Leticia VieiraBruna Sussekind / Divulgação
Foi esquisito me ver na televisão nesse primeiro momento. Por outro lado, também senti um empoderamento muito grande ao me ver no horário nobre, fazendo um remake de uma novela que muitos dizem que é a novela das novelas, porque eu olho a minha trajetória e eu penso, olha onde eu estou, olha onde eu cheguei, vindo de onde eu vim, nascendo na família que eu nasci. É uma conquista, eu estou representando muitas pessoas. Eu carrego uma responsabilidade de representar essas meninas periféricas que tem o sonho de se tornarem artistas, de terem uma carreira, e eu acho que eu estou conseguindo inspirar essas meninas.
- Como foi sua preparação para dar vida à Gilda? Vi que você também já foi ambulante. O que você vendia e como foi essa fase da sua vida?
Pude contar com um time de grandes preparadoras, Cris Moura, Márcia Rubim e Bella Sechin. Além disso, mergulhei fundo no meu passado, na minha própria história. Na época que fui ambulante eu vendia sacolé. Foi uma fase difícil, trabalhosa, mas necessária para minha trajetória enquanto pessoa e artista.
- A Gilda ganhou uma segunda chance da Raquel (Taís Araujo) na novela. Nessas suas vivências da época de ambulante, chegou a conhecer alguma história que se assemelhe com a de sua personagem?
A minha, eu tive muitas 'Raqueis' no meu caminho. Deus sempre foi colocando pessoas dispostas a me dar uma oportunidade.
- Além de ser ambulante, você chegou a trabalhar em outras coisas?
Trabalhei como caixa numa loja de roupa, fui ambulante, vendedora numa loja de acessórios, tive um brechó online, fui estagiária numa clínica médica, analista numa grande marca de moda, modelo e agora atriz.
- Você nasceu em Belford Roxo e já morou na Rocinha. Saiu da comunidade há muito tempo? Ainda frequenta a Rocinha, tem muitos amigos por lá?
Saí da Rocinha no início deste ano. Frequento, claro. A Rocinha me acolheu por alguns anos como uma segunda mãe.
- Há outros pontos em comum entre você e a Gilda, Letícia?
Assim como a Gilda eu também sou pau para toda obra. Me identifico muito com ela porque ela está sempre pronta para qualquer coisa. Ainda mais quando se trata de ajudar as pessoas que amo.
- Como é o retorno das pessoas em relação à personagem? Você acompanha o que as pessoas falam sobre a Gilda nas redes sociais? Tem sido muito parada nas ruas?
Eu realmente tenho me surpreendido muito positivamente com o retorno do público. Percebo o quanto as pessoas estão gostando da Gilda. Me sinto muito prestigiada. As pessoas me param na rua para elogiar a personagem, para descrever a cena que se emocionaram. Às vezes pedem até foto comigo. É um momento novo, e eu estou curtindo. É bom sentir que você é bem quisto pelo público.
- Você chegou a assistir à primeira versão de 'Vale Tudo'?
Mesmo fazendo um remake, acredito que estamos fazendo uma outra novela. São novos tempos, um novo Brasil, com outros dilemas. Escolhi não assistir à primeira versão para criar a minha própria Gilda. Confiando, claro, na direção e na nossa grande autora.
- Como é contracenar com grandes nomes da teledramaturgia, como a Taís Araújo e o Matheus Nachtergaele, Letícia? Eles te dão muitos conselhos?
Às vezes estou entre os dois e cogito me beliscar. Eu quase não acredito que estou fazendo um trabalho desse tamanho ao lado deles. Taís e Matheus são grandes parceiros de cena e fora de cena. Sempre me dão conselhos e alguns toques. A gente se diverte muito junto. Tem sido uma honra contracenar com esses dois.
- Você imaginava seguir a carreira artística ou foi algo que aconteceu de maneira natural?
Nem sonhava! Estava escrito em algum lugar que eu seria atriz. E cá estou eu, aprendendo, errando, acertando e me apaixonando muito pelo ofício.
- Você perdeu seu pai há pouco tempo e ele não pode ver sua estreia na telinha. Como foi viver essa dualidade de sentimentos, Letícia? Imagino que você tenha ficado destruída por um lado e feliz por sua conquista profissional do outro.
Ninguém está pronto para perder sua maior referência. Meu pai esteve ao meu lado desde a primeira vez que abri meus olhos. Tudo que eu sei, foi o vendo. Inclusive, quando me tornei artista, também realizei um grande sonho que era dele. Meu pai era músico, escrevia histórias, criava brinquedos com pedaços de madeira que seriam descartados. Ele era quem eu sempre quis me tornar. Eu o perdi de vista, mas ele mora em mim. Ele está em tudo que eu faço. Experimentei o fundo do poço quando perdi ele e o auge quando apareci em rede nacional. Precisei procurar meu equilíbrio, me apoiar na minha família, no meu companheiro. Essa ferida nunca vai sarar. Estou aprendendo a conviver com ela e reconhecendo ele nas coisas que realizo.
- Hoje, você é exemplo para muitas meninas de origem simples que desejam ser atriz. É significativo para você ser esse espelho para elas?
O meu maior propósito é fazer com que essas meninas se sintam mais dignas de ser o que elas podem ser! Quando você mora na favela, quando você às vezes não tem o que comer, não tem uma roupa legal para vestir, você trabalha para garantir o básico. E na maioria das vezes, trabalha em condições muito precárias e até abusivas. Eu quero dizer para essas meninas que o lugar delas também é na televisão, na moda, nos grandes cargos públicos, é onde elas quiserem! Não existe barreira para os nossos sonhos. Nossas vivências são preciosas e nos coroam como merecedoras de tudo que desejamos ter e ser.
- Você protagoniza a série 'Vermelho Sangue', prevista para estrear no Globoplay neste ano. O que pode contar deste trabalho pra gente? É seu primeiro trabalho como atriz, certo?
Esse trabalho exigiu muita coragem da minha parte. Estrear como atriz, sendo protagonista de uma série de fantasia me fez tremer as pernas algumas vezes. Mas foi sem dúvida uma experiência única. Avassaladora, eu diria. Acho que o público vai se surpreender muito com a qualidade dos efeitos especiais da série. É uma série que conta a história da Luna, que é a personagem que eu interpreto, Luna é uma menina que se transforma em Lobo-guará na lua cheia, seu pai e o seu irmão fogem de casa quando ela ainda é uma bebê, então ela cresce ao lado de sua mãe Carol com muitas questões não respondidas. Em busca de uma cura ela e a mãe se mudam. Chegando nessa nova cidade Luna conhece Flora (interpretada por Alanis Guilhen), uma humana com uma personalidade bem atraente. E eu não posso contar mais nada. Vocês vão ter que assistir e se encantar, como eu.
- Já vislumbra outros projetos no audiovisual, Letícia? Tem alguma personagem que você gostaria de interpretar?
Meu desejo é trabalhar, aprender, contar e recontar novas histórias. Me apaixonei por fantasia. Seria incrível fazer uma vilã.