Carlos Magno disse que no início da vida nas ruas desconhecia o serviço oferecido pelo Centro PopPaulo Dimas/CCS PMBM

Barra Mansa - Cada pessoa em situação de rua traz uma história e reflete um passado que fez com que ela tenha saído ou sido obrigada a deixar o lar, indo viver em uma realidade de incertezas, em ambientes desprotegidos e expostos a questões como consumo de álcool e drogas. São pessoas encaradas muitas vezes com desprezo e preconceito ou, ainda, como invisíveis, como se fossem criaturas sem nome e sem sentimentos. Alguns podem continuar vivendo dessa forma por muito tempo, enquanto outros conseguem uma saída e deixam as dificuldades da vida nas ruas para trás.
Em Barra Mansa, um exemplo de determinação para mudar esse quadro é o morador Carlos Magno de Lima, hoje com 27 anos. Ele conhece a realidade difícil das drogas desde pequeno, já que sua mãe é dependente química há muitos anos, o que fez com que ele fosse criado pelos avós. “Eu via minha mãe tendo muita briga com meus avós em casa e ficava triste com essa situação”, relatou.
Com o tempo, o comportamento rebelde e o uso de álcool e outras drogas fizeram com que Carlos Magno passasse a causar conflitos dentro de casa.
“Eu morava com meu avô no (bairro) Roberto Silveira, mas nós tínhamos muitas brigas porque eu ficava muito na rua. Quando eu era usuário, eu recebia meu salário na sexta-feira e ele ia embora em um dia. Eu passava o sábado e o domingo com fome. Depois de uma briga em casa, eu quis sair de casa porque não estava mais me sentindo bem lá”, contou.
Carlos disse que no início de sua vida nas ruas não conhecia o serviço oferecido pelo Centro Pop, que integra a Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos (SMASDH) de Barra Mansa. “Um amigo de rua me falou e eu vim conhecer. Depois de uma semana, eles me indicaram o Lar de Jesus, onde eu fiquei três semanas. Daí eu comecei a ficar no local, porque não queria mais viver na rua”.
O morador disse que graças à indicação do Centro Pop conseguiu trabalho em uma obra na cidade, ficando até o serviço ser concluído. “Dali eu consegui uma casa pra ficar. Já tem dois anos desde que saí da rua. Hoje estou trabalhando com serviço de capina, o Centro Pop que me indicou”, disse.
Carlos Magno também voltou a estudar e atualmente está cursando a Educação de Jovens e Adultos (EJA), no Ciep do bairro Bom Pastor.
“Hoje eu me ocupo muito. Acordo cedo para o trabalho, à noite vou para o colégio, janto lá e volto pra casa. Já tem mais de um mês essa rotina Estou terminando o colégio para conseguir um emprego melhor. O Centro Pop me ajudou a abrir a mente, são pessoas acolhedoras. Aprendi que nós precisamos nos ajudar porque sozinhos não somos nada”, comentou.
Sobre a convivência com a mãe, que hoje tem 48 anos, Carlos disse que a chamou para morar com ele. “Ela ainda é usuária. O quarto é pequeno, mas ela pode ficar comigo. Só não quero que ela faça uso de drogas e bebidas. Ela está mudando, mas de vez em quando tem algumas recaídas. Eu sempre dou apoio, porque agora somos só eu e ela. Estou fazendo de tudo pra ter um serviço bem melhor e colocá-la pra morar num lugar melhor”.
Carlos Magno continua visitando o Centro Pop quando está de folga e aproveita para reencontrar profissionais e colegas com quem conviveu durante muito tempo. Ele também pretende fazer os cursos de fotografia e de design, que estão sendo oferecidos no local aos sábados.
“Eu vejo que todo dia você precisa ter força de vontade, acordar e não olhar para o lado. Eu faço minha oração e falo pra mim mesmo: não posso ficar nesse caminho só porque sou novo. Meu objetivo é que meu dia tem que ser melhor que o anterior. Eu sempre quero ocupar todos os minutos do meu dia”, disse.
Atualmente Carlos mora em uma casa alugada no Centro e presta serviços de limpeza no local, conseguindo um desconto na mensalidade. “Eu me motivo todo dia. Estou frequentando uma igreja. Não tenho religião, mas vou aonde me sinto mais perto de Jesus”, afirmou o morador.

Deixando o álcool

Outra pessoa que viveu em situação de rua e recebeu apoio da Assistência Social de Barra Mansa foi João Carlos da Silva Tavares, de 61 anos, morador do bairro Boa Vista. João contou que trabalhava em uma oficina mecânica da cidade e tinha o hábito de beber apenas socialmente, mas, após um divórcio, foi aumentando gradativamente a dose, até perder o controle.
“Meu café da manhã era uma dose de pinga. Eu fiquei morando dois anos de favor no porão da oficina onde eu trabalhava, mas depois o dono precisou do imóvel e tive que ceder. Aí fui dormir em um posto de gasolina perto de onde eu morava e um senhor também me cedeu espaço em uma garagem. A comunidade me ajudava, mas a vida na rua não é fácil”, comentou.
Durante esse período, João Carlos passou a sofrer com um problema sério no fígado, o que fez com que ele fosse acolhido pelo Abrigo Municipal, que na época ficava no bairro Santa Rosa. Enquanto estava no local, o morador recebia frequentemente o atendimento médico necessário.
“Quando eu menos esperava, eu fui para o Abrigo. Fiquei 15 dias no isolamento, não comia direito, tinha suspeita de tuberculose. Isso foi em 2020, na época do covid. Tive que ir com urgência pra cirurgia na Santa Casa, por causa do fígado. Eu disse que queria sair daquela vida, não estava aguentando mais. Fui muito bem cuidado, eles abraçaram minha causa”, disse.
João relatou que durante o período no Abrigo Municipal passou a receber o Benefício de Prestação Continuada (BPC) - do governo federal - o que permitiu juntar um dinheiro para construir uma casa. “Graças a Deus, consegui meu benefício, não voltei mais pra bebida e hoje sinto até pavor de bebida, o cheiro me dá ânsia de vômito”, confessou.
O morador contou também que a equipe da Assistência Social costuma ir até sua casa para continuar o acompanhamento.
“Hoje minha rotina é ir ao médico, bater um papo com os amigos e sair para tomar um refrigerante. Agora quero parar o vício no tabagismo. Antes eu fumava um maço de cigarros por dia, mas agora um maço dá pra três dias. Sou muito grato ao pessoal do Abrigo. Que eu sirva de exemplo. Desejo a todos que estejam passando pelo que vivi que lutem para conseguir sair do vício e dar a volta por cima, como eu dei, graças a Deus. O que eu não quero pra mim eu não quero para os outros”, afirmou João Carlos.

Atendimentos

O Centro Pop realiza atividades diárias para pessoas em situação de rua, tanto em grupo quanto individuais. As ações incluem conversas, higiene pessoal, alimentação e oficinas. “Embora a maioria das ações sejam grupais, existem ações individualizadas, que são os atendimentos psicossociais e os encaminhamentos para que sejam monitorados em outros setores, como de saúde, por exemplo”, informou o gerente de Proteção Social Especial da Secretaria de Assistência Social, Alexandre Martins Monteiro.
O Centro Pop de Barra Mansa está localizado na Rua Oscar da Silva Marins, 252, no Centro (no pátio da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos). O telefone para mais informações é: (24) 3512-5692.
Já o Abrigo Municipal funciona 24 horas por dia, permitindo que as pessoas tenham um local para pernoitar. Ele funciona na Rua São Vicente de Paula, 508, no bairro Siderlândia. O contato é: (24) 99844-0095.
Os trabalhos também são realizados em parceria com o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), dependendo do caso de cada morador. O secretário de Assistência Social e Direitos Humanos de Barra Mansa, Fanuel Fernando, destacou que a importância desse trabalho conjunto está ligada ao fato de se dar oportunidade de uma mudança de vida a essas pessoas. “Atuamos com foco nos direitos, buscando garantir que essas pessoas estejam integradas. Assim, analisando cada caso, propomos um novo modelo de vida, permitindo que as pessoas possam sair das ruas, reencontrar a família e retornar à vida profissional”.
 
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