Terreiro Ilê Asé Oya Osun Nidê, em Nova Iguaçu, foi destruído em incêndio criminoso no domingo (9)Divulgação

Rio - O terreiro Ilê Asé Oya Osun Nidê, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, foi invadido e incendiado por criminosos na noite de domingo (9). O ataque aconteceu por volta das 19h e destruiu completamente o local, que estava vazio no momento do crime, não resultando em vítimas. O caso está sendo investigado pela Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) como ato de intolerância religiosa.
Segundo a Iyalorixá Neila de Oya, líder do espaço, os prejuízos são incalculáveis. Pelo menos duas geladeiras, dois fogões, uma máquina de lavar, um sofá, roupas de santo e um enxoval recém-adquirido foram perdidos. Além disso, o incêndio causou danos estruturais, como o desabamento de parte do teto e rachaduras nas paredes. O espaço agora precisará passar por uma nova reforma para ser reaberto.

O terreiro, que segue a tradição do Candomblé Nação Ketu, foi inaugurado no ano passado. Os frequentadores acreditam que o incêndio foi criminoso, pois os bombeiros encontraram três focos de fogo distintos no local.

A mãe de santo registrou um boletim de ocorrência na Decradi nesta terça-feira (11). Abalada, ela afirmou estar incrédula com o ocorrido. "Ainda estou atordoada, sem condições de avaliar como tudo aconteceu e o que fazer. Ainda não consigo entender", desabafou. Em choque, a religiosa passou mal e precisou ser medicada.

O professor e orientador do Programa de Pós-graduação em História Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Babalawô Ivanir dos Santos, também interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), destacou a gravidade da situação. "Apesar das frequentes recomendações e declarações em prol do respeito às diferentes crenças, a intolerância religiosa continua sendo um dos maiores desafios para a construção de uma sociedade mais igualitária. É preciso agir com rigor", afirmou.
Casos não são isolados
Ele também relatou que, na semana passada, uma religiosa de matriz africana foi alvo de intolerância em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
"Mãe Marina foi vítima de mais um caso vergonhoso de intolerância religiosa, um ataque que não pode passar despercebido. Esses crimes não são isolados; são reflexos de um Brasil onde terreiros são atacados, lideranças religiosas são perseguidas e a intolerância se manifesta sem medo de punição. Mas não podemos nos calar! É preciso denunciar, exigir justiça e reafirmar que fé não se apaga, axé não se destrói", escreveu ele nas redes sociais.

A intolerância religiosa é considerada crime no Brasil, conforme a Lei nº 7.716/1989. O artigo 20 da legislação prevê pena de reclusão de um a três anos e multa para quem praticar, induzir ou incitar discriminação ou preconceito religioso.
A Lei nº 7.716/1989 tipifica a intolerância religiosa como crime. O artigo 20 da lei prevê pena de reclusão de um a três anos e multa para quem praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de religião.
Dados recentes
Segundo o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), foram registradas em todo o país, em 2024, 2.472 denúncias de casos de intolerância religiosa pelo Disque Direitos Humanos (Disque 100), coordenado pela pasta.
O número representa uma alta de 66,8% em relação às denúncias deste tipo feitas em 2023 (1.481). São quase 1 mil denúncias a mais em 2024, anunciou o MDHC. Se considerados os dados registrados entre 2021 e 2024, o crescimento das denúncias de violações foi de 323,29%.
O painel interativo de dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos revela os números de violações relativas à intolerância religiosa. Durante todo o ano de 2024, as pessoas violadas com mais frequência são pertencentes aos segmentos: umbanda (151), candomblé (117), evangélico (88), católico (53), espírita (36), outras declarações de religiosidades afro-brasileiras (21), islamismo (6), judaísmo (2). Em 1.842 denúncias, não houve indicação da religião.
A maioria das vítimas da discriminação religiosa são mulheres (1.423). Outras 826 violações foram sofridas por homens. Os demais registros não tiveram o gênero informado ou a questão não se aplica porque a denúncia se refere a uma família ou a uma comunidade.
De acordo com a plataforma governamental, as unidades da federação com os maiores números de denúncias são: São Paulo (618), Rio de Janeiro (499), Minas Gerais (205), Bahia (175), Rio Grande do Sul (159), além do Distrito Federal (100).