Londres - O Reino Unido celebrou nesta terça-feira as expulsões de supostos espiões russos ao redor do mundo como um "ponto de inflexão" na atitude do Ocidente em relação a uma Rússia temerária.
Vinte países, incluindo Estados Unidos e 16 membros da União Europeia, decidiram na segunda-feira expulsar pelo menos 116 supostos agentes russos que trabalhavam sob cobertura diplomática, em uma retaliação coordenada sem precedentes, inclusive no período da Guerra Fria.
Nesta terça, a Irlanda e a Otan se uniram ao movimento.
A Irlanda anunciou a expulsão de um diplomata russo, já a Aliança do Atlântico Norte (Otan) decidiu expulsar sete diplomatas russos e negar credencial a outros três, segundo informou o secretário-geral Jens Stoltenberg.
"Isso manda uma mensagem clara à Rússia de que há custos e consequências para sua forma de atuar, inaceitável e perigosa", acrescentou o secretário-geral da Aliança do Atlântico Norte.
"Nunca antes tantos países haviam se unindo para expulsar diplomatas russos", escreveu o ministro britânico das Relações Exteriores, Boris Johnson, em um artigo publicado no jornal The Times, no qual afirma que este "é um golpe do qual a inteligência russa levará muitos anos para se recuperar".
"Acredito que os acontecimentos de ontem podem virar um ponto de inflexão. A aliança ocidental tomou ações decisivas e os sócios do Reino Unido se uniram contra a ambição temerária do Kremlin", completou.
As expulsões foram uma resposta ao envenenamento com um agente neurotóxico do ex-espião russo Serguei Skripal e sua filha Yulia em 4 de março em Salisbury, sul da Inglaterra. Os dois permanecem em estado crítico em consequência do ataque, atribuído por Londres a Moscou.
Skripal, um oficial de inteligência militar russo detido por Moscou por repassar informações sobre agentes russos a vários países europeus, chegou ao Reino Unido em 2010 graças a uma troca de espiões.
Nova Guerra Fria
O Reino Unido já havia ordenado a expulsão de 23 diplomatas russos após acusar a Rússia pelo ataque. Moscou negou a acusação e apontou para o serviços de inteligência britânico.
Na segunda-feira, os aliados da Grã-Bretanha seguiram o exemplo, liderados pelos Estados Unidos, que ordenaram a expulsão de 60 russos de seu território, em um novo golpe para as relações entre Washington e Moscou menos de uma semana depois do presidente americano Donald Trump ter felicitado o colega russo Vladimir Putin por sua reeleição.
Outros países se uniram imediatamente à retaliação e anunciaram expulsões em menor escala, um movimento que o chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, atribuiu à pressão dos Estados Unidos.
"É o resultado de pressões colossais, uma chantagem colossal que constitui, infelizmente, a principal arma de Washington no cenário internacional", afirmou Lavrov durante uma visita ao Uzbequistão.
A Rússia já advertiu que está preparando uma resposta de represália para os países que "se submetem" sem, afirma Moscou, entender totalmente o que está acontecendo.
Em um artigo para o jornal russo Vedomosti, o analista Fiodor Lukianov afirma que as expulsões, "particularmente destrutivas para as relações entre Rússia e Estados Unidos, levam as relações entre Moscou e o Ocidente a um novo período de Guerra Fria".
"Não é o fim da escalada, está claro que vai se agravar, prevemos medidas ainda mais severas, sanções econômicas contra a Rússia", advertiu, enquanto o jornal Izvestia denunciou uma ação de "russofobia".
Ao anunciar as respectivas expulsões, no entanto, as autoridades ocidentais deixaram claro que compartilham a afirmação britânica de que apenas o Kremlin poderia estar por trás do envenenamento de Skripal.
"Ninguém se deixa enganar"
Em seu artigo no jornal The Times, Johnson considera que "o uso de um agente neurotóxico proibido em território britânico é parte da tendência mais ampla de um comportamento temerário de Vladimir Putin".
Ele cita a anexação da Crimeia, o apoio russo ao regime sírio de Bashar al-Assad e as supostas interferências em eleições em outros países.
"O fio condutor é a vontade de Putin de desafiar as regras essenciais das quais dependem a segurança de cada país", escreveu.
E, ao criticar as várias teses de Moscou para explicar o envenenamento, o chefe da diplomacia britânica respondeu: "Houve um tempo em que a tática de espalhar a dúvida poderia ser eficaz, mas agora ninguém se deixa enganar".