, para identificar possíveis alterações e definir a melhor estratégia para preservar a fertilidade.
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