As ameaças foram denunciadas ao Ministério Público Federal (MPF)Reprodução

Rio - Um professor de uma unidade federal de ensino alega ter sofrido ameaças de pais de alunos depois de tentar provocar a reflexão de estudantes que teriam realizado ofensas machistas e racistas para meninas da turma em que ministra aula. O caso está sendo acompanhado pelo Ministério Público Federal (MPF).
De acordo com o professor, que preferiu não ser identificado como forma de preservação, as ameaças aconteceram no dia 17 deste mês. Ele destacou que recebeu uma ameaça grave à sua integridade física e até mesmo à vida depois de nomear uma turma com os dizeres 'Racistas e Machistas' no dia anterior.
O docente explicou que deu esse título depois que alunos foram suspensos por mensagens de cunho racista e machista. Segundo ele, ao lerem esse nome provisório, que seria para provocar reflexão sobre o que os estudantes fizeram e para discutir o tema, os pais começaram contatos e agressões verbais, culminando em uma ameaça de morte.
"De imediato, a mãe do aluno me xingou, disse que eu era um m... e que isso não era papel de um professor. Eu fui lá e tirei o nome porque vi que fui mal interpretado. Logo depois, um pai me ligou três vezes e eu não atendi. Eu já havia alterado o nome e reconheci que não teve a interpretação que eu gostaria, que era provocar uma discussão. Pelo contrário, os alunos mostraram para os pais e veio essa represália. No outro dia, eu fui trabalhar e o mesmo pai que havia ligado para mim enviou áudios. Ele ameaçou me encontrar nem que fosse no inferno. Caso alguma coisa acontecesse com o filho dele e com alguns dos meninos, ele disse que ia me buscar nem que fosse debaixo da saia da minha mãe. Mais um comentário misógino. Pior, porque todos sabem que minha mãe faleceu há um mês. Foi muito agressivo isso porque não quer assumir que o filho foi racista e misógino. Eles ficam jogando a culpa nas meninas que descobriram as mensagens e agora querem jogar a culpa em mim, como se eu fosse responsável”, explicou.
Após as ameaças, o professor explicou que procurou uma delegacia, mas como é servidor federal, houve a necessidade de procurar a instância federal. Mesmo depois de relatar esses crimes, o docente continua dando aula para a unidade à distância. O homem ainda ressaltou que continuará combatendo o racismo nas escolas.
“Não queremos mais violência desnecessária. No momento, estou sofrendo essa de ter que ficar longe. Uma situação absurda que jamais imaginaria que iria viver, como na época da ditadura, me escondendo de tudo e de todos. Quero Justiça e que possamos ficar em paz. Nem quero que o pai seja preso, pois prejudicaria toda a família. Se for convertida em indenização, quero doar para alguma ONG antirracista. Quero que eu e nenhum professor jamais seja ameaçado por tentar educar e corrigir alunos que se comportam mal, em grande parte porque não foram devidamente educados pelos mesmos pais que querem atribuir a responsabilidade disso aos professores”, completou.
Depois de todo o episódio, o docente escreveu uma carta aberta com o objetivo de esclarecer a sua vontade com a nomeação da turma. No documento, o professor pediu desculpas pelo erro e destacou o combate ao racismo e machismo.
"Errei ao iniciar o contato com palavras tão polêmicas. Reconheço o meu erro e estou aqui tentando me retratar e evitar que seja um erro verdadeiro. Hoje, consigo compreender e supor algo que pode até explicar, mas jamais, em hipótese alguma, justificar a reação violenta contra mim, como servidor público em pleno exercício de minha função, que culminou com uma ameaça sórdida que me fez decidir me distanciar fisicamente da escola. Não se combate a violência simbólica de afirmações racistas com ameaças de violência! Deveria ser inquestionável a necessidade de acolhimento das vítimas e dos agressores, na melhor concepção de direitos humanos. Queremos que todas as pessoas de todas as cores e crenças convivam respeitosamente, então, busquemos justiça para alcançarmos a paz", escreveu.
As ameaças foram relatadas ao MPF com um pedido de medida protetiva urgente. Procurado, o órgão afirmou que instaurou um inquérito policial pelas ameaças e que já identificou um dos investigados, que é pai de um dos alunos, que deverá ser ouvido pela Polícia Federal. A denúncia é acompanhada pelo procurador da República, Leandro Mitidieri.
Questionada, a PF não respondeu sobre a investigação. O espaço está aberto para manifestação.