Eu olho ao lado e desacredito de tamanha beleza. Passo suavemente a mão pelo corpo sem cansaço, descansando. Ele é mais jovem. Até quando, meu Deus?
Vim de uma história onde o carinho ficava empoeirado, abatido, talvez, pelo desuso. Meu marido era um homem de rudezas. E eu me acostumei. Fiz, dos dias, obrigação. Fiz, das pausas, quando ele não estava, instantes de paz. Era bronco, também, no sexo. Falava vantagens aos outros. Eu ouvia. Eu sentia nada. Anos sentindo nada. Ficava apenas desejosa de que acabasse rapidamente.
Morreu meu marido. Morte súbita. Nervosismos acumulados antecipam a ida ao cemitério. Chorei sem falsidades. O costume nos faz aceitar o que não é aceitável.
Sou uma mulher de sessenta anos e estou apaixonada por um homem de trinta. É errado? Algumas amigas dizem que sim. Que ele logo dirá despedidas. Que parece meu filho.
Minhas duas filhas aceitam. Uma é mais velha do que ele. Ele é mais pai do que foi o pai. Tão distante do encontrar. Tão desligado do amar. Ele me diz linda e eu entorpeço. Experimento o prazer quase que diário. Ele toca o meu corpo de mulher como meu marido nunca tocou. E espera para sentirmos juntos o que sentem os que se amam.
Faz quase um ano, e ele sonha com a comemoração da data. Diz sorrisos o tempo todo. Uma amiga fala em interesses. Eu não sou uma mulher de posses. Ele tem tanto quanto eu, ou mais, não pergunto. Outra fala que ele me vê como substituta de uma mãe ausente. Sabe nada ela de sua mãe. Outra diz que é desconfortante nos ver juntos. Que, certamente, uma hora termina; então, é melhor terminar.
Minha filha desacredita do meu acreditar nas palavras dos outros. Chama de inveja o que minhas amigas chamam preocupação. O corpo dele tem chama, tem as dobras que me dobram em prazer. É não é só no momento do sexo. É, nos romantismos que acordam com a gente, que ele vai me acordando até o momento de sermos um. Ele gosta de cozinhar para mim. É lindo de ver. Um homem tão homem, tão sensível.
Dia desses, errei. Fiz perguntas desnecessárias, desenvolvi teses provando ser impossível, isso depois de um encontro desencontrado com minhas amigas. Ele olhou meu medo, demonstrou algum cansaço em novamente ter que explicar amor. Amor não se explica. Olho para alguns homens com mulheres mais jovens. Por que o inverso é desconfortante?
Penso que, quando eu tiver setenta, ele terá quarenta. Ou quando eu tiver oitenta, ele terá cinquenta. E por que pensar no que não é hoje? Hoje, ele me faz bonita, ele diz de mim o que eu não sabia ou, se soubesse, havia há muito esquecido.
Ele fala do meu corpo com suavidade, do jeito que mexo as mãos, do meu sorriso, de um levantar os dedos para ser incisiva, fala dos meus cabelos molhados, me surpreende quando me enxugo depois do banho. Beija o molhado e o seco em mim. Seus olhos me dizem paixão. Por que não viver o hoje?
Ele quer uma viagem de um ano. Quer que cada ano seja comemorado como uma vida inteira. Quer fazer dormir os medos que me fazem, por vezes, ser insensível e quer acordar um acordo verdadeiro de amor. São suas essas palavras. E eu rio abobada de prazer.
Foi em um rio que nos conhecemos. Ele levava a mãe para um passeio e me viu. Meu chapéu havia caído com o vento. E ele devolveu. Devolveu tanta coisa o homem que adormece beleza e gentileza ao meu lado. Eu passo as mãos com delicadeza e decido desligar as vozes que não me dizem amor.
Com medo ou sem medo, hoje é dia de amar. É o que digo à lua que ainda não se foi, mesmo diante do sol que aquece dentro, que aquece fora.
Na prosa, que é a vida, como é bom um acordar de poesia. Espero não desdizer o que a vida está dizendo para mim.
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