Antônio Geraldo da SilvaDivulgação
O retrato da saúde mental no Brasil
O retrato da saúde mental no Brasil
Uma pesquisa nacional realizada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) revela um quadro preocupante sobre a saúde mental no país. O levantamento, que ouviu 711 pessoas de todas as regiões, mostra que mais da metade já teve algum tipo de ideação suicida, e 31,7% relataram pensamentos suicidas nos últimos seis meses. São números que expõem a dimensão de um problema que ultrapassa o campo médico e alcança a estrutura social e cultural do Brasil contemporâneo.
A pesquisa, conduzida de forma anônima e voluntária, incluiu homens e mulheres entre 18 e 65 anos, de diferentes formações e ocupações. Embora não seja uma amostra estatisticamente representativa, o estudo capta tendências relevantes e revela percepções vividas pela população. Mais de 80% dos entrevistados relataram dificuldades relacionadas ao sono, e 76,9% afirmaram mudar seus hábitos alimentares em períodos de ansiedade. Metade disse já ter desejado se isolar completamente ou desaparecer. Ainda assim, 54,1% afirmaram saber onde buscar ajuda em momentos de crise, e 80,9% já receberam algum tipo de atendimento profissional.
Os resultados também revelam avanços. O estigma em torno da psiquiatria diminui a cada ano, fruto do trabalho contínuo de combate à psicofobia promovido pela ABP desde 2011. Quase 68% dos participantes relataram diagnóstico de transtornos mentais, como depressão (CID-11: 6A70–6A7Z), transtorno bipolar (6A60) ou transtornos de ansiedade (6B00–6B0Z), e 47,5% estão atualmente em tratamento psiquiátrico. Por outro lado, 16,6% afirmaram desejar iniciar o tratamento, mas não possuem condições de acesso, o que reforça a urgência de fortalecer o Sistema Único de Saúde. Nas últimas três décadas, a rede pública de atenção em saúde mental foi gradualmente desmontada, e a população mais vulnerável permanece desassistida.
A filósofa Simone de Beauvoir escreveu que “a dor é o encontro do ser humano com os limites de sua liberdade”. Hoje, essa dor reflete uma cultura que valoriza a produtividade acima da saúde, que exige velocidade quando o que se precisa é pausa. Vivemos tempos em que a mente humana, pressionada por exigências cada vez maiores, busca espaço para respirar.
Os dados da pesquisa revelam um Brasil que adoece, mas que também amadurece. Aumenta o número de pessoas que reconhecem a importância do cuidado e buscam atendimento especializado. Falar sobre doenças mentais é romper o silêncio e salvar vidas. Fortalecer o SUS, ampliar o acesso e combater o preconceito são passos fundamentais para enfrentar esse desafio coletivo. Como lembrou Albert Camus, “no meio do inverno, aprendi enfim que havia em mim um verão invencível”. Cuidar da mente é, antes de tudo, um ato de coragem.
Se precisar, peça ajuda.
Antônio Geraldo da Silva é presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP)

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