Procurador geral da República, Augusto ArasAgência Senado
Procuradores dizem que PGR tem que 'incomodar sem de contrariar'
Fórum Digital Corrupção em Debate questionou atuação de Augusto Aras
Reunidos nesta terça, 19, no Fórum Digital Corrupção em Debate, promovido pelo Estadão e o Instituto Não Aceito Corrupção, integrantes do Ministério Público Federal e do Estadual debateram a atuação da Procuradoria-Geral da República (PGR) no governo Bolsonaro, chefiada por Augusto Aras. Um dia após novo ataque do chefe do Executivo ao sistema eleitoral, durante encontro com embaixadores, procuradores questionaram o comportamento da PGR, frequentemente acusada de alinhamento com o Planalto.
"O PGR tem que fugir das polarizações, ser técnico, mas não pode transmitir dúvida, se age por interesses pessoais ou se tem medo de contrariar", afirmou Ubiratan Cazetta, procurador regional da República da 1ª Região e presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República. "O procurador-geral tem que ser incômodo, dizendo sim e não. Isso é o que se espera."
Eles participaram do painel "O Ministério Público na investigação da corrupção". Também integraram a mesa o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Ubiratan Cazetta, e a ex-procuradora-geral de Justiça de Goiás, Ivana Navarrete Pena. A jornalista Eliane Cantanhêde, do Estadão, foi a mediadora do debate.
O procurador-geral de Justiça de São Paulo Mário Luiz Sarrubbo e a ex-procuradora-geral de Justiça de Goiás, Ivana Navarrete Pena, também defenderam uma atuação incisiva da PGR no painel.
"A inação também tem seu preço", adverte Ivana Pena. "Talvez eu fale de um modelo mais protagonista, necessário para enfrentamento do quadro grave. Espero que haja ação correspondente às violações, aos retrocessos que estamos assistindo."
A procuradora lembra que a responsabilidade do cargo ocupado por Augusto Aras "é altíssima". Ela ressalta que os deveres inerentes ao chefe do Ministério Público Federal, voltados ao Estado Democrático de Direito, "falam muito mais alto".
Ubiratan Cazetta considera que o cargo "reúne uma série de obrigações" e lembrou que cada ocupante da PGR tem seu estilo próprio. "Precisamos ter uma mensagem clara para a sociedade. A PGR não tem partidarismos, mas não tem medo de agir quando há desvios."
Mário Sarrubbo disse que "as instituições um pouco fora da casinha, com tanta barbaridade, em um contexto de ataques" e ponderou que o PGR "fica no meio do fogo, tentando se posicionar dentro dos parâmetros da instituição Ministério Público".
"A PGR tem função fundamental, deve ser provocada, e precisa efetivamente agir", afirmou o procurador-geral de Justiça de São Paulo. "O que a gente percebe é que a PGR procura ter muita responsabilidade e procura manter a estabilidade do sistema. Mas é muito difícil, em um contexto de polarização".
Segundo Sarrubbo, o procurador-geral Augusto Aras ocupa "posição difícil, procurando ser sereno". "Talvez a gente espere um pouco menos de serenidade nesse momento", reflete. "Mas acho que ele é sereno, equilibrado e confio no trabalho do procurador-geral da República se houver algo que chegue nos limites. Acho que o papel dele deverá ser feito, é o que a gente espera de um procurador-geral da República", seguiu.
No mesmo evento, o procurador-geral de Justiça de São Paulo Mário Luiz Sarrubbo disse que "não acredita que as Forças Armadas afiancem qualquer rompimento do sistema constitucional". O chefe do Ministério Público paulista ressaltou que "o que a gente espera das Forças Armadas é que cada oficial, cada general, ande com a Constituição nas mãos e saiba quais são os limites, independente dos cargos".
A menos de três meses do primeiro turno das eleições gerais e, em meio a imbróglio envolvendo o papel das Forças Armadas no processo eleitoral, Sarrubo mandou um recado direto ao presidente Jair Bolsonaro. "O papel delas (Forças Armadas) é manter o equilíbrio. Estão sob chefia do presidente, mas enquanto o presidente agir de acordo com a Constituição e respeitar os demais poderes. Em algum momento vamos ter que ter um papel mais incisivo das Forças Armadas, de falar: 'opa pera lá, o Brasil vai bem, o Supremo decide, o Legislativo legisla e o senhor toca o Poder Executivo da maneira que bem entender, dentro dos limites legais e constitucionais."
Sarrubbo alertou para a importância da diferença entre instituição e cargos. "O Ministério Público já viveu muito essa questão de cargos junto aos Poderes. A gente não pode confundir os papeis. Uma coisa é a instituição, MP, não podemos nunca esquecer dessa missão de exercer a contento aquilo que se espera, que a Constituição pediu para o MP exercer."
O procurador-geral insistiu sobre a necessidade de o país não esquecer as duas décadas de regime militar (1964-1985). "É importante revisitar. A Espanha quer reabrir os arquivos da ditadura do Franco (general Francisco Franco, 1936 -1975) para que a população saiba o que aconteceu, para que aventura totalitária que existe em vários cantos do mundo não volte. Acho que o Brasil precisa disso. Revisitar, lembrar o que aconteceu nas duas décadas de escuridão para entender quais são os papeis".
Sarrubbo afirmou que a questão não envolve ideologia, mas sim "defesa da Constituição e do exercício do papel de cada instituição". Segundo o procurador, o papel do Ministério Público é "colocar a Constituição embaixo do braço e defendê-la, doa a quem doer".
Ele retomou o raciocínio sobre a missão dos militares. "Que o Exército, a Marinha e a Aeronáutica saibam do seu importante papel. Não de poder moderador, que sabe que não é. Nenhuma linha da lei fala em poder moderador. As Forças Armadas têm um papel fundamental de garantia da ordem e da independência dos Poderes".
Segundo o procurador-geral de Justiça, não é papel das Forças Armadas "ficar dando pitaco ou mesmo fiscalizar" as eleições. "Ouvi a barbaridade, recentemente, de fazer uma apuração paralela. Isso não é possível."
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