Rebeca Andrade durante treino no Flamengo - Armando Paiva / Agência O Dia
Rebeca Andrade durante treino no FlamengoArmando Paiva / Agência O Dia
Por ANA CARLA GOMES

Rio - Por trás da poderosa apresentação no solo ao som do funk 'Baile de Favela', que conquistou os árbitros em Stuttgart, na Alemanha, no fim de semana passado, está uma menina de 19 anos que guarda histórias de força e superação. Rebeca Andrade superou as dificuldades financeiras de uma família de sete irmãos para conseguir treinar, saiu de casa, em Guarulhos, ainda bem novinha, e teve que enfrentar cirurgias que a fizeram pensar que a carreira estaria ameaçada. Foi nas palavras da mãe, Dona Rosa, sua maior incentivadora, que essa paulista encontrou a confiança para seguir em frente até despontar hoje como um dos principais nomes da ginástica artística brasileira.

A apresentação ao som de 'Baile de Favela' foi uma surpresa do coreógrafo: "No ciclo passado eu tinha a série da Beyoncé e eu era muito fã dela. E ele chegou com essa surpresa e fez a mesma coisa: 'Terminei a sua música'. Começou com aquele órgão de igreja e depois foi para o 'Baile de Favela'. Eu falei: 'Roni, é funk'. No começo, eu fiquei meio em choque porque sair de uma Beyoncé para ir para um funk é muito diferente. É um ritmo brasileiro, uma coisa que nem todo mundo gosta. Mas eu gostei muito, eu adorei a série", contou a ginasta do Flamengo.

Em Stuttgart, no mesmo palco do Mundial de outubro, a Seleção feminina conquistou o título inédito por equipes do DTB-Pokal, evento amistoso tradicional. Rebeca brilhou vencendo em todos os aparelhos: solo, salto, trave e barras assimétricas. Suas notas renderiam quatro medalhas no Mundial de 2018. "Fiquei bem feliz com as minhas notas, mas posso fazer melhor do que já fiz", comenta Rebeca.

Rebeca Andrade durante treino no Flamengo: ginasta diz que coreografia ao som de funk foi uma surpresa - Armando Paiva / Agência O Dia

O Mundial de Stuttgart será classificatório para a Olimpíada de Tóquio 2020. O Brasil precisa terminar entre os nove primeiros colocados para garantir as vagas por equipes (masculina e feminina) nos Jogos Olímpicos. "Eu só penso em chegar e fazer o que eu treinei para fazer. Eu penso em classificar a equipe nos primeiros dias e ir bem no primeiro dia. A medalha vem se eu fizer o meu melhor", diz.

Aos 19 anos, Rebeca já passou por momentos difíceis na carreira. Ela rompeu pela primeira vez o ligamento cruzado anterior do joelho direito durante um treino para o Jogos Pan-Americanos de Toronto, em 2015. Perdeu a competição e o Mundial daquele ano. Depois de se recuperar, foi 11ª no individual geral na Rio-2016. Em outubro de 2017, voltou a sofrer lesão no joelho direito durante o treino de pódio do Mundial de Montreal, tendo que operar novamente.

A força veio da família: "Converso muito com a minha mãe. Pensei várias vezes em desistir. A recuperação dessa vez foi melhor do que a primeira, quando senti muita dor. Já estava muito mais preparada psicologicamente para o que iria passar. Falo com a minha mãe e parece que tudo vai ficar bem. Ela diz que tenho uma força e uma fé inabaláveis. Eu me agarrei a isso e também sou muito religiosa".

FORÇA NA MÃE

E foi a mãe que a fez deixar para trás o pensamento de que a carreira estava ameaçada: "Via as meninas treinando e não me imaginava voltando a fazer solo. Olhava para a minha perna fina. Não tinha força. Num desses dias, conversei com a minha mãe e ela disse: 'Como você tem certeza de que não vai conseguir? Você nem tentou. A mãe acredita em você'. Meu treinador também me ajuda e me entende muito bem. Era muita gente me ajudando. Tinha nadado, nadado, nadado e não queria morrer na praia".

Rebeca aprendeu a driblar a saudade de casa desde cedo: aos 10 anos, foi treinar em Curitiba e depois seguiu para o Rio com seus treinadores. A ginástica entrou na sua vida através de uma tia, que trabalhava num ginásio em Guarulhos. "Sempre fui muito espoleta, gostava de pular em árvore. Ela me levou e o pessoal gostou. Para mim, era um parque de diversão", recorda.

Mas Rebeca enfrentou dificuldades. A mãe, Dona Rosa, trabalhava como empregada doméstica. "Nem sempre tinha dinheiro para ir treinar. Teve uma época em que o meu irmão conseguiu uma bicicleta e me levava para o treino de bicicleta. Só que a minha casa era muito longe do ginásio. Ele fazia de tudo por mim. Tinha uma subida muito alta e ele não deixava eu descer da bicicleta para ir andando. Ele ia empurrando a bicicleta até eu chegar ao ginásio. Eles fizeram de tudo por mim. Eu nunca vou conseguir devolver isso para eles. Fizeram com amor e carinho".

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