Empresário Danilo Trento depõe na CPI da Covid nesta quinta-feira, 23Divulgação

Brasília - Nesta quinta-feira, 23, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid ouve o  empresário Danilo Trento para saber qual o grau de ligação com Francisco Maximiano, dono da Precisa Medicamentos, empresa que representou a indiana Bharat Biotech, fabricante da Covaxin no contrato para compra dos imunizantes pelo Ministério da Saúde. Ao longo da comissão, o depoente se recusou a responder as perguntas feitas pelos senadores e teve o sigilo bancário, fiscal, telefônico e telemático quebrado. 
Com direito de permanecer em silêncio pelo habeas-corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o empresário se limitou em dizer que é diretor-institucional da Precisa e amigo de Maximiano, mas se recusou a informar a forma de remuneração. No início, o depoente rejeitou fazer a apresentação inicial de 15 minutos e não prestou compromisso em dizer a verdade. 
Também no início da sessão, a CPI aprovou requerimentos para quebra dos sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático de Trento e também do irmão dele, Gustavo Trento, que é funcionário da Precisa Medicamentos. A ideia de votar os pedidos de quebra de sigilo partiu do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), após o reiterado silêncio do depoente.

No depoimento, ao ser questionado sobre a negociação de venda da Covaxin ao Ministério da Saúde, Trento alegou que, como diretor institucional da Precisa Medicamentos, não participou das tratativas da compra da vacina indiana. Ele também negou ter pedido ao presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), que telefonasse ao primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, para acelerar a negociação.
Segundo ele, o preço de US$ 15 estipulado pela fabricante Bharat estava dentro da faixa cobrada de outros clientes, entre US$ 15 e US$ 20.
O depoente afirmou ter viajado duas vezes para a Índia, mas não informou as datas. O depoente se recusou a responder sobre o motivo de a Precisa Medicamentos ter pago mais de R$ 5 milhões para a empresa Barão Turismo. Trento também não respondeu sobre o motivo Rafael Barão, proprietário da agência de turismo, estar presente na viagem.
Ele apenas confirmou que a Barão Turismo já recebeu valores em favor da Primarcial Holding e Participações, empresa da qual é sócio. "Serviços prestados a ela [Primarcial], foram pagos por ela [Primarcial]", esclareceu ele. 
Ao ser questionado se a Barão Turismo já repassou valores a terceiros em favor da Primarcial, Precisa ou outras empresas do grupo de Maximiano, o depoente ficou em silêncio.
Durante sua fala, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) questionou sobre a offshore aberta pela Barão Turismo em 15 de fevereiro, no estado de Wyoming, nos EUA, onde teria facilidades fiscais. Segundo o senador, a Primarcial e as empresas de Marcos Tolentino transferiram recursos para a Barão Turismo também no mês de fevereiro.
"Tudo indica que a abertura da offshore era para os recursos das empresas do grupo, inclusive da empresa do sr. Danilo, serem transferidos por essa offshore nos EUA. A Barão Turismo é a lavadora de dinheiro e o salto de transferências é em fevereiro, mês da assinatura de contratos. É um mês emblemático, pois a offshore é aberta, ocorre o salto de transferências financeiras do grupo e da Primacial para a Barão Turismo. Também neste mês ocorre a assinatura do contrato entre Precisa e Ministério da Saúde para aquisição de vacinas da Covaxin que nunca viria chegar no Brasil", disse Randolfe.
Além disso, o senador lembrou que no mês de fevereiro ocorreu o famoso encontro no restaurante Vasto, em Brasília, para tratar sobre o contrato da compra da vacina Covaxin ao Ministério da Saúde. "Também teve o chopp no restaurante Vasto, em Brasília, que teve Ricardo Santana, que tem interligação com  Marconny [Faria], estava lá também o Roberto Ferreira Dias, Blanco [coronel Marcelo] e o Dominguetti [Luiz Paulo]. A essa altura eu acho que o Dominguetti era o mais inocente, com menor número de crimes. Aquele choppinho foi para celebrar o contrato, foi a celebração das transferências financeiras", afirmou o parlamentar.
Em um momento, Trento se negou a dizer o endereço da sua empresa Primarcial. Porém, depois de suspensa a sessão, ele decidiu dizer. Com isso, Renan Calheiros (MDB-AL) constatou que fica no mesmo endereço de outras empresas de Francisco Maximiano, dono da Precisa, na Av. Brigadeiro Fernandes Lima, no bairro Jardim Paulistano, em São Paulo.
Depois ele voltou a ficar calado sobre mais perguntas sobre a Primarcial. Ele ficou em silêncio sobre, por exemplo, a origem dos R$ 900 mil usados por ele para compor o capital da empresa. Trento também não respondeu se a sua empresa foi usada para adquirir imóveis ou outros bens para o grupo de Maximiano. O relator da CPI, no entanto, informou que a Primarcial recebeu recursos de firmas ligadas a Maximiano.
"A 6M transferiu R$ 15,6 milhões para a Primarcial e recebeu R$ 11,7 milhões. A análise revela que quando a conta da Primarcial ficava com saldo negativo, a 6M, de Francisco Maximiano, injetava dinheiro", disse Renan.


Reunião suspensa
A reunião da CPI chegou a ser suspensa duas vezes a pedido de Trento, que pediu um tempo para conversar reservadamente com os advogados. A suspensão se deu depois que Alessandro Vieira (Cidadania-SE) sugeriu a prisão do depoente, que se recusa a fornecer informações simples, como o endereço da empresa onde trabalha.

"Peço que já se comece a avaliar a possibilidade de prisão do depoente. O habeas corpus que protege Vossa Senhoria não lhe permite negar informações básicas", disse Alessandro.
"Arquitetura ideal"

Ao longo da inquirição, o relator leu a íntegra de e-mail atribuído ao investigado Marconny Albernaz de Faria, descrevendo a "arquitetura ideal" para direcionar uma licitação de compra de testes de covid-19. Trento teria participado da elaboração dessa "arquitetura". "Como o senhor se sentiu redigindo esse documento? O senhor acha que está dando uma contribuição?", perguntou Calheiros, que foi respondido por Trento com a curta frase de que iria usar direito ao silêncio.

Logo depois, ele apenas respondeu que conhece Marconny, mas não soube precisar quantas vezes estiveram juntos. Indagado sobre quais serviços Marconny já prestou à Precisa Medicamentos, Trento preferiu ficar em silêncio. Marconny é apontado como um lobista. Em depoimento à comissão no dia 15 deste mês, ele disse que tinha prestado serviços de "viabilidade técnica e política" à empresa.
Trento também afirmou não ter tido nenhum tipo de contato com o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), para tratar da inclusão da Índia entre os países cuja aprovação da autoridade sanitária valeria no Brasil. O relator, Renan Calheiros (MDB-AL), demonstrou surpresa com a informação.
 
Amizade com outros depoentes
Trento também negou ter relação com Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde. O empresário admitiu apenas tê-lo encontrado em uma agenda oficial no ministério, que ele próprio marcou por e-mail.
Ainda disse "acreditar" não ter encontrado o ex-diretor da pasta em outra situação, mas Calheiros leu uma troca de mensagens do mês de junho do ano passado, relativa a uma "confraternização" com Dias para a qual Trento foi convidado. No entanto, o depoente preferiu ficar direito ao silêncio e não respondeu sobre essa confraternização. 

O depoente também foi questionado sobre seu grau de amizade com o advogado Marcos Tolentino, apontado como sócio oculto da FIB Bank. Trento disse que se considera “um amigo” dele. O questionamento foi feito em razão da empresa ter emitido uma carta de fiança à Precisa Medicamentos na negociação da vacina indiana Covaxin com a pasta da Saúde.

"É uma pessoa conheço há muitos anos, e eu considero como um amigo", disse Trento sobre Tolentino, que confirmou conhecer há 15 anos. 
Questionado por Calheiros se ele ou algum parente já foram sócios de Tolentino, Trento se recusou a responder. O relator então afirmou que a tia do depoente, Ana Paula Trento, teve sociedade com Tolentino entre 2019 e 2020. Segundo Renan, depois da saída de Ana Paula, ingressaram Gustavo Trento e Bruno Trento, irmãos do depoente.

O diretor da Precisa disse também ter uma “uma relação de colega” com Wagner Potenza, ex-presidente da FIB Bank. Trento também admitiu conhecer Roberto Pereira Ramos Jr., atual dirigente da empresa. "Eu o conheço apenas. Não tenho relação com ele. Sei quem é. Há muito tempo não o vejo, mas o conheço há uns seis anos, aproximadamente", afirmou ele. 

Depois disso, Trento se recusou a responder uma série de perguntas sobre a relação comercial entre a Precisa e a FIB Bank. Ele permaneceu em silêncio quando questionado sobre como as duas empresas iniciaram a parceria.
O relator também perguntou se ele tinha alguma relação com a família Bolsonaro. Trento se negou a responder e, por isso, alguns senadores manifestaram não entender como isso poderia incriminar o depoente.

Diante da insistência, o empresário admitiu ter se encontrado com membros da família do presidente, "alguns publicamente, outros em eventos".

*Com informações da Agência Senado