Julian Assange, fundador do WikiLeaks - Divulgação
Julian Assange, fundador do WikiLeaksDivulgação
Por AFP

Bruxelas - O ex-presidente do Equador, Rafael Correa, criticou nesta quinta-feira em uma entrevista à AFP seu sucessor Lenín Moreno, a quem acusa de entregar o fundador de WikiLeaks em troca de um acordo multimilionário feito com Paul Manafort, ex-chefe de campanha de Trump, em 2017. Além disso, Correa afirma que "vingança pessoal" foi a gota d'água. 

Da Bélgica, onde vive desde 2017 depois de dez anos à frente do governo do Equador, Correa garante estar em "choque" pela detenção nesta quinta-feira de Assange, a quem seu governo concedeu asilo em sua embaixada em Londres em 2012.

PERGUNTA: A polícia britânica prendeu nesta quinta-feira Julian Asssange, a quem o senhor concedeu asilo. Qual é a sua reação?

RESPOSTA: Embora eu esperasse, estamos em estado de choque porque não achávamos que se atreveria a tanto. Moreno nunca gostou de Julian Assange desde que se tornou presidente. Quando era meu vice-presidente, nunca disse nada, por seu pacto com os Estados Unidos.

Isso atenta contra o direito internacional, contra o direito de asilo, o fundamental direito de um refugiado não ser entregue para aqueles que o requerem, atenta contra a Constituição equatoriana, porque Julian Assange desde 2017 é cidadão equatoriano.

Além disso, tudo é por uma vingança pessoal, porque o que detona isso é que há algumas semanas, há poucos dias, o WikiLeaks publicou algo que já era de conhecimento público, mas não a nível mundial, que é o caso de corrupção 'Ina Papers' no qual a família presidencial está envolvida.

O WikiLeaks publicou isso há alguns dias e aí vem a cólera de Moreno contra Assange, levando-o a essa decisão sem precedentes, que não somente expôs a vida de Julian Assange, mas que também humilhou o Equador.

P: O senhor relaciona a decisão com o caso de corrupção, mas o Equador já havia advertido Assange de não se interferir na política interna de terceiros países...

R: Isso também aconteceu comigo. O que fizemos foi chamar a atenção para isso, em um determinado momento cortar a internet quando ele estava dando sua opinião sobre as eleições presidenciais nos Estados Unidos. Mas não é por isso que você vai entregá-lo aos leões.

Moreno desde o início quis entregar Assange, tem alma de traidor, já não são opiniões, é público. Em 2017, depois de assumir a presidência, Moreno se reuniu com [o ex-chefe de campanha de Donald Trump] Paul Manafort.

Segundo testemunhas presentes nessa reunião, foi Moreno que ofereceu a Manafort entregar Assange se os Estados Unidos o apoiassem financeiramente. Como efetivamente ocorreu. Ele acaba de conseguir um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) com uma ajuda multimilionária.

Após a visita do vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, em meados do ano passado, três coisas foram acordadas: isolar a Venezuela, a que o Equador se prestou; deixar a Chevron impune, também fez isso; e entregar Julian Assange, que acaba de fazer.

P: O senhor conseguiu falar com Assange? O acontecerá com ele agora?

R: Eu não conheço Julian Assange, nunca o vi. Falei com ele somente uma vez, quando me concedeu uma entrevista em inglês para o Russia Today.

Espero estar enganado, mas é quase certo que o extraditarão aos Estados Unidos. Quando concedemos o asilo, não foi para justificar tudo o que fez, talvez ele tenha feito coisas ilegais, mas não havia garantias de um processo justo nos Estados Unidos.

P: Essa decisão faz parte também da campanha contra o senhor, da qual acusa Moreno?

R: Claro, um agravante é que eu lhe dei o asilo. Tudo o que eu faça tem que ser desfeito. Por exemplo, a Unasul, a refinaria, as negociações de paz com o Exército de Libertação Nacional. Tudo isso ele cortou, porque eu havia iniciado, e agora o asilo a Julian Assange.

O Equador ficou muito mal frente à comunidade internacional e eu peço desculpas. Isso ficará nos anais da história da Humanidade como um dos atos mais rasteiros, mais baixos, que um governante poderia fazer: entregar por vingança pessoal, por ódio, a um asilado político, a seus carrascos.

 

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