Onde deveria passar o Rio Joana, na Zona Norte, está completamente seco Reginaldo Pimenta/Agência O Dia

Rio – O Rio Joana, um dos principais da Grande Tijuca, na Zona Norte, enfrenta uma seca extrema no trecho que cruza a Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão. O cenário evidencia os dados do Sistema Alerta Rio, que apontam fevereiro como o mês mais quente dos últimos 28 anos. Nunca choveu tão pouco no Rio de Janeiro.
Esse corpo hídrico faz parte de uma bacia que abrange os bairros de Andaraí, Tijuca, Vila Isabel e Maracanã, sendo um dos afluentes do Canal do Mangue, que deságua na Baía de Guanabara. Ao DIA, Julio Wasserman, professor do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Biossistemas da Universidade Federal Fluminense (UFF), explica que a bacia tem uma dimensão reduzida e responde rapidamente às variações meteorológicas.
"Quando chove muito, ele inunda. Quando chove pouco, ele seca", afirma. "A intensa seca deste fevereiro fez o rio secar completamente, pois os solos perderam a capacidade de retenção de água devido ao processo de impermeabilização (construções, asfaltamento e calçadas cimentadas). Com isso, períodos um pouco mais longos sem chuva levam a uma redução severa nos fluxos", diz Wasserman.
Adacto Ottoni, professor do Departamento de Engenharia Sanitária e Meio Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), demonstra preocupação com a impermeabilização da região. "Precisamos de um crescimento ordenado e da manutenção de áreas verdes. A impermeabilização impede a infiltração da água no solo. Quando há menos chuva, começa a faltar água. Em pleno fevereiro e março, o corpo hídrico na Quinta da Boa Vista está secando, o que é altamente preocupante. Se houvesse maior infiltração na bacia, o volume de água poderia ser menor, mas não chegaria ao nível de secura atual", alerta.
Soluções possíveis
Para Wasserman, a implementação de jardins de infiltração e outras soluções ecológicas na região poderia contribuir para o abastecimento do lençol freático e a recuperação do rio. Questionado sobre os riscos da seca para a população, o professor da UFF explica que a redução da vazão do Rio Joana não impacta diretamente o abastecimento de água da cidade, já que o fornecimento provém do Sistema Guandu.
No entanto, ele destaca que a recuperação do corpo hídrico traria benefícios ambientais, permitindo uma vazão mais constante e criando um ambiente mais saudável. "Não seria possível captar essa água para consumo, mas o rio poderia voltar a abrigar peixes e outros organismos, melhorando a qualidade de vida na região", diz.
Wasserman também ressalta que o calor intenso não é o principal responsável pela seca do Rio Joana, mas sim a ausência de chuvas e a baixa capacidade do solo de reter água.
Já Adacto Ottoni defende a necessidade de políticas públicas para mitigar o problema. "Se houvesse medidas para reter a água das chuvas intensas de forma adequada na bacia, controlar a erosão, reduzir o lixo disperso e promover um modelo de ocupação ordenada do solo, a situação seria diferente. Há técnicas para tudo isso, mas nosso sistema de drenagem está saturado e os lençóis freáticos, cada vez mais secos", lamenta.
Wasserman explica que fevereiro costuma ser um mês particularmente seco e que já houve outros períodos semelhantes. No entanto, ele alerta que as mudanças climáticas e a destruição da vegetação estão agravando o problema. "A redução da vazão nesse período é normal, mas a tendência é de piora, o que levou à secura extrema deste ano", conclui.
Questionada, a Fundação Rio-Águas esclareceu que o trecho que passa pela Quinta da Boa Vista era um antigo desvio do rio Joana, portanto, no local, não há fonte de água. Quando chove, pode ocorrer da água desviada do rio passar por ali.
Estiagem e temperaturas elevadas
A média registrada no último mês foi de apenas 0,6mm, quando o esperado para esta época é de 123mm. Essa é a menor taxa entre todos os meses dos últimos 28 anos. A falta de chuva, associada às altas temperaturas registradas, também chamam a atenção para outro fato importante: a redução na disponibilidade hídrica em mananciais que abastecem a região metropolitana do Rio de Janeiro, que apresentam níveis muito abaixo do esperado.
Segundo a meteorologista Raquel Franco, a média da temperatura de fevereiro costuma ser de 35° C, mas este ano os termômetros registraram média de 38°C. "Estamos sob uma massa de ar quente que tem impedido a chegada de frentes frias. E a pouca chuva que temos registrado são muito fracas e insuficientes para reverter esse quadro de elevação térmica", explica.
No momento, não há previsão de chuvas volumosas para o Rio de Janeiro até meados de março. Raquel Franco diz ainda que alguns estudos mostram que o aquecimento global fará com que todos os sistemas sejam mais intensificados e mais frequentes.