Brasília - A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira, 10, o texto-base da Medida Provisória (MP) 1045/21 que trata sobre a redução da jornada de trabalho e salário e suspensão de contrato. Mas, desta vez, os parlamentares vão discutir também propostas de mudança no texto. Entre elas estão contratação de jovens sem vínculo trabalhista, com uma a retirada de direitos celetistas, mas com um bônus de até R$ 275 no salário. Além disso, a medida reduz o valor da hora extra para diversas categorias com horário reduzido e dificulta a fiscalização contra o trabalho escravo.
De acordo com Karolen Gualda Beber, advogada especialista em direito do trabalho, a nova proposta na Casa traz mudanças significativas no texto. "A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira o texto-base da MP que institui uma nova rodada do programa de redução de jornada de trabalho e salário e suspensão de contrato. A diferença é que agora entraram pontos nessa proposta, mas que ainda não foram analisados. Pode ocorrer quando e se houver a aprovação desses destaques, que foram incluídos na medida provisória", explica ela.
Para Renato Sabino, doutor em direito do trabalho pela Universidade de São Paulo (USP) e juiz do trabalho em São Paulo, os deputados estão inserindo importantes modificações na lei trabalhista sem nenhum debate com a sociedade. "As propostas criam uma modalidade de trabalho sem o reconhecimento de vínculo de emprego, sem salário e sem direitos trabalhistas e reduzem direitos trabalhistas de alguns empregados, como o FGTS", explica ele.
No texto, o deputado Christino Áureo (PP-RJ) incluiu o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore) e também o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip). As pessoas contratadas irão receber até R$ 550 por mês para uma jornada máxima de 22 horas semanais e precisariam frequentar um curso. O valor seria bancado pelo governo e empresa.
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De acordo com Sabino, o Priore pretende facilitar a contratação de alguns trabalhadores, cuja faixa etária tem maior índice de desemprego. "Para isso, reduz as alíquotas de FGTS. Assim, o empregado tem diminuída a sua proteção ao tempo de serviço (inclusive reduz pela metade a multa quando da dispensa)", explica ele.
Já o Requip, segundo o especialista, dá margem para a contratação sem uma série de direitos. "Um contrato fraudulento de empregados, sem carteira assinada, sem proteção do INSS e sem férias. Acaba sendo pior do que o contrato intermitente, que já tem previsão na CLT", afirma ele.
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No caso do intermitente, que já foi criticada por especialistas, o contrato permite empregados com carteira assinada e direitos trabalhistas, mas que apenas trabalham e recebam salários quando forem convocados. Mas, nesse caso, existe proteção do INSS e o poder público não tem gastos.
Segundo Sabino, os trabalhadores vão prestar serviços sem nenhuma proteção e receberão apenas uma bolsa de incentivo à qualificação e um bônus de inclusão produtiva (paga com recursos públicos). Isso significa que recursos públicos serão usados para custear a força de trabalho que vai levar lucro a uma empresa privada.
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Para Sabino, os setores defendem as propostas pois afirmam serem necessárias para incentivar as contratações. "As propostas precarizam as relações de trabalho, sem dúvida. "O problema é que a precarização das relações de trabalho por lei não reduz o desemprego, assim como não houve com a Reforma Trabalhista e com o contrato Verde e Amarelo. É preciso que sejam criadas políticas públicas de qualificação profissional e desenvolvimento da economia para que o desemprego no país diminua. Infelizmente, o trabalhador brasileiro tem cada vez menos direitos e isso reflete também em outros setores", afirma o especialista.
Além disso, a MP passaria a não permitir que a fiscalização do trabalho aplique multa a uma empresa que descumpre as leis trabalhistas em uma primeira visita. A multa só poderia ser imposta se a violação à lei continuar ocorrendo em uma segunda visita. Essas propostas serão votadas na sessão de quarta-feira, 11, como afirmou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
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Também há a proposta de bancários, operadores de telemarketing, jornalistas, entre outros trabalhadores com horário reduzido, terem redução no valor do pagamento de horas extras. O texto prevê que o pagamento da hora extra seja somente de 20%, diferentemente do que determina a legislação que tem o aumento de 50%, de segunda a sábado, e 100%, domingo e feriados.
Priore
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No caso do Priore, o programa é direcionado a jovens entre 18 e 29 anos, no primeiro emprego com registro em carteira, além de contratação de pessoas com mais de 55 anos sem vínculo formal há mais de 12 meses.
O programa é semelhante ao Carteira Verde e Amarela, proposto com a MP 905/20, que perdeu a vigência sem ser votada. A remuneração máxima será de até dois salários mínimos, e o empregador vai poder compensar com o repasse devido ao Sistema S até o valor correspondente a 11 horas de trabalho semanais por trabalhador com base no valor horário do salário mínimo.
No total, a empresa poderá descontar até 15% das contribuições devidas ao sistema de aprendizagem (Sesi, Senai, Senac e outros). O Priore reduziria a contribuição para o FGTS do trabalhador, que é de 8% na CLT (2% para microempresa, 4% para empresa de pequeno porte e 6% para as demais).
Requip
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Já o Requip é destinado a quem está sem registro em carteira de trabalho há mais de dois anos, no caso também para jovens de 18 a 29 anos e beneficiários do Bolsa Família com renda mensal familiar de até dois salários mínimos.
O programa prevê o pagamento de bônus pelo trabalho em jornadas semanais de até 22 horas e de uma bolsa por participação em cursos de qualificação de 180 horas ao ano. O empregado não teria um vínculo de emprego com a empresa. No entanto, o Requip não proíbe que o trabalhador tenha um vínculo de emprego com outra empresa ou preste serviços como autônomo.
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Restrição à Justiça gratuita
O texto prevê que o acesso à Justiça gratuita será restrito. Caso seja aprovado, só irão ter direito ao benefício famílias carentes, com renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda familiar mensal de até três salários mínimos (R$ 3,3 mil).
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