Economista Raul VellosoDivulgação/Inae

Desde sexta-feira, 24, tenho tido a oportunidade de discutir intensamente o tema econômico central do momento no país: a busca de um arcabouço fiscal que substitua o prematuramente falecido teto de gastos, criado pela Emenda 95/16, com vigência prevista para 20 anos. Destaco, aqui, a conversa com a jornalista Mara Luquet, que pode ser conferida em https://inteligenciafinanceira.com.br/saiba/economia/problema-previdencia-novo-arcabouco-fiscal/.
O grande drama de mecanismos como o teto, ou como a nova proposta que o governo começa a negociar com o Congresso Nacional, é a falta da devida atenção à estrutura super rígida do gasto público brasileiro, um problema muito difícil de resolver, especialmente para quem busca apenas soluções muito simples, para não dizer simplórias. Ou seja, há que atacar questões relacionadas com as entranhas do gasto antes de pensar que a missão esteja concluída.
Aí, o “X’ da questão é que o chamado gasto obrigatório da União, que tem por trás de sua implementação leis muito difíceis de mudar, chegou, após o teto, a valores acima de 90% do total, e a parcela discricionária, único local que os governos tentam ajustar, e onde se concentram os investimentos em infraestrutura, vai aos poucos tendendo a desaparecer, algo praticamente impossível de se imaginar na prática.
No primeiro grupo se encastela o item isoladamente de maior peso no total da União, Previdência, que passou de 19% em 1987 para 51% do total em 2021. Ou seja, com medidas como o teto, é tentar resolver com medidas simplórias algo que é gigantesco.
Enquanto isso, os citados investimentos passavam de 16% para apenas 2% do total, algo absurdo. Não é por outro motivo que o crescimento do PIB desabou fortemente dos anos 1980 para cá.
Ou seja, é preciso atacar de frente o problema dos elevados desequilíbrios previdenciários em que a dívida total de todos os regimes, inclusive o do INSS, junto aos segurados, é da ordem de metade do PIB, algo chocante. Só assim é possível abrir espaço nos orçamentos para investimentos, ou, em tese, se for necessário, até para reduzir a dívida pública.
Só assim quem atua no lado do financiamento dos governos se sentirá seguro em aplicar em títulos públicos, inclusive porque já há um comando constitucional para se fazer isso - § 1º. do Artigo 9º da EC 103/19, e muito pouco tem acontecido nesse contexto. (A não ser em casos como o do Piauí, meu estado natal, onde uma perspectiva de investir zero de 2022 em diante foi alterada para algo ao redor de R$ 1 bilhão anuais, e de cuja experiência seu último governador, Wellington Dias (PT), levou a lição para seu novo cargo, como ministro do Desenvolvimento Social – de que é preciso fazer mais gastando menos).
Ou seja, a abertura de espaço orçamentário por esse caminho, se posta em prática, é a verdadeira âncora fiscal que precisamos construir, e não a sinalização aposta nas medidas de se aumentar o investimento via aumento de arrecadação, algo bastante complicado no mundo em que vivemos.
Raul Velloso é consultor econômico