Cantora Blue Ernna Cost / Divulgação

Rio - Nascida e criada em Realengo, na Zona Oeste, a cantora Blue, de 27 anos, tem percorrido as ruas do Rio vendendo brigadeiros para custear os videoclipes do próximo projeto autoral. A artista, que compôs para nomes como Glória Groove e e Lukinhas, utiliza as redes sociais para divulgar a ação, apelidada por ela de "Bluegadeiros", enquanto tenta reunir os recursos necessários para concluir a produção.
"Os brigadeiros sempre me acompanharam durante a minha vida. Na época da escola, vendi para pintar, pela primeira vez, o cabelo — escondido da minha mãe. Vendi brigadeiros na praia para pagar minha passagem e ir morar em São Paulo, gravar minhas primeiras músicas e correr atrás da minha carreira por lá. Vendi brigadeiros em São Paulo também. Já vendi brigadeiro para comprar um celular novo, quando fui assaltada na rua. Então, quando iniciei o desafio de gravar meu audiovisual, pensei: 'Por que não ir para rua com os brigadeiros de novo?'", explica.
Com passagens anteriores pela cena independente, Blue lançou em 2019 o EP "Amor e Caos", com cinco faixas autorais que combinam elementos de indie, pop alternativo, R&B e música eletrônica. O trabalho trouxe canções como "Te Odeio Sóbria" e "Muda Nada". No ano seguinte, em 2020, apresentou o single "Noites", em parceria com Anchietx, atual integrante do grupo Os Garotin.
A nova fase da cantora chega com mais maturidade e estilo. As músicas já estão gravadas, prontas para ganhar identidade visual. Falta, no entanto, o recurso para a etapa final. "Íamos gravar esta semana, estava quase tudo certo, mas infelizmente a verba que temos ainda não é suficiente, então eu preferi segurar um pouco e vender mais 'Bluegadeiros' para conseguir fazer tudo do jeitinho que eu tenho imaginado e conseguir entregar um material do jeito que tenho sonhado nos últimos meses com todos os parceiros que decidiram entrar nessa comigo".
Esse trabalho propõe um olhar mais introspectivo em relação ao anterior. "Tive que entrar em um processo interno bem intenso. Então, as pessoas podem esperar um trabalho muito sincero e sem medo da vulnerabilidade, sabe? Ele é sobre enfrentar medos e dilemas e, no final, abraçar as próprias questões."
Segundo ela, os temas giram em torno da autoanálise, das falhas humanas e da tentativa de encontrar sentido mesmo no caos emocional. "Reflete bastante também sobre relacionamentos e sobre aceitar que a gente não acerta sempre. Sobre mudanças, eu vejo muitas, sim — tanto na letra, por ser mais sincera, quanto na sonoridade, onde meu produtor Saudade, e eu, apelidamos carinhosamente de pop sujo que no final, é totalmente eu… só que quatro anos depois."
Entre as canções do novo EP, uma já se destaca internamente. "'Não ando muito bem' é a faixa que deu início a esse trabalho e, coincidência ou não, foi a primeira música que nasceu da minha parceria com meus produtores: o Saudade e o Bernardo Massot. Eu chamo essa faixa, internamente, de 'música do metrô', porque, quando eu trabalhava como vendedora em loja, recepcionista de restaurante ou em qualquer outra coisa que me afastasse da música, voltando para casa, eu queria ter algo para ouvir que me abraçasse, que me fizesse sustentar tudo o que eu precisava viver."
A origem na Zona Oeste também aparece em suas referências. "Desde criança, escuto todos os tipos de música: meu pai ouvia sertanejo, minha mãe, gospel, os vizinhos escutavam pagode, a galera da rua ouvia muito funk… então, eu cresci absorvendo de tudo. Fora que a energia do subúrbio é única, além de trazer um olhar diferente para as situações do cotidiano. Me considero abençoada por ter vindo de lá — e deveríamos, sim, ter mais acesso à cultura na Zona Oeste".
Além da carreira solo, Blue atua como compositora e já colaborou com nomes como Glória Groove, Jade Baraldo, May & Karen e Lukinhas. "Compor é algo muito natural para mim, é a minha forma favorita de expressão. Então, conseguir ser artista e também compor e contribuir com a arte de outros artistas é um privilégio enorme. Uma pequena confissão: às vezes, eu abro nas plataformas as músicas que escrevi só para ver meu nome lá", conta, aos risos. 
Para ela, ser artista independente no Brasil é um ato de resistência e paixão. "É um grande desafio, uma grande aposta, porque, para fazer qualquer coisa, você precisa investir. Se você vai a algum evento, para compor para alguém, para gravar e trabalhar suas próprias músicas… é preciso abrir mão de muitas coisas também, então, é cada dia um desafio. Mas o sonho acaba sendo maior que eles".
Sonhos e futuro
Quando pensa no futuro, ela deixa a ambição tomar espaço — sem perder o pé no chão. "Com esse projeto, eu sonho em conseguir viver ele, sabe? Que ele chegue, de fato, nas pessoas, que elas se conectem com ele, que eu consiga fazer muitos shows — daquele jeito sonhado, com uma banda toda no palco e a galera cantando junto", diz ela, que planeja fazer shows fora do Rio.
Ela, no entanto, pondera ao falar sobre uma carreira no exterior. "Para fora do Brasil eu ainda não penso, mas me interesso muito pelo espanhol. Tenho movimentado algumas conexões com compositores argentinos… então, quem sabe?". A cantora afirma ainda que busca parcerias para ampliar o alcance de seus próximos lançamentos. "Para potencializar esse projeto e, claro, os próximos, porque ainda tem muita coisa para acontecer. Além do EP, já tenho músicas que serão lançadas depois dele, então uma parceria seria perfeita".