Rio - Em 2016, uma crise sem precedentes na história do Estado do Rio de Janeiro estourou e impactou, consequentemente, diversos municípios fluminenses. E a recessão no país deu ainda mais combustível para problemas fiscais nas prefeituras que, em muitos casos, dependem de repasses da União e do governo estadual. Um reflexo disso está no resultado de estudo da Firjan: de 51 cidades avaliadas, 11 ultrapassaram o teto de gastos com pessoal — que é de 60% sobre a Receita Corrente Líquida (RCL) —, e mais duas ficaram acima do limite prudencial, de 57% da RCL (confira no gráfico).
O levantamento feito para o Índice Firjan de Gestão Fiscal (IFGF) tem como base dados declarados pelas prefeituras à Secretaria do Tesouro Nacional e mostra que, em 10 anos (entre 2006 e 2016), as despesas com pessoal desses 13 municípios aumentaram, em média, 88,7%, descontada a inflação (IPCA).
Segundo o coordenador de Estudos Econômicos do Sistema Firjan, Jonathas Goulart, esta elevação foi quase três vezes superior ao crescimento médio das receitas (31,2%) e cerca de oito vezes maior que a variação média da população, registrada em 11,2%.
No topo da lista está Cachoeiras de Macacu: os gastos com a folha salarial alcançaram 69,8% da RCL no ano passado. Em segundo, vem Engenheiro Paulo de Frontin (68,7%), seguido de Belford Roxo, na Baixada, cujas despesas com pessoal ultrapassaram 68,2% da receita.
Jonathas Goulart ressalta que, em cenário de queda de arrecadação, municípios que já estão com gastos comprometidos “fatalmente vão ultrapassar o limite”.
Gestão é a 'ordem'
O economista diz que, para frear o problema, o único meio é investir em gestão financeira, para que o município não seja tão impactado em casos de queda de receita e de redução dos repasses da União e do estado.
“Se a prefeitura está em um limite próximo e seu planejamento financeiro não é eficiente, acaba sendo surpreendida por uma redução de repasses. E com a atividade econômica em queda é normal que as receitas tributárias também caiam”, disse ele, acrescentando que os altos gastos com a folha salarial “engessam o orçamento”.
Na avaliação do especialista, há como não estourar limites da lei mesmo sem receita própria expressiva. “Boa administração pública não necessariamente tem relação com capacidade de arrecadação própria. É preciso fazer planejamento e ter orçamento pouco engessado com pessoal. O setor público precisa ter tamanho suficiente para oferecer serviços de qualidade para a sociedade”, afirma.
Economista-chefe do Sistema Firjan, Guilherme Mercês destaca que é preciso “cumprir a lei”. Agora, para os municípios se adequarem à LRF, terão que frear despesas e aumentar receitas. A própria legislação prevê ações, começando, por exemplo, por corte de comissionados. Goulart aponta ainda a não concessão de aumento real (acima da inflação) e suspensão de novas contratações.
Vereador sem salário e fusão como soluções
Especialista em economia fluminense e professor da UFRJ, Mauro Osório destacou que os municípios foram muito afetados pela queda de receita, principalmente de repasses do estado. Ele deu sugestões para redução de gastos.
“A maior parte desses municípios é pequena. E é importante discutir se cidades com menos de 100 mil habitantes deveriam ter Câmara Municipal remunerada (ou seja, vereadores não teriam salários). É preciso buscar uma estrutura pública simplificada, talvez não se trabalhando todo dia”, disse.
Osório questionou a existência de tantos municípios, sugerindo fusões. Outra sugestão foi o trabalho com consórcios intermunicipais na área de Saúde: dois municípios adotariam políticas nessa área de forma consorciada.
O especialista fez ressalvas à cidade de Macaé, que cresceu devido à atividade no setor de petróleo, mas que também sentiu a queda dos royalties.
A prefeitura, inclusive, respondeu à coluna que, mesmo adotando ações (corte de secretarias e de cerca de dois mil cargos comissionados), a redução da atividade do petróleo não permitiu que os índices fossem alcançados. Já a Prefeitura de Itaboraí não comentou os dados.
Administrações municipais atribuem resultado à queda de receitas
A coluna procurou as 13 prefeituras que compõem a lista para saber quais ações estão sendo tomadas. A assessoria de Cachoeiras de Macacu não respondeu. A Prefeitura de Engenheiro Paulo de Frontin, sob nova gestão, informou que está “enxugando a folha” e que acabou com gratificações. Afirmou ainda que diminuiu secretarias (sem dar detalhes).
O Município de Belford Roxo informou que arca com o ônus deixado pela administração passada e que trabalha para cumprir as obrigações. Apontou a diminuição de cargos comissionados como uma das ações. A Prefeitura de Areal não respondeu. A assessoria de Varre-Sai não retornou à coluna.
Já Duque de Caxias afirmou que o índice apresentado pela Firjan (62,8%) diverge do que está disponível em Relatório de Gestão Fiscal (que é de 58,26%) da prefeitura e encaminhado ao Tribunal de Contas do Estado e à Secretaria do Tesouro Nacional. A prefeitura ressaltou que o resultado elaborado por sua equipe (58,26%) deve-se ao crescimento sistematizado de despesas com pessoal entre 2006 e 2016, e que, em contrapartida, as receitas seguiram em queda.
A assessoria de Caxias apontou ainda ações para aumento de receita: resgate e a cobrança de tributos fiscais (ISS e IPTU) incluídas na dívida ativa do município; revisão e atualização dos valores de IPTU; recadastramento de servidores ativos, entre outras.
A Prefeitura de Santa Maria Madalena reafirmou a dependência que tem de repasses do estado, e que sofreram queda. Disse que reduziu secretarias e se absteve de “efetuar nomeações para cargos de confiança e funções gratificadas”. E que em uma estrutura organizacional que prevê 243 comissionados (sendo 170 funções gratificadas a servidores de carreira e 73 cargos em comissão a não servidores) houve 22 nomeações, das quais 19 foram destinadas à diretores de escola. Declarou ainda que implementará
Programa de Demissão Voluntária (PDV), entre outras diversas medidas mencionadas.
Macuco respondeu que adotou medidas — e continua — “como redução do quadro funcional e suspensão de vantagens pecuniárias, até que esteja adequado ao diploma legal”.
Cantagalo frisou que o município foi afetado pela queda brusca de receita. Disse que foram feitos ajustes entre 2013 e 2017, e que, diante disso, espera fechar o exercício dentro do limite prudencial da LRF. Italva ultrapassou o limite prudencial (57,9%), assim como Rio das Flores (57,9%). Italva não respondeu e Rio das Flores declarou que houve irresponsabilidade da gestão anterior. Afirmou que o atual governo não fez “recontratações temporárias excessivas e diminuiu a nomeação de cargos comissionados”, entre outras ações.
?Colaborou a estagiária Marina Cardoso