Rio - A atenção dos servidores do estado que estão com os salários de maio (126 mil) e de junho (200 mil) atrasados estará voltada hoje para o auditório da Secretaria Estadual de Fazenda, na Avenida Presidente Vargas 670, 20º andar. Lá, a partir das 13h ocorrerá o leilão da folha de pagamento do funcionalismo ativo, aposentados e pensionistas do Poder Executivo, da prestação de serviços bancários, arrecadação de tributos e pagamentos de fornecedores, que atualmente é de responsabilidade do Bradesco. O preço mínimo estipulado para arrematar a folha, segundo a Fazenda, é de cerca de R$ 1,4 bilhão. Os recursos serão usados para quitar os meses atrasados.
A pasta confirmou que o leilão será presencial e a maior oferta será a vencedora, como consta no edital que rege a operação de venda. Há expectativa de disputa e que o valor arrecadado seja maior do que o lance mínimo estipulado, o que poderá ajudar a pagar julho também.
Questionada pela coluna sobre quais bancos teriam demonstrado interesse em adquirir a folha, a Fazenda não informou quem deve participar. No entanto, a Agência Reuters informou que cinco instituições financeiras entrariam na briga: Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Bradesco, Itaú/Unibanco e Santander.
O economista Gilberto Braga, professor do Ibmec e da Fundação D. Cabral, ressaltou, no entanto, que a disputa deve ser entre o atual administrador das contas do estado (Bradesco), o Itaú/Unibanco e o Santander. “Mas eu acredito que o Bradesco deve manter a folha do estado”, diz.
A estimativa é que concluída a venda da folha, os recursos pagos pelo banco que vencer o pregão entrem nos cofres do estado até o dia 16 deste mês. O governo do Rio acredita que os vencimentos atrasados de maio e de junho poderão ser quitados já a partir da segunda quinzena de agosto. O banco vencedor do leilão vai prestar o serviço para o estado a partir de janeiro de 2018 por um período de 60 meses (cinco anos).
Vários representantes do governo do estado, entre eles o secretário da Casa Civil, Christino Áureo, têm repetido sistematicamente que os recursos oriundos do pregão serão destinados para quitar os débitos com funcionários e fornecedores. Os R$ 1,4 bilhão representam mais da metade de todo o passivo que o Rio tem até agora com os funcionários, calculado em cerca de R$2,2 bilhões, incluindo nessa conta o décimo terceiro do ano passado. O abono de Natal de 2016 será quitado apenas com chegada do empréstimo de R$ 3,5 bilhões, envolvendo as ações da Cedae. Este processo é previsto para acontecer no mês de setembro.
Requisitos para o RRF
Na segunda-feira, o Ministério da Fazenda editou a Portaria 377, que regulamenta a forma de verificar requisitos de habilitação ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). A portaria estabelece, entre outros pontos, que a verificação do cumprimento do requisito relacionado à folha de servidores será feita a partir do somatório das despesas liquidadas com pessoal, juros e amortizações. Para obter o socorro, os estados devem privatizar empresas e cortar gastos. O governo fluminense formalizou o pedido de adesão e aguarda a aprovação. Com o cancelamento de despesas como dívidas, o Rio economizará, no mínimo, R$ 33,6 bilhões.
Venda será bom negócio para banco, estado e até servidor
Mesmo o Estado do Rio passando por uma crise financeira sem precedentes na história, especialistas avaliam que a venda da folha do funcionalismo do Poder Executivo é um bom negócio, principalmente, para os bancos interessados em adquirir o pacote.
Segundo Gilberto Braga, a instituição financeira que vencer o pregão terá nas mãos mais de 450 mil servidores que necessitam frequentemente de empréstimos e estão no cheque especial devido aos atrasos de salários. Também vai administrar a circulação de dinheiro dos fornecedores e de pagamento de impostos e tributos estaduais.
“Para os bancos será um bom negócio. Haverá movimentação de todos os recursos do estado, como arrecadação, pagamento de fornecedores e a folha do funcionalismo público. Quem está em dificuldade financeira, sempre procura um banco, afirma Braga, referindo-se aos servidores estaduais com dois meses de salários atrasados.
Do ponto de vista do governo do Rio, a venda também será positiva pelo fato de que o estado será bem remunerado pela venda da folha dos serviços. Assim, avalia, o governo vai poder acertar os atrasados e dar uma respirada para tentar colocar a casa em ordem e diminuir a pressão que sofre por parte do funcionalismo. Gilberto Braga até vê vantagens no leilão para os servidores.
“Se por acaso o atual banco perder a folha, ele pode manter pelo menos os clientes e então pode oferecer descontos em tarifas, reduzir taxas de juros entre outras medidas para segurar o cliente. E a instituição que entrar, numa eventual troca de banco vai querer atrair o servidor para ser seu cliente e também poderá oferecer vantagens”, explica o economista.
Há um receio no governo do Rio, no entanto: de o leilão ser contestado ou que o valor seja bloqueado devido a inúmeras dívidas com fornecedores e prestadores de serviço.
Polícia reprime ato com violência
Além de enfrentar atrasos de salários, servidores ativos e aposentados mais uma vez tiveram que encarar a violência da Polícia Militar, durante protesto para receber os vencimentos de maio e junho, além do 13º. Cerca de 500 manifestantes ocuparam a Rua Pinheiro Guimarães, em frente ao Palácio Guanabara, em um ato pacífico.
Os servidores ficaram revoltados por não terem sido recebidos por nenhuma autoridade e tentaram transpor as grades de proteção. Foi quando os PMs começaram a atirar balas de borracha e bombas de efeito moral contra os manifestantes. Ramon Carrera, representante do Muspe, lamentou a situação. “Nem o governador, nem ninguém do primeiro escalão nos recebeu, o que prova que o estado está à deriva”.
A professora Cecília Guimarães, 57 anos, participou da manifestação e se algemou às grades que cercam a sede do governo. Ela diz que está passando a maior humilhação de sua vida com os salários atrasados. “Sou servidora pública, trabalhadora e me sinto humilhada, numa situação extremamente degradante”, afirmou.