Wanderley de Souza, diretor da Finep, visita laboratórios todos os dias: equipamentos sem manutenção  - FOTOS: Divulgação
Wanderley de Souza, diretor da Finep, visita laboratórios todos os dias: equipamentos sem manutenção FOTOS: Divulgação
Por O Dia

Rio - O Brasil vem lidando desde 2015 com uma seca de investimentos para a área de Ciência e Tecnologia. Os recursos aplicados hoje são um terço do que eram há poucos anos. As consequências? Fuga de cérebros para o exterior, pesquisadores pós-graduados virando motoristas de Uber para pagar as contas e laboratórios que foram fundamentais para dar rápidas respostas à zika com equipes impotentes diante do avanço da febre amarela.

Quatro anos atrás, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgão ligado ao da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), dispendeu R$ 2,7 milhões para financiar pesquisas de instituições e empresas. Em 2015, os recursos começaram a escassear. E 2017, foi o fundo do poço: foram gastos apenas R$ 920 milhões. O diretor científico-tecnológico do órgão, Wanderley de Souza, vê as consequências da escassez todos os dias. "Começam a faltar equipamentos modernos nos laboratórios. Não foram e não vão ser comprados nos próximos dois anos. Tudo que quebra fica sem manutenção. Com isso, o Brasil vai ficando para trás na competição com outros países". Souza diz que a Lei do Teto (que limita o aumento de gastos dos órgãos do governo à inflação pelo prazo de 20 anos) veio na pior hora possível. "Os recursos da Finep vão ficar limitados por muito tempo a R$ 1 bilhão, o que é totalmente insuficiente para os investimentos necessários na ciência".

Coordenador da Rede Brasileira de Pesquisa em Tuberculose, Afrânio Kritski diz que a falta de recursos está impedindo que os pesquisadores ajudem a fazer o diagnóstico da enfermidade em várias regiões do Estado do Rio. "É a doença infecciosa que mais mata no mundo. São 5 mil pessoas por dia. Mas a população em geral e nossos políticos não percebem que não é um mal do passado. Tuberculose é grave e não respeita fronteiras, nem classes sociais".

Kritiski diz que se tornou comum colocar dinheiro do próprio bolso para conseguir dar prosseguimento às atividade do laboratório. "Acontece com cada vez mais frequência, pois os pesquisadores seniores não podem deixar que projetos chaves sejam suspensos. Se para, é muito difícil retomar depois".

Para Débora Foguel, do Instituto de Bioquímica da UFRJ, a pior consequência da atual penúria da ciência é a "perda da esperança". "São 20 mil estudantes que veem uma situação crítica. Muitos perderam bolsas. Pesquisadores não encontram estabilidade para continuar suas pesquisas e vão para o exterior. São jovens formados em escolas públicas que o país está perdendo".

 

Sem resposta para a febre amarela
Publicidade
A pesquisadora da UERJ Eliete Bouskela conta que entre seus alunos de pós-doutorado, alguns estão optando por prosseguir com os estudos fora do país por não verem perspectiva de serem contratados por universidades brasileiras. "Já os que não têm condição de irem para fora do país acabam apelando para outras profissões. Muitos, por exemplo, estão trocando o laboratório pelo Uber.
A penúria também afeta a resposta brasileira ao avanço de epidemias, como a da febre amarela. "Quando apareceu a zika, os laboratórios estavam equipados e tinham como dar uma resposta rápida. E foi dada. No caso da febre amarela, não tivemos essa capacidade. O país não lançou nenhum programa de financiamento para as pesquisas" conta Pedro Oliveira Lagerblad, pesquisador sobre insetos transmissores de doença (mosquitos, barbeiros e carrapatos) na UFRJ. "Não dá para interromper projetos e anos depois de anos querer voltar atrás. O conhecimento vai junto e é jogado no lixo todo o investimento feito por anos".
Publicidade
Você pode gostar
Comentários