Família Mantuano surgiu na arquibancada do Maracanã, em 1976, acompanhando a Máquina TricolorArquivo pessoal

Rio - Amor incondicional. É assim que podemos classificar a paixão das famílias Ribeiro e Mantuano com o Fluminense. Um amor que passou por gerações e fortalece as relações desde o avô ao neto. Em comum entre as duas famílias está o sonho de fechar a cicatriz do trauma da Libertadores de 2008 e reescrever a história com um final feliz após 15 anos.
A paixão pelo Fluminense na família Ribeiro começou com Francisco Ribeiro. O pai de Washington e avô de Jonathan, Guilherme e Heitor frequenta o Maracanã há 50 anos, desde 1973. Ele já viu a Máquina Tricolor, o casal 20 formado por Assis e Washington, e a geração de Thiago Neves, Conca e Fred, mas pode ver algo inédito em 2023: a conquista da Libertadores. E ao lado da família.
"A paixão surgiu no Maracanã em 1973. Me batizei como torcedor do Fluminense e não me arrependo. São 50 anos. Ser tricolor pra mim é uma alegria no meu coração. Vai ser uma grande alegria para nós todos (comemorar o título da Libertadores em família). Que seja uma comemoração bem feliz", disse Francisco Ribeiro, de 70 anos, que passou a paixão pelo clube para os filhos e netos.
"Foi um sentimento natural. O meu pai, mesmo na correria da vida, sempre passou pra mim. Sempre o tive como exemplo. Pouquíssimos amigos meus de infância torciam pelo Fluminense. Eu ia em jogos, pagava os ingressos para os amigos para ter companhia. Foi algo natural, um sentimento puro que veio do meu pai e passou (para as gerações seguintes)", afirmou Washington, de 41 anos, filho de Francisco.
Washington tem o nome de dois ídolos da história tricolor. Nascido em 1982, ele chegou ao mundo um ano antes de outro Washington chegar ao Fluminense. Na infância, pôde acompanhar o ex-camisa 9 brilhar ao lado de Assis e formar o inesquecível "Casal 20", que foi tricampeão carioca entre 1983 e 1985, além de campeão brasileiro em 1984. Agora, já adulto e pai, pode viver algo inédito com a família.
"Vivi dias maravilhosos no Maracanã. Quando você vai aos jogos, faz amizades. Conheci muitas pessoas e fiz muitos amigos. A Libertadores de 2008 acompanhei presencialmente. Já essa Libertadores é especial porque estou acompanhando com meu pai, meus sobrinhos, meu filho e minha esposa. É muito prazeroso. Estou muito mais confiante. Esse ano a Libertadores vai ser nossa", destacou.
Paixão da família Ribeiro pelo Fluminense começou o avô Francisco há 50 anos - Arquivo pessoal
Paixão da família Ribeiro pelo Fluminense começou o avô Francisco há 50 anosArquivo pessoal
Netos de Francisco, Jonathan e Guilherme conviveram mais com o avô materno desde a infância e, por isso, não seguiram o exemplo do pai que é botafoguense. Jonathan, de 31 anos, é seis anos mais velho do que o irmão Guilherme, e esteve presente na campanha da Libertadores de 2008. Ele não esconde a tristeza pela derrota nos pênaltis e o orgulho pelas boas memórias que acompanhou de perto.
"Um dia após o vice, eu fui para a escola com um casaco antigo que o meu avô tinha do Fluminense. Um dia após perder o título mais importante da história, a minha primeira atitude foi sair com o casaco e mostrar o quanto estava orgulhoso por tudo o que eu vivi. Eu vi o gol do Washington nas quartas (contra o São Paulo), a vitória sobre o Boca (Juniors) na semifinal... Meu sentimento era de orgulho", explicou Jonathan, que se tornou uma inspiração para o irmão.
"É muito gratificante ter o meu irmão do meu lado nos jogos. Começamos a viajar e ir em jogos fora. É um ponto importante. É uma tradição de família e isso faz a gente se aproximar. Eu tenho um contato muito mais próximo com meu irmão por causa do Fluminense. Eu tive a influência, comecei a levar ele no estádio, e poder acompanhar com ele é maravilhoso", completou.
Há 15 anos, Guilherme ainda era uma criança e não frequentava os jogos como atualmente, e por isso não esteve presente na campanha da Libertadores de 2008. Hoje, aos 25 anos, tem apenas lembranças vagas daquele momento, mas lembra com detalhes da dor do irmão após o vice. Já em 2023, acompanhou de perto a trajetória tricolor e esteve presente em Porto Alegre na classificação à final.
"Minha lembrança (de 2008) é muito vaga. Mas lembro com detalhes da final. Lembro dos vizinhos gritando os nomes dos jogadores da LDU e do meu irmão triste. Em 2023 tive a oportunidade de estar em todos os jogos em casa e ter ido no jogo contra o Inter na volta. Vivi bastante o Fluminense nesse ano. Me sinto privilegiado por estar presente nos principais jogos e também por estar na final", finalizou.
Em 2012, Jonathan e Guilherme acompanharam o Fluminense na Libertadores pela primeira vez juntos nos estádios. O time comandado por estrelas como Fred, Deco e Thiago Neves caiu nas quartas de final diante do Boca Juniors, dentro de casa. O sentimento, daquela vez, foi diferente para Jonathan, que ainda teve que consolar o irmão mais novo e assumir o papel que foi de seu tio em 2008.
"Fiquei muito triste (em 2012). Não tive o mesmo sentimento de orgulho (de 2008). Eu vi meu irmão muito triste e isso me deixou muito mal. Lembro que ele me perguntou por que aquilo estava acontecendo. É horrível não saber o que responder. A inversão de papel não foi fácil de lidar, mas agora, em 2023, estamos tendo muitas respostas. Hoje costumo dizer que aquilo estava acontecendo para que a gente pudesse chegar nessa final e viver todo esse processo", disse.
"A gente fica incrédulo, mas é muito legal viver isso em família. É um sonho. Se algum dia me perguntar o que sonhei em viver com a minha esposa e meu irmão no estádio, eu responderia que era poder assistir uma final de Libertadores no Maracanã. O sentimento é completo. Estamos na nossa casa, com as pessoas que amamos e podendo presenciar o título mais importante da história do clube", completou.
Família Ribeiro em visita nas Laranjeiras, sede do Fluminense - Arquivo pessoal
Família Ribeiro em visita nas Laranjeiras, sede do FluminenseArquivo pessoal
Entre o período da final de 2008 e de 2023, a família Ribeiro cresceu. Heitor, de 10 anos, hoje ocupa o posto de Guilherme há 15 anos. O neto de Francisco e filho de Washington já frequenta o Maracanã e costuma ir aos jogos com o primo Jonathan pelo menos uma vez por mês. Ele não estará na final contra o Boca Juniors, da Argentina, mas mostra confiança na vitória do time do coração.
"Espero um resultado muito bom para o Fluminense. Espero que a gente ganhe e, se Deus quiser, vamos ganhar. Acredito que (John) Kennedy, (Germán) Cano ou Jhon Arias vão fazer o gol na final", disse Heitor, que declarou que é fã do atacante Keno.

Família surgiu no Maracanã graças ao Fluminense

O futebol proporciona momentos inexplicáveis. Frequentar estádios permite socializar com desconhecidos, como comemorar gols com alguém que você não conhece, e assim criar novos laços. E foi assim que Mário e Nayde Mantuano iniciaram uma grande história de amor. Frequentadores assíduos do Maracanã, o casal se conheceu na arquibancada do antigo maior do mundo, acompanhando a Máquina Tricolor em 1976.
"Nossa família nasceu no Maracanã. Minha esposa e eu nos conhecemos na arquibancada, na época da Máquina Tricolor, em 1976. O pai dela também era tricolor e sempre íamos juntos para os jogos. Sempre vinha para a casa dele, que é aqui do lado do Maracanã, onde a gente mora hoje. O Maracanã virou o nosso playground, e isso foi passando de geração para geração", disse Mário.
"Quando era criança já ia ao estádio com o meu pai, que era tricolor, minha irmã e meus primos. Naquela época nem era tão comum mulheres na arquibancada. Nós subíamos o Alto da Boa Vista para pegar bambu e produzíamos bandeira aqui em casa para o nosso uso, além de pó-de-arroz também para o nosso uso. Minhas primeiras lembranças da infância tem o Fluminense", recordou Nayde.
Mário e Nayde Mantuano estão juntos há 43 anos e são casados há 35. O casal teve dois filhos: Rafael, de 26, e Marina, de 24. O amor pelo Fluminense, é claro, foi compartilhado, e ambos não pensaram duas vezes na escolha do time do coração. Os irmãos frequentam o Maracanã desde os três anos e a paixão em comum ajuda a fortalecer a relação da família. 
"A família literalmente nasceu no Maracanã. Passar essa paixão foi uma coisa muito espontânea. Eles (Rafael e Marina) nasceram no meio disso tudo e nem pensaram em escolher outro time. O amor pelo Fluminense fortalece ainda mais a nossa relação, que começou pelo Fluminense. Sempre ficamos unidos para ver os jogos e comemoramos juntos. Só quem vive tudo isso que entende", explicou Nayde.
Família Mantuano surgiu na arquibancada em 1976 acompanhando a Máquina Tricolor - Arquivo pessoal
Família Mantuano surgiu na arquibancada em 1976 acompanhando a Máquina TricolorArquivo pessoal
A família completa começou a frequentar o Maracanã no dia 11 de agosto de 2002. Era uma tarde de sol e Dia dos Pais no Rio de Janeiro. Romário estreava pelo Fluminense. Foi o primeiro jogo de Marina ao lado dos pais e do irmão - que já frequentava desde 1999 - no estádio. O Tricolor goleou o Cruzeiro por 5 a 1, com dois do Baixinho, para a alegria dos 65 mil tricolores. 
"O Fluminense é a raiz da minha vida. Meus pais se conheceram no estádio. Se eles não se conhecessem ali, quem garante que eles iriam se conhecer um dia? Minha primeira lembrança no estádio foi a estreia do Romário. Esse jogo foi marcante porque foi o primeiro da minha irmã e foi a primeira vez que fomos nós quatro. Nosso primeiro jogo juntos e a estreia de um dos maiores de todos os tempos", disse Rafael.
Em 2008, a família encarou fila durante a madrugada, perrengue pela manhã, mas conseguiu ingresso para a primeira final de Libertadores do Fluminense. A expectativa pelo título, porém, deu espaço para o maior trauma de arquibancada. Rafael e Marina eram crianças, mas já frequentavam o Maracanã e, por isso, sentiram a derrota, mesmo que ainda não soubesse a dimensão do resultado. Além da dor pelo vice, os pais ainda tiveram que lidar com a tristeza dos filhos.
"Foi muito traumático. Meus filhos eram pequenos. Foi uma choradeira geral, não teve como. A única coisa que pude falar para os meus filhos é que quem dera as lágrimas deles fossem só por causa de futebol, porque a gente ainda pode passar por coisas piores na vida. O futebol é a nossa vida, mas também não podemos nos desesperar, porque realmente foi desesperador", contou Nayde.
"A diferença do sentimento (de 2008 para 2023), pela minha perspectiva, é que em 2008 foi uma frustração enorme que até hoje levamos um luto dentro da gente por causa disso. Em 2023 está mais pesado porque a gente quer acabar com o trauma e apagar isso da memória. A ansiedade está muito maior. Naquela época não tinha a dimensão, tinha filhos pequenos e prestava mais atenção neles do que na gente mesmo. Mas dessa vez vai ser uma prova cardíaca para todos nós", completou.
Família Mantuano no Maracanã acompanhando o Fluminense - Arquivo pessoal
Família Mantuano no Maracanã acompanhando o FluminenseArquivo pessoal
Hoje já na fase adulta, Rafael e Marina veem o Fluminense e também a torcida tricolor mais preparada mentalmente para encarar a segunda final de Libertadores. Ambos encaram o adversário com respeito pela história na competição, mas acreditam que, enfim, chegou a hora de pintar a América do Sul de verde, branco e grená.
"Tinha 11 anos. Fui em todos os jogos. Foi a maior festa que eu já vi no estádio. Foi muito emocionante, mas infelizmente não conseguimos o título. Hoje o Fluminense parece estar mais preparado mentalmente para decidir um campeonato, apesar de achar o time de 2008 melhor que o atual. Mas hoje vejo tanto o time quanto a torcida mais preparados para a final", disse Rafael.
"Apesar do Fluminense ter um time superior ao Boca (Juniors) tecnicamente, times argentinos tem algo a mais quando se trata de Libertadores. Estar preparado é algo relativo porque uma final engloba diversos fatores que podem ou não prejudicar uma equipe. Mas acredito que o time de 2023 seja mais maduro para encarar decisões", completou Marina.