Divergências com Banco Central marcam 100 primeiros dias de governoMarcello Casal JrAgência Brasil
Desde agosto do ano passado, o BC mantém a taxa Selic (juros básicos da economia), em 13,25% ao ano. A reação dos membros do governo varia.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem criticado o tom dos comunicados do Comitê de Política Monetária (Copom), que não descarta novos aumentos nos juros se a inflação continuar persistente. A ata do Copom, que sai seis dias depois de cada reunião, tem saído com tom mais ameno, o que faz o governo reduzir as críticas ao BC.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, tem dito que a redução da Selic não é fácil porque houve um “deslocamento de demanda” em relação a bens. “A gente tenta suavizar o ciclo. A gente olha para frente. A gente entende que os juros altos causam esses impactos na parte produtiva. A gente tenta suavizar isso, porque o nosso trabalho é fazer isso na forma que cause o mínimo de dano possível a economia”, destacou o presidente do BC em apresentação nesta semana a um banco de investimentos.
Postura
Professora emérita de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), Virene Matesco contesta e diz que a postura da autoridade monetária é acertada. “Qualquer outra política para combater a inflação fora da política monetária [aumento de juros] é paliativo. Quando o presidente Lula fica batendo no Banco Central, ele só piora a situação. Que a presidenta do PT fale é uma coisa, mas o presidente da República falar é outra coisa”, critica.
Segundo ela, cada declaração de Lula contra a política monetária provoca turbulências no mercado financeiro. “É como se o presidente estivesse pagando [por meio de oscilações no dólar e nos juros futuros] para criticar o Banco Central”, compara.
A divulgação do novo arcabouço fiscal parece ter distendido as relações. Na última quarta-feira (5), o presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse ter uma avaliação “superpositiva” das novas regras e declarou que o futuro marco fiscal evitará o descontrole da dívida.
Paralelamente, o governo tem o poder de indicar dois novos diretores do BC cujos mandatos acabaram em 28 de março pela lei de autonomia do BC. Titular da diretoria mais importante, a de Política Monetária, Bruno Serra já foi exonerado. O diretor de Fiscalização, Paulo Sérgio Neves de Souza, pode ser reconduzido.
Emprego e renda
Enquanto o governo está em compasso de espera, a economia sente os efeitos da desaceleração. A criação de empregos com carteira assinada nos dois primeiros meses do ano atingiu o nível mais baixo para o período desde 2020. A taxa de desemprego, medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, caiu para 8,6% no trimestre encerrado em fevereiro, mas o recuo deve-se à criação de vagas com baixos salários.
No curto prazo, dizem os especialistas, a única alternativa para destravar o mercado de trabalho depende da retomada dos investimentos públicos. “As obras públicas são um importante motor para contratar trabalhadores no curto prazo. Uma saída é a retomada de obras paradas, principalmente de creches. Além de amenizar o problema de emprego, as creches têm uma função social e ajudam mães que querem trabalhar fora e não conseguem”, diz Matesco.
Nassif é mais pessimista e diz que os investimentos para gerar empregos dependem, neste momento, da queda de juros. “Não há outra solução que não passe pela redução dos juros o mais rápido possível. A inflação no Brasil não é de demanda, mas de choques nos preços de combustíveis e de alimentos provocados pela retomada da economia global no pós-pandemia e a guerra na Ucrânia”, declara.
Para esta semana, está previsto o relançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do novo marco das parcerias público-privadas (PPP). Em relação às obras paradas, o governo lançou a plataforma Mãos à Obra, por meio da qual governos locais informam projetos interrompidos num banco de dados.
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.