O ex-presidente Jair Bolsonaro não foi convincente na explicação sobre as tentativas de recuperar outro kit de joias avaliado em R% 16,5 milhões SERGIO LIMA / AFP

Rio - O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) admitiu, pela primeira vez, nesta quarta-feira, 8, ter incorporado ao acervo pessoal o milionário kit de joias doado pelo governo da Arábia Saudita. O pomposo presente da grife suíça Chopard, composto com anel, relógio (avaliado entre R$ 223 e R$ 383 mil), caneta e acessórios para terno, não foi declarado à Receita Federal e, portanto, entrou de forma ilegal no país. À 'CNN', Bolsonaro negou ter ultrapassado a lei.
"Não teve nenhuma ilegalidade. Segui a lei, como sempre fiz", disse Bolsonaro.
A declaração do ex-presidente faz referência a uma má interpretação do próprio sobre o regulamento do Tribunal de Contas da União (TCU) que autoriza a incorporação de itens pessoais. O regimento de preservação de presentes recebidos de chefes de Estado, regulamentada por um decreto de 2002 assinado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). 
O texto determina que presentes trocados entre autoridades em cerimônias, audiências, visitas ou viagens oficiais sejam declarados de interesse público e passem a integrar o patrimônio cultural brasileiro. Jair Bolsonaro e Michelle Bolsonaro são alvos de um pedido de inquérito do Ministério Público do TCU para apurar entrada de joias ilegais doadas pela Arábia Saudita ao casal.
Afinal, outro pacote com um conjunto de brilhantes (colar, anel, relógio e um par de brincos de diamantes) avaliado em R$ 16,5 milhões, destinado à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro foi retido pela alfândega em outubro de 2021. Bolsonaro, no entanto, colocou as mãos em seu 'presente' no fim de novembro de 2022, após a derrota nas eleições para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
No entendimento do TCU, presentes dados em viagens devem ser incorporados ao Departamento de Documentação Histórica do Gabinete Pessoal da Presidência da República. O texto considera presentes de consumo próprio ou de natureza personalíssima podem ser incluídos no acervo pessoal dos presidentes, como roupas, medalhas... Um modelo do relógio Chopard 'rose gold' pode custar entre 40 e 70 mil euros, entre R$ 223 e R$ 383 mil, aproximadamente.

Joias retidas
Bolsonaro ainda negou ter das joias destinadas à sua esposa, Michelle Bolsonaro, apreendidas pela Receita Federal em 2021. Ele ressaltou que não pediu presentes e reafirmou não ter nada ilegal no caso. No entanto, documentos com o selo da Presidência da República com pedido da liberação das joias avaliadas em R$ 16,5 milhões, desmentem a versão do ex-presidente. 

"Eu não pedi, nem recebi esses outros presentes", disse.

Embora negue ter conhecimento dos presentes, ministros de seu governo atuaram para liberar as joias apreendidas pela Receita Federal no fim do ano passado. Um dos suspeitos de liberar ilegalmente os bens é Júlio César Vieira Gomes, ex-chefe do Fisco, que foi nomeado por Bolsonaro para um cargo em Paris, na França, no seu último dia de mandato. 
Nesta quarta-feira, 8, a 'Globonews' divulgou um vídeo, com data de 28 de dezembro de 2022, no qual o sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva, enviado em voo oficial pelo gabinete de Bolsonaro ao Aeroporto de Guarulhos, tentou dar uma 'carteirada', em vão, para reaver as joias.

Entenda o caso
Segundo uma reportagem de "O Estado de S. Paulo", um primeiro pacote de joias, avaliado em R$ 16,5 milhões, foram entregues pelo governo da Arábia Saudita para Michelle Bolsonaro, que visitou o país árabe em outubro de 2021. Entre os presentes, estavam um anel, colar, relógio e brincos de diamantes.

Entretanto, ao chegar ao país, as peças foram aprendidas na alfândega do Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, na mochila de um assessor de Bento Albuquerque, então ministro de Minas e Energia. Ele ainda tentou usar o cargo para liberar os diamantes, entretanto, não conseguiu reavê-los, já que no Brasil a lei determina que todo bem com valor acima de US$ 1 mil seja declarado.

Diante do fato, o governo Bolsonaro teria tentado quatro vezes recuperar as joias, por meio dos ministérios da Economia, Minas e Energia e Relações Exteriores. O então presidente chegou a enviar ofício à Receita Federal, solicitando que as joias fossem destinadas à Presidência da República.

Na última tentativa, três dias antes de deixar o governo, um funcionário público utilizou um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para se deslocar até Guarulhos. Ele teria se identificado como “Jairo” e argumentado que nenhum objeto do governo anterior poderia ficar para o próximo.