Aline Fernandes com seu filho Pedro Fernandes e sua mãe Natalice Fernandes pelas ruas do bairro do Grajaú na manhã deste sábado (27)Fotos de Marcela Ribeiro

Rio - A tradição de pegar doces na rua no dia de São Cosme e Damião é uma prática que passa de geração para geração e faz parte da memória afetiva de muitos cariocas, que acordam cedo com a esperança de voltar com muitas guloseimas para a casa.

Na manhã deste sábado (27), famílias foram às ruas do bairro de Grajaú, na Zona Norte, que mantém a tradição de reunir muitas crianças para pegar doces na data.

A dona de casa, Rosane Nascimento, mora em Campo Grande, na Zona Oeste, mas vêm todo ano para o Grajaú para pegar doces com os netos Pedro Henrique, de 7 anos, e Maria Júlia, de 6.
Rosane Nascimento com os netos, Pedro Henrique de sete anos e Maria Júlia de seis na manhã deste sábado (27) nas ruas do Grajaú  - Marcela Ribeiro / Agência O Dia
Rosane Nascimento com os netos, Pedro Henrique de sete anos e Maria Júlia de seis na manhã deste sábado (27) nas ruas do Grajaú Marcela Ribeiro / Agência O Dia


"Nós moramos aqui no bairro por 30 anos e a tradição é vir para cá todo ano pegar doces. Eu fazia isso com as minhas filhas quando morávamos aqui e agora faço com meus netos".

Maria de Fátima Crispino, de 71 anos, que estava com seu neto, João Pedro Bayer, de 13 anos, conta que é devota dos santos e a tradição é presente em toda família.
Maria de Fátima Crispino e seu neto João Pedro Bayer de 13 anos na manhã deste sábado (27), no Grajaú pegando doces  - Marcela Ribeiro / Agência O Dia
Maria de Fátima Crispino e seu neto João Pedro Bayer de 13 anos na manhã deste sábado (27), no Grajaú pegando doces Marcela Ribeiro / Agência O Dia


"Essa tradição começou desde que meu filho tinha dois anos. Eu fazia com meus três filhos, sobrinhos e agora faço com meu neto desde que ele nasceu. Eu sou muito devota de São Cosme e Damião, a maioria das graças atendidas foram por conta deles, sempre recorro a eles", relata.
Moradora distribui doces há mais de 50 anos e tem até tatuagem dos santos

A magia da data também é muito presente para quem distribui as guloseimas. Maria de Fátima Castro Rangel, de 70 anos, entrega doces há décadas na porta de sua casa, na rua Mearim.
Maria de Fátima distribuindo doces na manhã deste sábado (27) no Grajaú, na Zona Norte - Marcela Ribeiro / Agência O Dia
Maria de Fátima distribuindo doces na manhã deste sábado (27) no Grajaú, na Zona NorteMarcela Ribeiro / Agência O Dia


"Moro no Grajaú há mais de 50 anos e distribuo doces todos os anos, desde que moro aqui. Essa prática tem a ver com minha fé, tem a ver com essa cultura que infelizmente está desaparecendo, mas que é muito necessária porque criança é a maior força do universo".

A moradora do bairro conta que ver os pequenos felizes com o saquinho de doce é a maior recompensa. "É muito gratificante ver elas agradecendo quando pegam os doces", celebra.

Maria de Fátima é tão devota, que tem uma tatuagem dos santos no antebraço e afirmou que produziu 500 saquinhos para distribuir para as crianças em 2025.
Maria de Fátima têm uma tatuagem em homenagem a São Cosme e Damião - Marcela Ribeiro / Agência O Dia
Maria de Fátima têm uma tatuagem em homenagem a São Cosme e DamiãoMarcela Ribeiro / Agência O Dia
Para a advogada Aline Fernandes, que mora no Grajaú desde que nasceu, o dia de São Cosme e Damião faz parte da sua memória afetiva.

"Quando eu era criança eu pegava com minha mãe e com minha tia e eu adorava, esperava ansiosa pelo o dia, fica na nossa memória afetiva. Eu espero que essa tradição não acabe nunca, é muito legal ver as crianças felizes pegando saquinho".

Aline Fernandes com seu filho Pedro Fernandes e sua mãe Natalice Fernandes pelas ruas do bairro do Grajaú na manhã deste sábado (27) - Marcela Ribeiro / Agência O Dia
Aline Fernandes com seu filho Pedro Fernandes e sua mãe Natalice Fernandes pelas ruas do bairro do Grajaú na manhã deste sábado (27)Marcela Ribeiro / Agência O Dia

Aline estava pegando doces com seu filho Pedro Fernandes e sua mãe Natalice Fernandes pelas ruas do bairro na manhã deste sábado (27). Porém, a família também têm a tradição de distribuir guloseimas. "Eu entrego doces desde que estava grávida do meu filho, esse ano vamos distribuir 50 saquinhos", complementou.
Distribuição de doces ocorre em outras regiões do Rio
Assim como no Grajaú, o bairro do Vidigal, na Zona Sul, também reuniu diversas crianças que formaram filas empolgadas para ganhar saquinhos de guloseimas na manhã deste sábado (27). Moradores da região entregaram os doces para a garotada pelas ruas do bairro.
Distribuição de doces na manhã deste sábado (27) no Vidigal, na Zona Sul - Dan Delmiro/Parceiro/Agência O Dia
Distribuição de doces na manhã deste sábado (27) no Vidigal, na Zona SulDan Delmiro/Parceiro/Agência O Dia
Significado da data

O Dia de São Cosme e São Damião é uma festividade celebrada nacionalmente tanto pela igreja católica, no dia 26 de setembro, quanto pelas religiões de matriz africana, em 27 de setembro. A data é tradicionalmente comemorada pelos cariocas com uma série de festejos pela cidade, com missas, distribuições de doces e pratos típicos como Caruru, comida de origem africana servida comumente na data.

Segundo o padre Walter Peixoto, pároco da Igreja São Cosme e Damião do Andaraí, na Zona Norte, os santos foram médicos que exerciam sua profissão sem cobrar pelo que faziam. "Em tempos onde não se podia exercer a fé cristã, eles deram um testemunho de fidelidade ao Cristo, mesmo com o perigo da morte, por isso, são considerados mártires", explicou.

O pároco também relata que ambas as religiões já chegaram a comemorar a festividade na mesma data. "Antigamente a festa era comemorada no dia 27 de setembro, mas em 1962 houve uma alteração no calendário litúrgico e a igreja católica passou para o dia 26 de setembro e as religiões de matrizes africanas continuaram a comemorar no dia 27".

O pai de santo Vitor Gonçalves, da Casa Espírito Pai Cipriano, em Niterói, na Região Metropolitana, conta que para a Umbanda e o Candomblé, além de Cosme e Damião, também é celebrado a existência de Doum.

"São Cosme e São Damião eram médicos adultos cultuados pela Igreja Católica. Nas religiões afro-brasileiras são cultuados como os ibejis, orixás gêmeos protetores das crianças. São conhecidos pelo cuidado com os doentes e por distribuírem doces às pessoas para levar alegria. Porém, para as religiões de matriz africana, também é celebrado Doum, que era de fato uma criança", disse.
*Reportagem da estagiária Lívia Mendes, sob supervisão de Marcela Ribeiro