Com o fim do inverno e o aumento das temperaturas, a população deve se preparar para uma nova pressão no bolso: a conta de luz. O gasto nesse período dispara, impulsionado pelo uso intensivo de ar-condicionado e ventiladores. No momento, a conscientização ao usar um aparelho elétrico tem que ser redobrada. Desde 1º de outubro, o país está sob vigor da bandeira vermelha patamar 2, elevando o preço da conta a R$ 7,87 a cada 100 quilowatt-hora (kWh) consumidos.
O índice criado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) alerta que o custo de geração de energia subiu devido ao uso intensificado de termelétricas, que são mais caras e poluentes do que outras fontes, como hidrelétricas. A falta de chuvas e o clima seco, junto com o calor intenso, fizeram com que essas usinas fossem ligadas.
Segundo a agência, o mecanismo de bandeiras tarifárias busca oferecer maior clareza aos consumidores conectados ao Sistema Interligado Nacional (SIN) sobre cobranças adicionais na conta de energia elétrica. Implementado em 2015, ele reflete os custos de geração de energia no país, permitindo que o público ajuste o uso para economizar na fatura de eletricidade.
Conscientização e redução dos custos
“Com o anúncio da bandeira vermelha, a preocupação com o valor da conta aumentou”, afirma a nutricionista Tatiana Cathoud. Morando em uma casa com cinco pessoas, ela avalia que o consumo de energia tende a ser elevado. Para tentar reduzir os custos, adota medidas como evitar luzes acesas desnecessariamente e concentrar mais peças de roupa por lavagem, diminuindo a frequência de uso da máquina. "A preocupação sempre está ali, mas muitas vezes nos distraímos. E, nesse calor do Rio de Janeiro, é impraticável ficar sem ar-condicionado ou ventilador."
Já a universitária Carolina Azevedo diz que não usa aparelhos que gostaria, como o ar-condicionado: “Às vezes, fico com calor durante a noite, mas mesmo assim não ligo por medo do valor da luz.” Se a conta de energia continuar aumentando, ela afirma que teria que cortar gastos com lazer para conseguir arcar com as despesas de eletricidade.
Os comerciantes, por outro lado, não podem abrir mão de certos custos por conta do padrão de qualidade para atender os clientes. Paulo Andrade é dono do restaurante Sabores da Serra, em Botafogo, e diz que a conta cara é uma coisa normal de todo ano. “Sempre buscamos alternativas para a redução de custos, porque é uma ação saudável para os negócios. Eu não posso tirar o conforto, senão porque perco a clientela”, explica.
Andrade tem costume de desligar equipamentos que não estão sendo utilizados, priorizando o uso de ar-condicionado e ventilador nos horários de pico. Ele também investe em equipamentos com maior eficiência energética, com Selo Procel. “O aumento de custos faz parte da rotina do comércio, então são hábitos que devem ser aplicados em qualquer época. Mas, se essa situação continuar, o jeito vai ser encarecer os preços do restaurante”, diz.
A alta nas tarifas de energia impacta mais as famílias de menor renda, nas quais o consumo de eletricidade pode comprometer o orçamento doméstico. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em algumas regiões do Brasil, os gastos com energia chegam a representar até 20% da renda familiar. Essa realidade torna o controle do consumo elétrico não apenas uma questão de economia, mas também de estabilidade financeira para muitas pessoas.
Entender esse sistema é fundamental para calcular o impacto tanto no bolso quanto no meio ambiente. Para minimizar os efeitos financeiros e ambientais desse cenário, a Light preparou dicas para um consumo consciente:
- Redução no consumo de energia: A adoção de hábitos conscientes no uso de eletrônicos e eletrodomésticos pode reduzir significativamente o consumo doméstico de energia;
- Selo Procel: Priorize a escolha de produtos com essa identificação, que indicam maior eficiência energética.
- Consumo em modo stand by: Mesmo desligados, muitos aparelhos continuam consumindo energia. Desconectá-los da tomada pode reduzir a conta de luz;
- Ar condicionado: Um aparelho de 9 mil BTU pode representar até 50,69% do consumo mensal de uma residência, por isso, é importante manter o filtro limpo, ajustar o termostato, e fechar portas e janelas;
- Iluminação: Troque lâmpadas incandescentes por modelos LED ou fluorescentes, que consomem até 75% menos energia e duram mais;
- Chuveiro elétrico: Utilize a chave seletora no modo 'verão' e controle o tempo de banho, limitando-o a dez a 15 minutos para economizar energia.
Sustentabilidade
O cardiologista Roberto Maiolino e sua família adotam esses hábitos de economia de energia em casa, buscando aliviar o impacto na conta de luz. Porém o aumento constante nas tarifas ameaça seus planos de tornar a residência mais sustentável. Ele pretende substituir os aquecedores de água a gás por chuveiros elétricos e trocar o fogão a gás por um modelo de indução.
Maiolino propôs à síndica do condomínio a instalação de placas solares na cobertura e carregadores para carros elétricos, iniciativas que podem beneficiar todo o prédio. "Se a conta continuar subindo desse jeito, muitas pessoas terão que abrir mão de seu conforto", diz.
Estudos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) indicam que, para garantir o abastecimento e evitar a dependência excessiva de térmicas em períodos críticos, o Brasil precisa aumentar a participação de energias renováveis — eólica, solar e biomassa— na matriz energética. Estima-se que, até 2030, a energia solar e eólica juntas possam representar mais de 30% da matriz elétrica do país, aliviando a pressão sobre as hidrelétricas.
Além de Maiolino, Tatiana gostaria do uso de placas solares como fonte energética. “Acho que o investimento na energia solar compensa bastante. Por um tempo pagaria o valor dos equipamentos e ao final de dois anos teríamos uma energia gerada limpa e barata”, comenta.
O diretor de Engenharia Elétrica da PUC-Rio, Delberis Lima, diz que o custo das placas fotovoltaicas é relativamente baixo comparado com os benefícios que isto traz para os consumidores no médio e longo prazo. “É altamente vantajoso. O valor inicial, que envolve os equipamentos e a instalação, é rapidamente pago em torno de quatro anos com a economia na fatura de energia”, destaca.
Entenda a bandeira vermelha
Lucas Paiva, COO da Lead Energy, explica que o Brasil utiliza um sistema chamado "ordem de mérito", que prioriza a usina mais barata disponível para atender à demanda. Quando a estação mais barata está gerando 100%, é chamada a próxima e assim por diante. Isso cria um ranking de custos, permitindo que o operador nacional do sistema saiba qual usina acionar, sempre priorizando o menor valor.
O acionamento das termelétricas é o principal fator responsável pelo aumento nas tarifas, refletido na bandeira vermelha. A usina mais cara do Brasil gera energia a cerca de R$ 3,60 por kWh, devido ao alto custo do combustível, como o óleo diesel.
Em contrapartida, há termelétricas a gás que produzem energia a R$ 0,40 por kWh. “Essa diferença é significativa. As bandeiras tarifárias servem como um alerta antes que a situação se torne crítica. Para se proteger, o consumidor precisa estar ciente dessa mudança na tarifa”, comenta Paiva.
No atual cenário de transição energética, a manutenção de termelétricas é vista como um problema ambiental. O chefe do Departamento de Engenharia Elétrica do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet), Mamour Sop Ndiaye, comenta: “Essas usinas, além de serem caras, estão entre as fontes de energia mais poluentes do planeta. Elas utilizam combustíveis fósseis, como carvão, petróleo e gás, que liberam grandes quantidades de gases de efeito estufa (GEE), intensificando o aquecimento global”.
Segundo o professor, essas usinas são uma contradição em um momento em que o mundo tenta reduzir a dependência de fontes energéticas fósseis, adotando medidas para mitigar os impactos ambientais e buscar alternativas mais sustentáveis e renováveis. “O uso continuado das termelétricas pode comprometer os esforços do país na luta por um mundo menos carbonoso.”
Para reverter a bandeira, Mamour ressalta que a consciência ambiental é fundamental para compreender o consumo desenfreado de energias fósseis. “Esse comportamento leva a consequências graves, como a escassez hídrica, que, por sua vez, demanda a ativação de usinas termoelétricas e a implementação das bandeiras tarifárias, tornando a energia mais cara”, explica.
Esta é a primeira vez em mais de três anos que a bandeira vermelha patamar dois é acionada. Uma sequência de bandeiras verdes começou em abril de 2022 e foi interrompida apenas em julho de 2024, com a bandeira amarela, seguida da bandeira verde em agosto.
*Matéria da estagiária Aline Fernandes, sob supervisão de Marlucio Luna
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