Post confunde organizações e fala em pedido de punição, o que não foi feitoArte/Comprova
Onde foi publicado: Twitter.
Conclusão do Comprova: É enganosa a publicação no Twitter que afirma que a Abraji, Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, teria feito um pedido à ONU para que o presidente Jair Bolsonaro fosse punido por ter concedido perdão ao deputado federal Daniel Silveira (PTB), condenado pelo STF por ameaças aos ministros.
Na verdade, a ABI, Associação Brasileira de Imprensa, foi quem enviou às Nações Unidas um relato do ocorrido e pediu que o órgão se posicionasse com uma nota pública e acompanhasse os desdobramentos do caso. Não houve pedido de punição ao presidente.
Enganosos, para o Comprova, são os conteúdos que usam dados imprecisos ou que induzem a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdos que confundem, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. A publicação checada alcançou, até a manhã do dia 27 de abril, 5.999 curtidas e 849 compartilhamentos.
O que diz o autor da publicação: Até a conclusão desta apuração, a autora do post não respondeu aos questionamentos do Comprova via rede social.
Como verificamos: A partir de mecanismos de busca do Google, o Comprova apurou que a ABI divulgou, no dia 25 de abril, notícia sobre o envio de um Informe ao Relator Especial da ONU sobre Independência de Juízes e Advogados, Diego García-Sayán, denunciando o decreto de perdão ao deputado federal Daniel Silveira.
O Comprova também buscou informações com a ABI, que confirmou o envio do material à Organização das Nações Unidas.
Citada no post no Twitter, buscamos a Abraji, que negou ter realizado tal procedimento.
Ressalta-se que a apuração deste fato é realizada pelo Comprova, que é um projeto colaborativo de verificação liderado pela Abraji.
Documento ABI
O documento narra que “milícias digitais” passaram a atuar com disseminação de informações falsas, bem como ataques a autoridades dos poderes Legislativo e Judiciário do país. Também cita os inquéritos de números 4.781 e 4.828 abertos para investigar notícias falsas, ataques ao Supremo e existência de organização criminosa com a finalidade de atentar contra a Democracia e o Estado de Direito.
Na sequência, o Informe menciona que o deputado Daniel Silveira foi investigado e condenado pela prática de coação no curso do processo (três vezes), de incitação “à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis” (uma vez) e de “tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados” (duas vezes).
Verificamos que no documento encaminhado pela ABI, no dia 22 de abril, a entidade procura chamar atenção da ONU para a Lei de Execução Penal no Brasil, mais recente que o Código de Processo Penal, em que descreve que o “indulto individual poderá ser provocado por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho Penitenciário, ou da autoridade administrativa, não prevendo a possibilidade de concessão espontânea pelo Presidente da República”.
No documento, a entidade também solicita uma reunião com o Relator da ONU, com a participação de outras entidades da sociedade civil, e espera que a Comissão se “posicione sobre as violações ocorridas com uma nota pública”.
O Informe não solicita punição ao presidente Jair Bolsonaro.
O arquivo em PDF com a íntegra do conteúdo está disponível no site da entidade.
A Abraji, por meio da secretaria-executiva, informou ao Comprova que não enviou documento algum à ONU e que não há qualquer previsão disso acontecer.
Interpretação jurídica
No dia do anúncio do decreto de Bolsonaro, o professor de direito Bruno Melaragno explicou à Globonews que “a graça é individual, pessoal, e que o chefe de Estado concede a alguém condenado ou que já está cumprindo pena. Não digo que [a concessão da graça] é [algo] inédito, mas é muito raro”.
No site da BBC News, juristas disseram que, tradicionalmente, graças são dadas a casos que já foram transitados em julgado, ou seja, quando todas as possibilidades de recorrer são esgotadas em um processo.
O jurista e desembargador aposentado Walter Maierovitch declarou que o decreto do presidente poderia ser considerado tecnicamente nulo, uma vez que o julgamento de Daniel Silveira ainda está em curso e ainda cabem recursos da decisão do STF.
“Esse ato é, tecnicamente, nulo. O julgamento ainda não acabou, pois ainda cabem recursos. Como é que ele pode extinguir a pena de uma pessoa que, do ponto de vista jurídico, ainda é inocente?”, afirmou o jurista.
Para o jurista Gustavo Badaró, o indulto a Silveira pode ser interpretado como um crime de responsabilidade.
“É um crime de responsabilidade porque ele está interferindo no funcionamento do Judiciário. É uma forma de dizer que, independentemente do que o Judiciário faça em relação a uma determinada pessoa, o Executivo não permitirá que ela seja punida”, explicou.
Já o ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello considerou que o presidente Jair Bolsonaro não cometeu crime de responsabilidade ao perdoar o deputado federal Daniel Silveira. Para o ex-magistrado, Bolsonaro exerce seu papel como Presidente da República, acompanhando a decisão dos eleitores que o colocaram à frente do Palácio do Planalto.
Por que investigamos: O Comprova checa conteúdos suspeitos que viralizaram a respeito das eleições presidenciais, políticas públicas do governo federal e pandemia de covid-19.
Entidades ligadas à imprensa também são alvo de informações suspeitas e isso gera diferentes prejuízos. Conteúdos enganosos ou falsos colocam em dúvida a credibilidade do setor, que tem o objetivo de informar o público de maneira imparcial.
Outras checagens sobre o tema: No dia 25 de abril, diversos órgãos de imprensa, como a Carta Capital, o Estadão e o UOL, noticiaram o fato de a Associação Brasileira de Imprensa ter enviado um documento à ONU relatando o indulto de Bolsonaro e pedindo que o órgão internacional acompanhasse o caso no país.
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