Ex-secretário da Anvisa, José Ricardo Santana, que participou do 'jantar da propina', depõe nesta quinta-feira, 26, na CPI da Covid. Divulgação

Brasília - Na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid nesta quinta-feira, 26, o empresário e ex-secretário da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), José Ricardo Santana, que participou de 'jantar da propina', negou ou afirmava não se lembrar sobre seu relacionamento com a Precisa Medicamentos diante de várias perguntas feitas pelos senadores. Em outro momento, ele preferiu se manter em silêncio sob habeas corpus, concedido pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). 
No início da sessão, o depoente negou ter tido "contrato" com a Precisa Medicamentos para negociar kits ou outros produtos relacionados à covid-19 com o governo do Distrito Federal. Mas, Santana admitiu conhecer Francisco Maximiano e Danilo Trento, respectivamente dono e diretor da Precisa. 
Ao negar qualquer relação com a Precisa, o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), informou que o depoente é suspeito de ter participado de ações para fraudar licitações de compra de testes rápidos para covid-19 pelo Ministério da Saúde. Segundo Renan, Santana teria apresentado um roteiro de procedimento para desclassificar os primeiros colocados, com o objetivo de favorecer a empresa em contrato de mais de R$ 1 bilhão.
O relator também demonstrou, com base em informações obtidas pela CPI, que em junho de 2020 o depoente encontrou-se com Danilo Trento, diretor da Precisa, em um endereço de Brasília. "Também não me lembro desse referido encontro", se limitou a responder Santana.
Ao ser questionado sobre sua viagem à Índia pagas pela Precisa Medicamentos, Santana disse que ficaria em silêncio. Segundo Renan, nas informações iniciais encaminhadas pela Embaixada do Brasil não havia o nome de Santana, mas após insistência da CPI, uma nova lista, desta vez com o nome do depoente, foi encaminhada. Maximiano e outras pessoas ligadas à Precisa viajaram juntas, de acordo com informações apresentadas pelo relator.
Santana também negou que entregou ao presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), algum estudo ou documento, que seria fruto de um trabalho conjunto com Nise Yamaguchi. Momentos antes, foram exibidas na CPI trocas de mensagens nas quais o depoente diz ter passado a noite trabalhando com a médica numa "agenda positiva" a ser entregue ao presidente.
"Eu conheço a doutora Nise, tenho uma relação superficial com ela e nada aprofundada. Eu me lembro de ter encontrado com ela umas duas vezes e uma delas foi para o trabalho realizado em São Paulo. Era uma questão interesse sobre a retomada econômica do Brasil e a testagem. Nunca apresentei planos para o governo. Eu não cheguei a ver o estudo depois do meu encontro com a Dra. Nise", disse o depoente.

Saída da Anvisa
Após sair da Anvisa após pedir exoneração em 23 de março de 2020, Santana foi convidado para fazer parte da equipe do Ministério da Saúde pelo ex-diretor de logística Roberto Ferreira Dias. Senadores apontaram que a informação, confirmada pelo depoente, mostra contradições com o depoimento de Roberto Dias à CPI, que disse se lembrar de Santana apenas da época da Anvisa.
"Eu fui convidado a integrar o Ministério da Saúde por Roberto Ferreira Dias, na época da gestão do ministro Mandetta", disse Santana.

Em resposta a Omar Aziz (PSD-AM), Santana disse ter saído da Anvisa por "vontade própria". Santana admitiu que trabalhou por um período no ministério mesmo sem nomeação e sem salário. Logo, a saída do do depoente da Anvisa causou estranheza nos senadores, já que ele optou por deixar um trabalho remunerado para ficar sem salário em tempos de crise. 
Em seguida, os senadores questionaram quanto o depoente ganhava na Anvisa por querer trocar um trabalho na agência por um cargo incerto. Porém, o empresário afirmou que não se lembra de quanto ganhava quando trabalhava na Anvisa.
"O Brasil precisa de muito brasileiro igual esse cara. Ele deixa de receber um salário para trabalhar no Ministério da Saúde sem receber nada. Ele não lembra quanto ganhava na Anvisa. Ele era lobista no ministério. Ninguém sai de um cargo, para ficar sem salário, em tempos de crise", reflete o presidente da CPI.
Com a saída da Anvisa e ida para o ministério, os senadores reforçaram a tese de que ele era um lobista dentro da pasta. Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apontou que, pelas informações da CPI, Santana conheceu o lobista Marconny Albernaz de Faria, com quem fala em áudio divulgado pela comissão, na casa de Karina Kufa, advogada do presidente Bolsonaro.
Menos de 20 dias depois, ele mandou o primeiro áudio para Marconny. Santana admitiu conhecer Karina e Marconny, mas disse não se recordar das circunstâncias em que foi apresentado a ele e não se lembrar também de quem mais estava na casa da advogada. 

Ele também afirmou que não se recorda se Jair Renan, filho mais novo do presidente Bolsonaro, estava em um jantar na residência da advogada, do qual teria participado também Marconny. Diante desses e de outros esquecimentos, o presidente da CPI ironizou ao dizer que o problema da testemunha é médico pois ele tem problemas sérios de memória.
Na sessão, o depoente negou conhecer vários integrantes do chamado "gabinete paralelo" que aconselharia o presidente Bolsonaro sobre a pandemia: Osmar Terra, Carlos Wizard, Luciano Hang, Paulo Zanotto e Carlos Bolsonaro.
Santana participou do jantar, no dia 25 de fevereiro, no restaurante Vasto, em que o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Dias teria pedido propina em negociação na compra de vacinas da Covaxin. O nome do depoente desta quinta-feira apareceu durante o depoimento de Dias. Além disso, a CPI procura saber qual ligação de Maximiano com Santana.