Arte Kakay 20 março 2025_ONLINEArte Paulo Márcio

“O presidente da República, qualquer que ele seja, embora possa muito, não pode tudo.”
Ministro Celso de Mello. Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal
Em 19 de abril de 2012, o Congresso Nacional formalizou a criação da CPMI do Cachoeira, como ficou conhecida, com requerimento assinado por 72 senadores e 337 deputados. Eu fui advogado, à época, do governador Marconi Perillo e do senador Demóstenes Torres. A comissão foi oficialmente instalada em 25 de abril e encerrada em 17 de dezembro. Durante todo esse período, estive presente no Congresso Nacional acompanhando depoimentos e participando de sessões. Ao mesmo tempo, fui advogado, no Senado Federal, no processo que cassou o mandato do senador Demóstenes, em 11 de julho de 2012. Sustentei da Tribuna do Senado Federal e avisei aos senadores que anularia todo o processo no Supremo Tribunal Federal. Foi o que acabou ocorrendo com a vitória que obtivemos na Segunda Turma, por unanimidade, da Corte Suprema. Tudo com absoluto respeito aos poderes constituídos.
Durante toda a CPI, sem que eu soubesse, eu era fotografado, inclusive no plenário do Senado, na Tribuna, pelo maior fotojornalista brasileiro, Orlando Brito, falecido em 11 de março de 2022. Quando terminaram os trabalhos, ele me presenteou com mais de 200 fotos. Foi muito emocionante. Hoje, essas imagens me acompanham no meu escritório, nas minhas casas de Brasília, do Rio, de Trancoso e de Paris. É como se o Brito me fizesse companhia o tempo todo. Faço esse depoimento em homenagem ao grande profissional que ele foi e para registrar o momento dramático e estranho pelo qual passamos.
Parece que o país emburreceu. Eu, que já advoguei para 4 Presidentes da República, para mais de 90 governadores e dezenas de ministros e senadores, acompanho, perplexo, o desenrolar do processo contra o ex-presidente Bolsonaro e seu bando.
Às vezes, a impressão que fica é de que ele desistiu da defesa técnica para provocar uma prisão preventiva e tentar tumultuar o processo. Politizá-lo por ter convencimento de que sua condenação será inexorável. A convocação de um ato político, por uma esdrúxula anistia, dividindo o palco com políticos que chamam o ministro do Supremo Tribunal, relator do inquérito, de assassino e ditador, é absolutamente inadmissível. E com críticas injustas e ácidas ao PGR. Em uma manifestação com participação popular pífia, 18 mil pessoas quando se alardeava 1 milhão de manifestantes. Inclusive para quem não é sequer réu pela tentativa de golpe. O que faz o líder Bolsonaro é provocar, instigar e tentar desmoralizar a Suprema Corte e a Procuradoria-Geral da República. Um acinte. Um despautério.
Vários oradores cuidaram de carregar no tom no sentido de desacreditar o inquérito em que Bolsonaro foi acusado. É relevante ressaltar que o julgamento do recebimento da denúncia já está marcado para o próximo dia 25 de março. Como o recebimento e a provável condenação se aproximam, o ex-presidente, insolente e irresponsável, dobra a aposta na saga de desestabilizar a Corte Suprema e o Ministério Público Federal. É um movimento ousado e desesperado: o abandono consciente da defesa técnica e o recrudescimento da estratégia de desprestigiar o STF. Cumpre destacar que o ataque sistemático e de baixo nível à Corte Suprema, ao Tribunal Superior Eleitoral e até aos familiares dos ministros fez parte do plano de desabonar o Poder Judiciário para chegarem ao golpe de Estado. O que reveste esse ato de maior gravidade. Consciente. Calculado.
A opção, neste momento, é, obviamente, pela prisão preventiva. Esticar a corda para criar um fato político. Toda a defesa técnica está sendo garantida, na sua plenitude, como não poderia ser diferente, aos acusados. Mas cada vez fica mais óbvio que a denúncia será recebida no dia 25 de março e os acusados vão se tornar réus de crimes gravíssimos.
É plenamente possível que as condenações a penas que podem beirar os 27 anos sejam sacramentadas até setembro. Depois, prisão. Se hoje fazem protestos desprezíveis nas ruas, após a condenação o ostracismo será a tônica. Só esse desespero justifica tal afronta de um acusado e seus seguidores, dentre eles 4 governadores e vários políticos. É a esperança de criar um fato que vire o jogo fora do devido processo legal. A prisão preventiva, nesse caso, estaria perfeitamente dentro dos limites do processo penal democrático. Infelizmente.
Nos remete a Ernst Toller:
“Os degraus metálicos caem nas noites
Os vigilantes avançam pelos pátios sem descanso.
Oh, cada batida é um tremendo fardo,
Que nos pressiona com garras afiadas.
Este hálito morto arrepia-nos.”
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay