Ministros do Supremo rejeitaram os argumentos apresentados pelas defesas dos acusadosFabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) vem rejeitando nesta terça-feira, 25, os questionamentos processuais apresentados pelas defesas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos outros sete denunciados como integrantes do "núcleo crucial" do plano de golpe.

Os ministros vão decidir se recebem a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e tornam réus Bolsonaro e seus aliados. Para isso, é necessário avaliar se há elementos suficientes para iniciar um processo criminal - o que se chama no jargão jurídico de "justa causa da ação penal".

Antes de votar a admissibilidade das acusações, a Primeira Turma analisa, uma a uma, as objeções preliminares levantadas pelas defesas. Com base em argumentos técnicos sobre supostos "vícios" formais no andamento da investigação, os advogados tentam encerrar prematuramente o inquérito.

Suspeições

Os advogados pediram a suspeição dos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin, o que os impediria de participar da votação. Os pedidos foram rejeitados pelo plenário do STF em uma sessão extraordinária convocada pela presidência da Corte na semana passada. A Primeira Turma confirmou nesta terça a decisão. Os ministros argumentaram que a análise deste ponto está superada na medida em que a controvérsia foi analisada pelo colegiado.

Os ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia aproveitaram para fazer elogios públicos a Alexandre de Moraes. Fux afirmou que o colega não pode ser afastado do processo por "ter atuado com tanta exação e competência".

"O ministro comportou-se exatamente no sentido que é dever de todo juiz em qualquer lugar do mundo: atuar com imparcialidade para a garantia dos direitos das partes", acrescentou Cármen Lúcia.

Competência do STF

As defesas dos denunciados também questionaram a competência do STF para processar e julgar o caso. Os advogados alegam que os acusados não têm mais foro por prerrogativa de função e, por isso, o processo deveria tramitar na primeira instância.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, lembrou que o tribunal reafirmou sua competência para processar e julgar ações relacionadas ao 8 de Janeiro de 2023, independente do foro dos acusados.

"Não é algo novo. Em 1.494 ações, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a sua competência para todos os crimes relacionados ao dia 8 de janeiro de 2023", rebateu Moraes. "O tratamento é igualitário a todos os acusados, a todos os denunciados. Não se justifica nenhum tratamento diferenciado."

Além disso, em julgamento concluído no dia 11 de março, mas que já tinha maioria formada desde setembro de 2024, os ministros do Supremo ampliaram o alcance do foro privilegiado e expandiram a competência da Corte para julgar autoridades e políticos. O tribunal definiu que, quando se tratar de crimes funcionais, o foro deve ser mantido, mesmo após a saída do cargo.

"Os denunciados exerciam cargos que tinham prerrogativa de foro. Mas não há nem necessidade da análise dessa questão de ordem porque nos casos referentes ao dia 8 de Janeiro, em 1.494 ações nós já confirmamos a competência da Turma", acrescentou Moraes.

Julgamento na Primeira Turma

Os denunciados também pediram para ser julgados no plenário do STF e não na Primeira Turma. Desde 2023, segundo o regimento interno do Supremo, ações penais são julgadas nas turmas, para desafogar o plenário e deixá-lo livre para decidir sobre controvérsias constitucionais.

O ministro Luiz Fux foi o único que votou a favor da transferência do julgamento ao plenário do Supremo e ficou vencido. "Essa matéria não é tão pacífica assim. Essa matéria já foi mudada e remudada e voltou-se à tese originária várias vezes". justificou.

"Peço todas as vênias para manter a minha coerência que manifestei na semana passada, eu não posso mudar de opinião de uma semana para outra. E quero deixar bem claro que essa posição de vários colegas vencidos não levou em consideração nem capa de processo nem nome de ninguém. Isso é uma resposta técnica."

Os advogados do ex-presidente Jair Bolsonaro defendem que a competência das turmas não se aplica a presidentes e, por extensão, a ex-presidentes, especialmente após a ampliação do foro para além do fim do mandato.

O ministro Alexandre de Moraes argumentou que essa é uma previsão "excepcional" aplicada exclusivamente a presidentes em exercício porque o eventual recebimento da denúncia contra o chefe do Executivo gera o seu afastamento das funções.

"Essa expressa previsão de que a competência é do plenário para o chefe do Poder Executivo fundamenta-se na existência de um regime jurídico constitucional diferenciado a quem está exercendo a chefia de Estado e de governo", explicou Moraes.

Além disso, as defesas alegaram que o julgamento na Primeira Turma suprimiria o chamado "duplo grau de jurisdição", ou seja, a possibilidade de revisão das decisões pelo colegiado completo

"A ideia do duplo grau de jurisdição é que permita uma revisão de uma decisão monocrática por um órgão colegiado. Nas hipóteses de prerrogativa de foro não se aplica o duplo grau de jurisdição porque o órgão já é colegiado. Isso não é só no Brasil", rebateu Alexandre de Moraes.
'Pesca probatória'
O ministro Alexandre de Moraes afastou o argumento da defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro sobre "pesca probatória", que consiste em uma investigação sem alvo definido na busca de qualquer prova para tentar incriminar alguém. "Não se pode confundir detalhada investigação com pesca probatória. Na verdade, houve desencadeamento de investigação", disse Moraes.

Na terceira preliminar arguida por defensores, há citação de cerceamento defesa e pedidos para dividir as ações em outros processos. Alexandre de Moraes vota para rejeitar o pedido da defesa do ex-ministro do GSI Augusto Heleno, que pretendia fatiar as denúncias, ou seja, desmembrar os processos. "O procurador-geral entendeu por bem, a partir de núcleos, ofereceu cinco denúncias. É importante ressaltar que não houve aqui escolha de quem denunciar. Não impossibilita o contraditório, não impossibilita a ampla defesa", disse Moraes, que também rejeitou argumento de cerceamento de defesa.
Delação de Mauro Cid
O último item das preliminares, que questiona a validade da delação premiada de Mauro Cid, foi levantado pelas defesas de Braga Netto e Jair Bolsonaro. "Houve mais de uma vez a reiteração da voluntariedade do colaborador, e na última das vezes foi na própria tribuna", afirmou Moraes, se referindo a uma passagem da sustentação da defesa de Mauro Cid, na manhã desta terça-feira, quando o advogado Mauro Cezar Bitencourt disse que o tenente-coronel "cumpriu sua missão".

"Não é uma prova, é um meio de obtenção de prova", destacou o ministro, afirmando que Cid participou de oito depoimentos, "devidamente acompanhado de seus advogados". Após os áudios vazados que colocaram em xeque a delação, Cid foi novamente ouvido e os termos foram reafirmados.

Flávio Dino afasta preliminares

Conjunto de considerações apresentados por Moraes, diz Dino, expõem dois extremos que precisam ser "equilibrados" pela Suprema Corte: uma Justiça lenta e uma de Justiça instantânea. O ministro afirma que a fase de instrução processual é que dará oportunidade para as defesas analisarem todos os autos, as provas e construírem suas defesas. "Nesse instante, estamos, sim, analisando fragmentos de realidade, que marcam a proposta do Ministério Público", disse. "Não julgamos pessoas, julgamos fatos e provas", afirmou.

Sobre a preliminar que fala sobre "pesca probatória", argumento da defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro, Dino brincou: "Pesca probatória é quando você lança uma rede na Baía de Guanabara, e aí não sabe exatamente o que vai encontrar. Ou no Lago Paranoá. No Rio Tietê, a gente já sabe o que vai encontrar: nada. Em face da situação ambiental do Rio Tietê".

Fux acompanha Moraes e rejeita últimas preliminares

O ministros Luiz Fux afirmou em seu voto nas últimas preliminares arguidas pelas defesas de denunciados que não há motivo para desmembrar os processos. Ele citou o Código Processo Civil que alerta que magistrado pode limitar litisconsórcio (diversos autores ou réus em uma ação) quando comprometer o andamento do processo, o que não é o caso.

Cármen Lúcia elogia defesas para afastar preliminares

A ministra acompanhou o relator e argumentos dos colegas, elogiou as sustentações orais dos advogados de defesa afirmando que "houve acesso e possibilidade de fazer defesas não apenas adequadas, mais de alta qualidade", utilizando como argumento para afastar a preliminar de que as defesas não tiveram amplo acesso aos autos.

Ainda sobre a questão, a ministra defendeu a inteireza do processo, "disponível e em condições de ser avaliado". "Falo por mim, mas pelos juízes, que ficaram nesses últimos dias a fio olhando os documentos, assistindo o que precisava ser visto e revisto, para chegar aqui hoje", disse.

O voto ainda houve um momento de descontração, em que Dino usou a palavra para elogiar a função de juízes auxiliares, remetendo a uma ação de anos atrás, antes dele ocupar a cadeira na Corte. "Eu não estava aqui, mas lembro. Tinha recém concluído o curso de direito", no que Cármen riu, porque já era ministra da Corte, e disse: "já me chamaram de decana da Turma, não posso nem falar nada".

Zanin vota e preliminares são todas rejeitadas

O ministro Cristiano Zanin votou para rejeitar as últimas preliminares levantadas pelas defesas dos denunciados por tentativa de golpe de Estado. Ele afirmou que os acusados devem, sim, apresentar defesas e o cerceamento não pode ocorrer. No entanto, ele afirma que os advogados tiveram acesso aos autos. Ele ressaltou ainda que o processo está no começo e haverá tempo para os defensores apresentarem argumentos. Sobre pesca probatória, Zanin afirmou não ter identificado nenhum elemento.

Moraes rejeita tudo
O ministro Alexandre de Moraes rejeitou todas as cinco preliminares apresentadas pelos advogados dos denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por suposta tentativa de golpe.

As defesas haviam questionado pontos como a competência da Corte e da Primeira Turma para julgar o caso, o fatiamento da denúncia pela PGR, falta de acesso a provas, o "document dump", ou sobrecarga de documentos que os advogados não seriam capazes de analisar, e a pesca probatória.

Segundo Moraes, foi garantido à defesa o acesso a "absolutamente todos os documentos, mídias e vídeos" juntados aos autos. Além disso, ele declarou que não houve estratégia da PGR em "atolar a defesa com um caminhão de documentos".