Betânia Marques de Almeida mostrando a mochila que estava com a filha Pedro Ivo/Agência O DIA

Rio - "Isso é muita covardia, eu não estou aguentando". O desabafo é de José Roberto Santos de Souza, pai do menino de 11 anos morto após ser baleado a caminho da escola em Maricá, na Região Metropolitana do Rio, na manhã desta quarta-feira (12). Após a tragédia, a família e vizinhos da criança estiveram na Delegacia de Homicídios de Niterói (DHNSG) para prestar depoimento, onde acusaram policiais militares de terem entrado atirando no condomínio Minha Casa Minha Vida, de onde a vítima saía acompanhada da mãe para estudar. A PM alega que houve confronto com criminosos na região.

O pai do menino, aos prantos, contou que a criança tinha autismo e não teve reação de correr no momento em que ouviu os disparos. Enquanto a mãe, ainda muito abalada, saiu da delegacia amparada e não conseguiu dar entrevistas.

"Os policiais entraram atirando, ninguém atirou contra eles, os vagabundos de lá não atiraram. O garoto não teve reação de correr. Eu estava em casa, quando ouvi os pipocos, eu nem tomei banho, escovei dente, nem nada, fui correndo, foi quando me avisaram: ‘seu filho está morto'. É covardia, agora ninguém vai salvar a vida dele, aquele lugar é um inferno, sempre acontece essa merd*, eu estou muito mal, não estou aguentando mais", disse muito emocionado.

José explicou ainda que uma outra criança por pouco não foi baleada. O disparo atingiu sua mochila. A mãe da menina, a cozinheira Betânia Marques de Almeida, também esteve na DHNSG para prestar depoimento, e levou a bolsa rasgada ao lado para comprovar o caso. A garota não ficou ferida e passa bem.


O tio do menino Jorge Luis Ribeiro de Amorim reforçou a versão de que os policiais entraram atirando no horário em que as mães estavam levando as crianças para escola.

"Eu estava em casa quando recebi o telefone dizendo que a polícia chegou atirando e pegou no menino, eles falaram que ele era bandido, mas ele tava com uniforme, a mãe estava levando ele pra escola, o que que é isso? E agora o que vai ser feito? O menino já não volta mais. Nós só queremos Justiça, não pode um menino perder a vida do nada, deixando os irmãos sofrendo, a mãe tá sofrendo", lamentou.

Jorge ainda descreveu o sobrinho como uma pessoa adorável. "Ele tinha um probleminha, era especial e todo mundo gostava dele, no domingo ele esteve na minha casa, dei uma pipa pra ele. Sou padrinho do irmão dele, então eles sempre passavam o final de semana lá em casa. É muito triste, lamentável, tá doendo demais. O garoto é o irmão mais velho e a situação aconteceu assim que ele saiu de casa com a mãe", explicou.

Ainda na delegacia, um vizinho da família, Carlos Alberto Jaime, contou que o seu carro também foi atingido pelo mesmo projétil que atingiu a vítima.

"Eles entraram atirando, meu carro estava parado na garagem, aí começaram a atirar, eu olhei da minha janela e vi a mãe tentando puxar o garoto, mas ele já tinha sido baleado, então ele fugiu pra trás do prédio. Nisso um vizinho saiu gritando e os moradores foram pra fora. O garoto estava saindo, eles estavam entrando e a bala pegou no peito, vazou e atingiu meu carro que estava acionado. Agora falam que trocou tiro, que o garoto era bandido, brincadeira né?", desabafou.

O que diz a PM

De acordo com a Polícia Militar, equipes do 12ºBPM (Niterói) realizavam policiamento quando foram atacadas por criminosos armados nas proximidades do condomínio Minha Casa Minha Vida, localizado na Estrada do Bosque Fundo, em Inoã, Maricá. Após cessar os disparos, os policiais afirmam que encontraram a criança atingida e já sem vida.
PM alega que a viatura foi atingida durante confronto com criminosos - Pedro Ivo/Agência O DIA
PM alega que a viatura foi atingida durante confronto com criminososPedro Ivo/Agência O DIA


A PM informou também que durante o confronto uma viatura foi atingida pelos disparos dos criminosos, que fugiram. A área foi isolada e a perícia acionada. A 4ª Delegacia de Polícia Judiciária Militar (DPJM) também foi acionada ao local.

Protesto moradores

Moradores se aglomeraram e protestaram contra os policiais logo após o ocorrido. "As crianças não podem nem ir para escola estudar, pode nem ter paz", disse uma testemunha.

Segundo o Corpo de Bombeiros, uma equipe foi acionada para o local às 7h05. No local, duas mulheres foram socorridas para o Hospital Municipal Doutor Ernesto Che Guevara. Uma com ferimentos por pedrada no rosto, e outra com estilhaços de bomba também na face. Ambas seguem em atendimento na unidade.

Prefeito pede rigor nas investigações

Em comunicado, a Prefeitura de Maricá lamentou o caso e informou que o município está de luto pela morte precoce do estudante.

O prefeito, Fabiano Horta, declarou que cobrará rigor máximo das autoridades policiais nas investigações. "Não vamos deixar que esse crime fique impune, nem que tragédias como essa, incomuns na nossa cidade, sejam naturalizadas", afirmou.

As equipes das secretarias municipais de Direitos Humanos e Assistência Social se deslocaram para o local e prestam apoio e solidariedade à família da vítima.

A Secretaria Municipal de Educação informou que o menino era aluno da Escola Municipal Darcy Ribeiro e também lamentou o caso. "Em nome de toda a equipe, o secretário de educação, professor Márcio Jardim, presta condolências e se solidariza com familiares e amigos", comentou em nota.