Eduardo Paes aposta na concorrência com a B3 paulista para consolidar a nova Bolsa de Valores do RioPrefeitura/Divulgação

Quem tem menos de 40 anos dificilmente vai lembrar que o Rio de Janeiro já sediou a maior bolsa de valores do País e cumpria o papel de ser o centro do mercado de capitais brasileiro. Mas a história de sucesso teve um fim melancólico em 28 de abril de 2000, quando a Bolsa de Valores (BVRJ) realizou o seu último pregão. Dois anos depois, ela foi incorporada pela Bolsa de São Paulo, que se transformou no único espaço para realização desse tipo de negócio no País. No entanto, os dias de glória podem voltar no segundo semestre de 2025, com a retomada das atividades da Bolsa na Cidade Maravilhosa.

A notícia foi anunciada na última quarta-feira, 3, pelo prefeito Eduardo Paes, quando sancionou a lei que reduz de 5% para 2% o Imposto Sobre Serviços (ISS) cobrado para o setor financeiro. A medida viabilizou a retomada da Bolsa de Valores carioca. O Americas Trade Group (ATG), empresa do fundo árabe Mubadala, vai instalar na cidade a sua plataforma de negociações eletrônicas para o mercado de capitais. Com isso, a Bolsa carioca vai concorrer diretamente com a de São Paulo — a B3 —, atualmente a única em operação no País.

A Bolsa do Rio vai negociar ações, contratos de derivativos, câmbio e commodities. Além disso ela será a primeira Bolsa Brasileira de Crédito de Carbono. Mas a pergunta que fica: qual será o impacto para a economia da cidade e do Estado?

O Rio de Janeiro sedia atualmente 4 mil dos 57 mil fundos de investimento em operação no Brasil. Sob a gestão dos fundos fluminenses estão R$ 2,2 trilhões. Além disso, o Estado tem 1,1 milhão de investidores, todos utilizando a B3 para a realização de negócios. A reabertura da Bolsa do Rio pode representar a manutenção de um imenso volume de recursos financeiros na cidade.

Arrecadação de impostos

De acordo com a Secretaria Municipal de Fazenda e Planejamento, entre os anos de 2021 e 2023, o setor financeiro foi o quarto maior pagador de Imposto Sobre Serviços (ISS) à Prefeitura do Rio, algo em torno de R$ 1,5 bilhão — 9,1% da arrecadação total da Prefeitura. Com a reabertura da Bolsa, o valor tende a crescer exponencialmente. Além disso, o setor financeiro emprega 68,5 mil pessoas no Rio de Janeiro, cuja média salarial está na faixa de R$ 9,5 mil. A geração de postos de trabalho qualificados também tende a ser ampliada.

Paes destaca que a Bolsa carioca vem para competir com a rival B3. O prefeito comemorou a retomada com um vídeo na rede X (antigo Twitter) no qual brinca com os paulistas. Ele diz ainda que a iniciativa vai impulsionar o mercado de capitais não só no Rio de Janeiro, mas também no Brasil.

“A volta da Bolsa de Valores é a ponta do iceberg. O setor privado percebeu que tem uma concorrência a ser feita com São Paulo. Começamos a criar um ambiente econômico, um conjunto de atrativos, de novos mercados quer surgirão”, frisou.

Já o CEO do ATG, Claudio Pracownik, classificou a volta como um marco para e retomada do protagonismo do Rio de Janeiro no mercado de capitais, gerando desenvolvimento econômico e atraindo novos investidores para o Brasil.

“A nova bolsa terá sua sede administrativa localizada no Rio de Janeiro. Isso é muito importante para a cidade e para o Estado. O Rio voltará a ser um grande centro de negócios, atraindo investidores, e isso tem uma relevância enorme. Nós esperamos que este seja o marco inicial do renascimento do mercado financeiro no Rio de Janeiro”, explicou o CEO.

Pracownik destaca ainda o momento econômico vivido pelo País. Segundo ele, a entrada em operação de uma segunda bolsa de valores demonstra “a maturidade do mercado de capitais no Brasil”, além de ser um atrativo adicional para os investidores estrangeiros. O executivo aponta como consequências diretas da competição com a B3 a redução dos custos de listagem em bolsa cobrados pelas empresas; o incentivo à abertura de capital e a busca por recursos por novas companhias; a menor cobrança de taxas de negociação e a maior movimentação de liquidez de capitais.

O ATG aguarda agora a emissão da documentação pelo Banco Central (BC) e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para iniciar os preparativos para a entrada em operação da Bolsa.

Do apogeu à queda

Durante décadas, a Bolsa de Valores do Rio de Janeiro foi o epicentro do mercado de capitais no Brasil. Aqui eram realizados a maioria dos negócios envolvendo ações, com a Bolsa de São Paulo desempenhando um papel secundário. No entanto essa realidade começou a mudar em 9 de junho de 1989. Naquele dia a maior investidor da Bolsa, o egípcio radicado no Brasil Naji Nahas, depositou um cheque sem fundos no valor de 39 milhões de cruzados novos (moeda da época), criando um caos no mercado de capitais.

A corretora que recebeu o cheque sem fundo deixou de pagar outras corretoras, que não puderam honrar compromissos com os investidores. Nahas, que chegou a ser o maior acionista pessoa física da Petrobras, causou a quebradeira generalizada de corretoras, prejudicando de forma irreversível o funcionamento da Bolsa carioca.

A partir daí, o que se viu foi o esvaziamento acelerado da Bolsa do Rio de Janeiro. Os negócios foram rareando. Nos primeiros meses após o “calote” de Nahas, o volume de negócios caiu de 1 bilhão para 250 milhões de cruzados novos. Ou seja, perda de 75% da movimentação financeira.

Na época, chegou-se a especular que teria acontecido a interferência da Bolsa de São Paulo para gerar a crise e causar o esvaziamento do mercado de capitais carioca, porém a versão jamais foi confirmada. O fato é que em abril de 2000 houve o último pregão no prédio da Praça XV. Dois anos depois, a BVRJ foi incorporada pela rival paulista.