Jair Bolsonaro acena durante ato na Av. Paulista, no Dia da IndependênciaAFP
A narrativa difundida por canais e influenciadores bolsonaristas é a de que o presidente apenas adotou o que seria uma "estratégia de estadista", moderando suas falas para não prejudicar a economia, mas que isso lhe garantiria, segundo esta versão, supostas vantagens na pressão contra o Supremo.
A tática foi definida ainda na quinta-feira, em meio ao impacto político provocado pela divulgação da nota, quando seguidores do presidente o acusaram de traição. Ontem, o próprio Bolsonaro tentou amenizar as queixas afirmando que não tinha recuado. "Alguns querem que vá lá e degole todo mundo", declarou o presidente em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada. "O que acontece? Cada um fala o que quiser. O cara não lê a nota e reclama. Leia a nota, duas, três vezes. É bem curtinha, são dez pequenos itens. Entende. Se o dólar dispara, influencia o combustível", disse ele.
Bolsonaro também justificou a preocupação com a economia para explicar por que pediu para que caminhoneiros desobstruíssem as estradas. "Você quando quer matar um verme, às vezes mata a vaca Até domingo, se ficar parado, a gente vai sentir, mas se passar disso, complica a economia do Brasil. Ninguém está recuando. Não pode ir para o tudo ou nada."
Dois dias antes, em discurso na Avenida Paulista, Bolsonaro havia chamado o ministro Alexandre de Moraes, do STF, de "canalha" e afirmou que iria desobedecer às decisões do magistrado. As declarações levaram a uma forte reação do presidente da Corte, Luiz Fux, e de partidos de centro, que intensificaram as discussões sobre impeachment.
Bolsonaro, então, divulgou a nota na qual atribuiu as declarações ao "calor do momento" e disse que não teve "nenhuma intenção e agredir quaisquer dos Poderes". No texto, ainda elogiou Moraes. A "bandeira branca", porém, foi vista com ceticismo tanto no Supremo quanto no Congresso.
No mesmo dia, bolsonaristas já sabiam que precisavam agir rápido para tentar frear o desgaste entre os aliados. Ainda na noite de anteontem, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente, foi o primeiro a indicar o tom do discurso. Publicou na sua conta do Instagram uma foto do pai com a legenda "Confiem no capitão". Em seguida, influenciadores bolsonaristas passaram a afirmar que todo o movimento, incluindo o encontro com o ex-presidente Michel Temer, que ajudou a formular a nota, fazia parte de um "plano maior".
Outro filho do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), revelou a preocupação dos aliados. "Muitas pessoas me perguntavam o que falar para a base. Minha sugestão: se não sabe o que falar, fique quieto", escreveu nas suas redes.
A manobra provocou reviravoltas no comportamento dos bolsonaristas mais críticos, que mudaram de tom e passaram a elogiar Bolsonaro. "Ele (Bolsonaro) está fazendo um trabalho que nunca poderia ter feito se não fossem os movimentos dos dias 7, 8, 9 e 10 de setembro. Hoje, o Brasil alcança sua liberdade de expressão. Isso está garantido neste acordo, e além disso a harmonia entre os Poderes será, a partir de hoje, lei. Nenhum poder poderá mais", afirmou o caminhoneiro Marcos Antônio Pereira Gomes, o "Zé Trovão", que é foragido da Justiça, em vídeo no qual anunciou o fim das paralisações nas estradas. Na véspera, ele criticou o pedido de Bolsonaro para cessar os bloqueios e disse que os protestos continuariam.
Militares
Levantamentos feitos nas redes sociais mostram que a "operação abafa" montada pelo governo começou a dar resultado. Segundo monitoramento da ModalMais & AP Exata, as menções positivas a Bolsonaro ontem "recuperaram 2 pontos, devido à narrativa bem-sucedida sobre recuo estratégico de Bolsonaro". "A confiança também acompanhou o crescimento."
De acordo com análise da Bites Consultoria, "o grupo mais organizado se reestruturou e criou uma estratégia de contenção do problema que coloca Bolsonaro no papel de pacificador, não para a opinião pública, e sim para os seus seguidores". Diferentemente do que ocorreu após a saída de Sérgio Moro do governo, quando Bolsonaro perdeu cerca de 55 mil seguidores, desta vez ele ganhou 4,2 mil nos últimos dois dias.
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