Aulos e Solange têm 77 anosArquivo pessoal

Rio - Aulos de Souza, 77 anos, e a esposa, Solange de Souza, 77, trabalharam juntos por décadas em uma banca de jornal localizada na Praça Getúlio Vargas, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. Das boas lembranças do trabalho como jornaleiros, o casal destaca as amizades que fizeram com os fregueses, já que eram muito conhecidos e queridos na região.

"Comecei com 15 anos ao ser levado por um amigo para a sociedade chamada Santa Cruz, fiquei três meses como empregado, mas trabalhei na sociedade durante 10 anos", recorda ele, que foi responsável por ajudar a distribuir jornais na Baixada Fluminense.

Ex-presidente da Cooperativa de Jornaleiros da Baixada Fluminense, Sr. Auros também conhecido como Lucas, conta como foi importante ter levado os jornais para a Baixada para que todos tivesse acesso às notícias. "Com muito custo, muita luta. As mesmas coisas aconteceram com as revistas para virem para a Baixada", conta.

Aos 35 anos, ele comprou sua banca em São João e outra em Nova Iguaçu, após alugá-la por um tempo. Como companheira inseparável na jornada de trabalho estava a esposa. Eles são casados desde que tinham 18 anos.

"Ela sempre trabalhou comigo em banca de jornal. Tem retrato dela no jornal O Dia, reportagens bonitas. Ela sempre me ajudou. Meu filho fez prova para a polícia, resolveu largar a polícia e trabalhou comigo também, ele em São João e eu e minha esposa em Belford Roxo", conta Aulos.

Solange recorda com orgulho que o marido trabalhou duro quando começou e, mesmo diante das dificuldades do passado, consegue ver o lado positivo que ajudou a edificar o ofício.

"Por volta dos 35 anos, ele descia para levar jornais para Mangaratiba no trem. Parava em cada estação e largava os maços de jornais e vendia o jornal na porta do trem. Isso foi até quando ele veio parar em Nova Iguaçu e depois foi para São João. Nesse tempo, ele levava os jornais nas costas, dentro do trem, era sacrifício, mas era o trabalho que ele tinha", conta.


O jornaleiro ia diariamente à Central do Brasil, onde separava os jornais que levaria para a Baixada. "As bancas de jornais eram abastecidas com os jornais que eram casados na Central do Brasil, desde uma hora da manhã até o amanhecer do dia", conta.
Saudade

Solange recorda com carinho do período que trabalhou com o marido em bancas de jornais, desde 1969, e admite que sente falta.

"Da banca de jornal, eu tenho saudade, se eu pudesse voltar ao passado, no ano que comecei a minha caminhada, voltaria fazendo o mesmo. Porque ali eu aprendi, eu ensinei, eu chorei, eu sorri, eu vivi, eu morri também muitas vezes com notícias trágicas e também pelas vidas daquelas pessoas que estavam ao nosso redor".

Filhos criados na banca de jornal

Com o tempo, esse esquema acabou e os jornaleiros passaram a usar um galpão localizado em Belford Roxo. "Esse é o trabalho que a gente fez durante muitos anos. Meus filhos foram criados dentro da banca de jornal. No balcão onde circulava o jornal, ali eu colocava minha filha, meu filho, dava banho, mamadeira. A vizinhança que trabalhava com a gente, de lojas de salgados, roupas, eram pessoas muito amigas. Então ajudavam para dar banho, olhavam as crianças", relembra Solange.

"Nossas vidas, nesse percurso todo de jornaleiros, foi de muito trabalho e luta. Atualmente, a gente não trabalha mais em banca de jornal, mas a gente sabe tudo. Através do nosso filho, a gente orienta o que ele tem que fazer, quais as normas que ele tem que seguir, como ele tem que tratar a freguesia", diz ela sobre o filho, Robson de Souza, 53 anos, ter assumido a banca da família.

Período sem banca

Um momento complicado que o casal passou foi quando a banca de jornal de Belford Roxo foi retirada temporariamente para o calçamento da região. Os dois passaram então a vender jornais debaixo de uma marquise, seja com chuva ou sol.

"Ali tinham pessoas que ficaram com a gente, ajudando para que a gente pudesse seguir em frente. Depois nós voltamos de novo, mas teve uma pessoa especial chamada Cristina, nós estávamos na rua, na chuva e no sol, ela chegou para nós e perguntou se a gente queria ficar no anexo da Xerox dela enquanto a praça não estava pronta. Foi uma pessoa que nos ajudou num momento difícil", recorda.

"Deu tudo certo, mas foram lutas que edificaram as nossas vidas, que mostraram pra gente que a gente tinha que ser pessoas do bem, lutas que mostraram que existiam pessoas do bem, pessoas que gostavam da gente. Nós não éramos só jornaleiros, éramos amigos e eles eram nossos amigos", completa Solange.

Parceria com O Dia

O casal relembra ainda que, mesmo diante de alguns períodos de dificuldade financeira, conseguiu realizar parcerias profissionais, inclusive com o jornal O Dia.

"Temos que agradecer ao Dia. Meu marido às vezes estava com notas atrasadas, O Dia segurou as pontas para que ele pudesse ter como pagar. A gente lembra de tudo de bom e do ruim também. O ruim foi de edificação, foi para mostrar pra gente que sem luta a gente não consegue vitória. É o Ser Supremo que rege a nossa vida", completa.