É enganosa postagem que atribui ataque a Bolsonaro à produção da TV GloboArte/Comprova
Onde foi publicado: Twitter e Instagram.
Conclusão do Comprova: Postagens nas redes sociais afirmam, de forma enganosa, que uma filmagem da encenação do atentado a um homem com faixa presidencial foi gravada em estúdio da TV Globo. As imagens são, na verdade, do filme “A Fúria”, de Ruy Guerra. A Globo nega que a gravação tenha sido feita em qualquer dependência da emissora e diz não ter envolvimento direto com o conteúdo.
Sem contexto sobre o conteúdo do filme, os posts foram compartilhados como se fosse um ataque da emissora ao presidente Jair Bolsonaro, considerando a caracterização do ator e uma cena em que o personagem está numa moto, o que seria alusivo às motociatas presidenciais.
Comentários no tuíte sugerem que se trata de um ato de conspiração, ou uma dica de como matar o presidente e também que a cena alimenta o discurso de ódio.
A produção de “A Fúria” ressalta que as imagens foram vazadas sem autorização e que o longa-metragem ainda não foi concluído. Apontado como o último filme de uma trilogia iniciada na década de 1960, a previsão é que seja lançado no fim de 2023, portanto, sem relação com a disputa eleitoral deste ano.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: No Twitter, a postagem alcançou, até 18 de julho de 2022, 1,5 mil curtidas e 389 compartilhamentos. Já no Instagram, o vídeo tem 14,2 mil visualizações.
O que diz o autor da publicação: O Comprova procurou os autores das duas publicações verificadas e entrou em contato por e-mail e telefone disponível em suas redes sociais, mas não houve retorno até a publicação.
Como verificamos: Primeiramente, o Comprova buscou no Google pelas palavras-chaves “Bolsonaro”, “cena”, “atentado”, “Globo” e a consulta retornou reportagens de diversos veículos profissionais sobre o assunto (Gazeta do Povo, G1, Carta Capital, Poder 360, Metrópoles, O Antagonista).
A equipe também fez contato, por telefone, com a assessoria da TV Globo, o Canal Brasil e Rune Tavares, indicado como produtor do filme.
Além disso, por redes sociais, procurou um estúdio de gravações apontado como possível locação do filme e os autores das postagens aqui verificadas, mas não houve retorno para os questionamentos.
Vídeo é parte de filme
A gravação é uma cena do filme “A Fúria”, do diretor Ruy Guerra. Conforme explicado pela produção do longa-metragem, o filme será lançado no fim de 2023 e por isso “não há qualquer relação com o processo eleitoral e, muito menos, forjam fake news simulando um fato real.” Ainda segundo a produção da obra cinematográfica, as imagens foram gravadas e divulgadas sem autorização. Além disso, a produção afirmou que a cena foi retirada de contexto. As gravações do longa tiveram início em 5 de julho e vão até 6 de agosto.
A produção do filme não explicou em qual enredo a cena foi gravada. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo antes de a nota da produção ser divulgada, Guerra disse que não falaria sobre o filme até seu lançamento.
O longa-metragem, conforme reportagem da Revista de Cinema, é o fechamento de uma trilogia que começou em 1964 com o filme “Os Fuzis” e sequenciada, em 1978, com “A Queda”. Na história, Mário, o protagonista da saga, preso no fim dos anos 70, durante a ditadura militar, sai da cadeia para ajustar contas com sua história e com os dois homens que, a seu ver, traíram a ele e ao país: Salatiel, seu sogro, e hoje rico empreiteiro, e Ulisses, seu antigo companheiro de militância, hoje um poderoso político.
O filme é produzido pela Acere Produção Artística e Cultural, de São Paulo, e foi contemplado pelo Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) da Agência Nacional do Cinema (Ancine) com R$ 2 milhões.
Após a divulgação das imagens, o ministro da Justiça, Anderson Torres, pediu que a Polícia Federal (PF) abra um inquérito para investigar a gravação. “Circulam nas redes fotos e vídeos de um suposto atentado contra a vida do presidente Bolsonaro. Produção artística? Estamos estudando o caso para avaliar medidas cabíveis e apurar eventuais responsabilidades. As imagens são chocantes e merecem ser apuradas com cuidado”, disse pelo Twitter. “Determinei encaminhamento do caso à PF para instauração de inquérito policial, e completa apuração dos fatos”, acrescentou.
Gravações não foram feitas nos Estúdios Globo
Em nota, a emissora ainda esclareceu que o filme não é produzido pela Globo. O filme “A Fúria” é apoiado pelo Canal Brasil, do qual o Grupo Globo é sócio. Segundo a emissora, embora tenha participação acionária no Canal Brasil, a Globo não interfere na gestão e nos conteúdos do canal.
Além disso, o Canal Brasil só tem participação de 3,61% nos direitos patrimoniais da obra de ficção. Em nota, disse que não tem gestão sobre o conteúdo feito no filme. “Como é de praxe, o canal não interfere nas obras que apoia, nem tampouco teve conhecimento prévio dessa cena. Ainda não assistimos a nenhum trecho do longa-metragem, que não foi finalizado por seus realizadores.”
Quem é Ruy Guerra
Os autores das postagens
Já o responsável pelo post no Instagram foi Rodrigo Zucco, conhecido como Delegado Zucco, que se apresenta no Twitter como pré-candidato a deputado estadual pelo Rio Grande do Sul. Nas redes, Zucco também faz postagens com apoio a Bolsonaro e ataques a adversários do presidente.
A reportagem entrou em contato com Nathalia e Zucco, mas não houve retorno.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A postagem faz referência a Jair Bolsonaro, pré-candidato à reeleição para a presidência da República, e ataca a Rede Globo, emissora que é alvo frequente de bolsonaristas devido a reportagens críticas ao presidente. O conteúdo enganoso é prejudicial ao processo democrático porque distorce a compreensão da realidade e pode influenciar no momento do eleitor votar. No entanto, as pessoas têm direito de fazer suas escolhas baseadas em fatos, não em boatos.
Outras checagens sobre o tema: A menos de três meses do primeiro turno, as eleições têm sido tema frequente de conteúdos enganosos e falsos. Recentemente, o Comprova demonstrou que post mentia ao tentar associar Lula e Manuela D’Ávila a facada contra Bolsonaro, que deputado exagerou em cinco vezes o lucro das estatais em 2021 e que post distorceu reportagem para dizer que estatuto de PT prevê confisco de bens dos brasileiros.
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