Brasília - Começou às 10h25 o quinto dia do julgamento final do processo de impeachment da presidenta afastada Dilma Rousseff, no Senado Federal. Esta terça-feira será dedicada aos debates entre acusação e defesa, que poderão durar até cinco horas. O tempo destinado para Janaína Paschoal e José Eduardo Cardozo foi de uma hora e meia cada para fazer suas alegações e depois mais uma hora para réplica e uma hora para tréplica. A advogada foi a primeira a se pronunciar e chegou a ir às lágrimas ao dizer que o processo de impeachment é também pelos netos da presidente Dilma Rousseff. Após uma pequena "turbulência" no Congresso, Cardozo se manifestou afirmando que querem condenar Dilma sem que ao menos o povo entenda quais são as acusações. A sessão foi paralisada para almoço e volta às 14h10.
Em seguida, será iniciada a discussão dos senadores. Cada um terá direito a falar por dez minutos, que não podem ser prorrogados e não há direito a aparte. Diante disso, o julgamento só será concluído nesta quarta-feira. Sem poder ser substituído na sessão, nem por um minuto, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, que comanda o julgamento, deve interromper no final da noite desta terça a fase de debates.
Acusação
No início de sua fala, a advogada Janaína Paschoal declarou que ficou triste por acusar uma mulher, mas que se o presidente fosse homem, pediria o impedimento do mesmo jeito. Classificando o impeachment como "remédio constitucional", ela disse que as denúncias feitas não mudaram e se baseiam em: omissão diante do "escândalo do petrolão", as pedaladas fiscais e os decretos editados em desconformidade com a meta vigente. “É necessário que o mundo saiba que não estamos tratando aqui só de questões contábeis”, afirmou.
"Ontem eu fiquei surpresa com a acusação de que teria um complô. Chegou-se ao absurdo de dizer que o presidente da Câmara teria redigido a denúncia", disse antes de negar veementemente que o ex-presidente da Casa, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), teria ajudado na elaboração do pedido de afastamento.
Ela ressaltou que a perícia foi totalmente favorável às acusações, segundo ela. "Eles mentem tão bem. São tão competentes no marketing", apontou Janaína dizendo que a perícia foi favorável a acusação, mas que a equipe de Dilma se comporta como se não tivesse sido. "Quem pede 70 esclarecimentos para aquilo que lhe é favorável?", questionou, explicando que o pedido foi feito pela defesa.
Na fase final de seu pronunciamento, Janaína se colocou no papel de quem toma decisões pelo Brasil. "Me coloco nesse processo como uma defensora do Brasil. Eu entrei nessa história sem ser chamada. Eu não quero precisar tomar uma medida como essa novamente, mas se for necessário eu tomo", afirmou. Ela ainda pediu desculpas à presidente Dilma, não pelo processo em si, mas pelo "sofrimento causado", e disse, chorando, que espera que um dia ela entenda que o processo de impeachment também foi pelos seus netos.
Defesa
O ex-ministro José Eduardo Cardozo se pronunciou, em seguida, para fazer a defesa da presidente Dilma Rousseff. "As acusações são tão técnicas, tão sofisticadas, tão confusas, que a maior parte da população brasileira mal sabe o motivo. Querem afastar uma presidente sem que a população brasileira entenda o que está acontecendo", afirmou ele.
Citando a biografia de Dilma, ele mencionou que quando ela era torturada na ditadura diziam que aquilo era para o bem dos seus filhos, dos seus netos. "Algumas vezes acontece assim com os acusadores, subitamente tem uma crise de consciência", afirmou ele, remetendo ao discurso de Janaína Paschoal, no entanto sem citá-la.
Cardozo construiu seu raciocínio mostrando que logo após Dilma ser eleita criou-se um ambiente para desestabilizar seu governo a todo custo, desde fazer auditoria em urnas eleitorais até investigar suas contas, no entanto nada foi comprovado. "Teve início então a caça ao fato do impeachment", afirmou o advogado.
Segundo ele, em Eduardo Cunha, a então oposição encontrou o vértice para mover o processo. "Tenho certeza que os senhores da oposição já conheciam quem era Eduardo Cunha, pois no mundo político tudo se sabe", alfinetou ele. "Pare com a Lava Jato, demita o ministro da Justiça. Dilma se recusou e encarou Cunha como encarou seus algozes quando era jovem", afirmou Cardozo.
O advogado ressaltou que a discussão de políticas econômicas pode ocorrer, mas que Eduardo Cunha paralisou a Câmara para favorecer o parecer que queria. "Até os tijolos do STF sabem que um presidente da República não pode ser responsabilizado por atos anteriores ao seu mandato", afirmou ele, mostrando que Cunha, junto com a oposição arquitetou para apresentar uma nova denúncia, idêntica, porém com duas denúncias de 2015. Segundo Cardozo, Cunha deu seu parecer dizendo que aceitava as denúncias de 2015 mesmo estas ainda não tendo sido apreciadas pelo STF, sendo que nas "linhas de cima" do despacho, ele havia dito que não aceitaria as de 2014 justamente por não terem a aprovação do Supremo.
O preconceito que Dilma enfrenta por ser mulher foi mencionado pelo ex-ministro, falando que a acopanhou de perto nesse tempo e viu muito desrespeito. "Mulheres quando se equiparam nas suas disputas aos homens são tidas como autoritárias. É impossível não perceber como Dilma Rousseff foi profundamente discriminada por ser mulher. Me permitam como homem dizer isso", afirmou ele. "Se fosse um homem iriam dizer: 'Olha que energia, hein'. Mas como era mulher: autoritarismo. Querem condenar, condenem, mas não enxovalhem a honra de uma mulher digna. Muitos falaram que ela tomava remédios para tentar desqualificá-la, mas nunca provaram que ela enriqueceu, desviou dinheiro para filhos", completou.
"Pune-se retroativamente uma presidente da República", afirmou Cardozo mostrando que os prazos para pagamento estabelecidos por Anastasia tiveram que ser criados, o que ele chamou de "prazo Anastasiano".
Cardozo finalizou seu discurso antes do tempo previsto: "Uma das coisas que mais me emocionava ao quando era ministro da Justiça era dar seguimento à lei da Anistia. O que mais me doía é quando eu tinha que pedir desculpas e a pessoa já tinha morrido, a vida já tinha se perdido. Não aceitem que nosso país sofra um golpe parlamentar para que no futuro alguém tenha que dizer 'me desculpe Dilma Rousseff pelo que a ditadura te fez e pelo que a democracia te fez'", finalizou.
Confusão
Após a fala de Janaína, a sessão foi interrompida por cerca de cinco minutos para "acalmar os ânimos" no Senado. O senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) acusou o deputado José Guimarães (PT-CE), que assistia a sessão, de chamar a advogada de golpista e chegou a dizer que o ministro Lewandowski deveria chamar a polícia do Senado para retirá-lo do local.
Em seguida, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), pediu a palavra para dizer que "golpista" não poderia ser ofensa, pois se assim fosse o caso todos estariam sendo xingados e, inclusive, a presidente Dilma o teria feito nesta segunda-feira.
Críticas
Ao discurso de Janaína Paschoal, que foi seguido por Miguel Reale Júnior, a senadora Gleisi Hoffman (PT-PR) se manifestou para criticar a falata de argumentos apresentados pela acusação em seus discursos. "Não tenho nada contra debates políticos, mas para fazê-los na tribuna tem que ser eleito por voto popular. Os advogados de acusação tinham que apresentar o parecer técnico e não um discurso político. Isso aqui não é uma cena, ela citou os netos da presidente, chorou", criticou sobre a fala de Janaína.
Ela também falou sobre às críticas de Reale à presidente, que ela respondeu da mesma forma todas as perguntas. "Os senhores só perguntavam as mesmas coisas... 'o conjunto da obra, os decretos, a pedalada'. O que queriam?"
Em seguida, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) pediu a palavra para defender os advogados, a quem chamou de "brilhantes" e disse que Hoffman estava desrespeitando o Senado.
Senadores se dividem
Pelo menos 61 dos 81 senadores já se inscreveram para discursar durante a sessão desta terça-feira, mas outros podem requisitar o direito ao debate até o último minuto. O primeiro será o senador Gladson Cameli (PP-AC). A previsão é de que essa fase do julgamento dure cerca de nove horas, podendo se estender se mais senadores se inscreverem.
O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, que conduz o julgamento, tem concedido intervalos de uma hora para almoço e uma hora para jantar e outros que variam de 30 minutos a uma hora, a depender do ritmo dos trabalhos.
Depois das discussões entre os parlamentares, finalmente será a vez de Lewandowski fazer a seguinte pergunta aos senadores: “Cometeu a acusada, a senhora presidenta da República, Dilma Vanna Rousseff, os crimes de responsabilidade correspondentes à tomada de empréstimos na instituição financeira controlada pela União e à abertura de créditos sem autorização do Congresso Nacional, que lhes são imputados, e deve ser condenada à perda do seu cargo, ficando, em consequência, inabilitada para o exercício de qualquer função pública pelo prazo oito anos?".
Será aberto espaço para encaminhamento de dois senadores favoráveis e dois contrários aoimpeachment, com cinco minutos de fala para cada um. Após esse encaminhamento, o presidente da sessão abrirá o painel e os senadores serão convidados a votar. O voto é nominal e aberto, computado pelo painel eletrônico, onde o resultado final será divulgado.